Sexto Capítulo: Renato inicia uma investigação paralela

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Terça-feira, 8 de julho de 1975.

Na Rua Quinze, no meio da manhã, Renato caminhava em frente a inúmeras vitrines. Uma delas pertencia a uma loja de aparelhos eletrônicos, com televisores preto e branco e coloridos. Algumas televisões estavam ligadas, apresentando notícias da semana. Distraído e flanando numa cidade sem rumo, parou e observou, com as mãos nos bolsos e o capuz na cabeça para se proteger do frio.

...rias mortes inexplicáveis continuam ocorrendo na capital paranaense, desta vez no centro de Curitiba. Apenas no último final de semana 3 pessoas morreram nos arredores do Passeio Público. As autoridades não sabem informar se há ligação entre os diferentes casos, porém tudo leva a crer que tratam-se de ações premeditadas de uma célula terrorista, que age sorrateiramente contra pessoas ligadas ao governo estadual, banqueiros e industrialist...

...ista interessante, a respeito de um livro russo, de Dostoiévski, encontrado com algumas das vít...

Renato observava atento às cenas de cadáveres cobertos de uma espécie de lona preta. Sua mente fazia mil voltas, e pensava em quanto tempo o assassino levaria para chegar de um ponto ao outro de onde as mortes ocorreram. Se é que se tratava verdadeiramente de um assassino apenas. A repórter questionava:

- Não existe possibilidade de as mortes estarem relacionadas a casos de hipotermia, devido ao frio do inverno, já que não há marcas de tiros ou violência?

Em absoluto, a polícia está fazendo seu trabalho com imparcialidade e já estávamos monitorando a ação desse grupo há meses.

Por que nada foi feito antes?

Mocinha, pode ter certeza que nas próximas semanas os culpados por essa monstruosidade contra a pátria e a segurança nacional serão apresentados à sociedade, vivos ou mortos.

O DOI-CODI está envolvido nessa operação, Coronel?

O entrevistado saiu de cena. As 3 mortes ocorreram, segundo as autoridades, em um intervalo de 5 minutos, ao longo de mais de três quadras diferentes. Seria impossível que a mesma pessoa conseguisse executar tantos crimes ao mesmo tempo. Renato refletiu e não conseguiu chegar a uma solução plausível para essas espécies de palavras-cruzadas. Estamos falando de um assassino em série ou de alguma estranha força sobrenatural, agindo aleatoriamente sobre os cidadãos? - pensou Renato. As vítimas já identificadas seriam realmente quem as autoridades afirmavam ser? Ou, ao contrário, apresentavam nomes e identidades falsas na tentativa de encobrir a verdade? E todas aquelas outras vítimas sem identificação, quem eram? Por que algumas tinham um livro russo em mãos, enquanto outras não tinham nada?

Marcados para morrer...

Vítimas do terror silencioso da Regime Militar...

Renato raspava a sola do tênis cinza na calçada. Raciocinava sorrateiramente. Olhava para os lados; depois, para o sol. E se as vítimas fossem comunistas, mortos pela própria polícia? Estariam fazendo uma limpa na cidade e semeando histórias falsas na imprensa?

Merda! - gritou, com raiva.

Renato deu um chute numa pequena pedra, que quase acertou um transeunte. Pediu desculpas gestualmente. Enquanto o tempo passava, caminhava e relembrava que as coisas se tornavam ainda mais complexas quando se incluía na equação o caso do Bispo Auxiliar da Catedral. Dom Albino Carvalho havia sido encontrado morto também, em frente a uma lanchonete no Bairro Água Verde. Seu corpo havia acabado de ser identificado, segundo as notícias na tevê.

Sem um método eficaz de investigação, as coisas dificilmente seriam resolvidas e o quebra-cabeça jamais seria finalizado. Ou faltavam peças, ou havia peças de outros quebra-cabeças misturadas.

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