Novo Epílogo Alternativo

16 0 0
                                    

Curitiba morava dentro dela, mas ela não morava em Curitiba

Ela estava saindo do banho, envolta apenas numa toalha. Passou em frente ao espelho do seu quarto, com os cabelos loiros molhados. Enquanto um disco de música clássica tocava sua afetuosa sinfonia no aparelho de som, ela procurava um secador de cabelos na gaveta. Seus pés ainda estavam molhados sobre o carpete. Uma rosa vermelha, que ela mesma havia colhido de um quintal qualquer, repousava dentro de um copo de água sobre a cômoda. Ligou o secador em frente ao espelho, enquanto seus olhos verdes refletiam na superfície fria.
Pouco tempo depois, sua mala já estava pronta; estava bem vestida, aguardando com ansiedade a chegada do táxi que a levaria até a rodoviária. Parecia estar escrevendo em um diário pessoal quando bateram na porta.
Já chegou? Diz pra esperar mais cinco minutos...
Calma. Ainda não - sua mãe respondeu. - Posso entrar?
Tudo bem - respondeu Sheilla. - Entra...
Eduarda entrou secando as mãos numa toalha de cozinha. Sentou na cama de sua filha e perguntou:
Tem certeza que não quer almoçar?
Não dá tempo - Sheilla disse, voltando para a frente do espelho, enquanto passava o batom.
Está com pressa?
Você sabe que meu ônibus sai às 13h.
Sim... Mas pensei que... Deixa pra lá - lamentou Eduarda, balançando a cabeça e levantando. - Está levando roupas o suficiente? Sabe como faz frio no inverno em Curitiba. - ponderou.
Sim. Pode deixar, já sou adulta.
Está bem. Espero que Felipe trate você bem.
Felipe sabe cuidar da gente, mãe. Só você não vê...
Eduarda saiu do quarto, aborrecida, enquanto Sheilla ficou de pé em silêncio, apenas vendo sua mãe fechar a porta. Depois, a enteada de Felipe K. Dignoli abriu seu armário, de onde tirou uma pequena caixa com cadeado. Dentro dela havia uma carta, que foi lida em voz baixa, como numa oração. Após a leitura, concordou consigo mesma, balançando a cabeça positivamente e suspirando.


***

...sentada no banco traseiro da Caravan preta. Estávamos bem aquecidos pelo ar quente. Pedi ao Bispo Auxiliar, que estava sentado no banco do motorista, que colocasse a fita de Vivaldi para tocar, exatamente no ponto onde inicia o movimento de inverno. A sinfonia fez sua mágica. A neve caiu. Depois, o veículo começou a movimentar-se devagar. Pelo vidro traseiro, pude ver Renato sentado sozinho na escadaria da UFPR.
Renato foi seduzido, Maria Sheilla? - Dom Albino perguntou, enquanto dirigia a Caravan.
Sim - respondi, virando o rosto para a frente. - Acho que mordeu a isca.
O Bispo Auxiliar continuou dirigindo, sério. Voltei a olhar para trás, para Renato, que estava ficando pequeno, vagarosamente, diminuindo aos poucos na paisagem, enquanto o carro seguia em direção ao Teatro Guaíra. Várias pessoas na praça Santos Andrade estavam felizes, faziam pequenos bonecos de neve. Mas ele, ao contrário, parecia tão terrivelmente triste.
Tão só...

***

Lembro-me agora do dia em que cheguei em casa e recebi, próxima ao portão, ainda na calçada, a mensagem das mãos de um estranho, que deixou o envelope comigo e saiu rapidamente, sem dizer palavra alguma. Mais tarde quando o abri, trancada em meu quarto, compreendi do que se tratava. Era claro que um dia isso iria acontecer. Felipe andava metido em rolos na UFPR há muitos anos, eu sabia disso. Eduarda também não fazia questão de esconder.
Renato apaixonou-se por Virgínia de forma muito mais avassaladora do que eu esperava. Acho que nem mesmo o próprio Dom Albino imaginava que toda a estratégia das Forças Armadas daria tão certo. Bons pais costumam ir muito longe para proteger os filhos. Mas manipular o filho de Teo e trazê-lo para dançar conforme nossa música não seria problema. O fato de seu pai estar em Quatro Barras não poderia lhe ajudar a fugir disso, tampouco apagaria o foco que deveríamos ter agora sobre Renato.
Essa é minha missão.
O que Felipe faria se descobrisse que estou envolvida nisso?
Será que, algum dia, Renato notará que Virgínia tinha olhos verdes e cabelos loiros?

***
CONFIDENCIAL
Serviço Nacional de Informações
Operação Condor
Aos cuidados de Maria Sheilla Souza Kairos Dignoli

Prezada Senhorita,

Flores e FúriasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora