Eu me torno um x-man

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ABRIGO,
JUNHO.

          Jason acordou com o barulho das sirenes. Ele se levantou em um pulo e se colocou de pé, seus sentidos ligados em alerta buscando um inimigo no próprio quarto até perceber que a sirene vinha do corredor. Seu coração batia a mil enquanto ele trocava de roupa rapidamente. 
          — Eva, o que está acontecendo? — perguntou em voz alta.
       O relógio se acendeu em uma luz azul.
          — Protocolo 546, Alerta Vermelho, Invasão em andamento. — respondeu a voz robótica — Invasor está atualmente contido na Sala das Portas, nossas forças estão tendo problemas em contê-lo.
          Sophia. A mente de Jason pensou que seria a cara dele e da sua sorte incrível que algo acontecesse à namorada enquanto eles estavam "brigados". Apesar de saber que o Protocolo impedia que júniores, arcanos dos níveis mais baixos da hierarquia, se envolvesse em qualquer tipo de confronto, seus instintos eram mais insistentes que o seu lado responsável que o obrigava à seguir as regras. 
          Ele pressionou a porta do quarto com as duas mãos, que reagiu ao seu toque deslizando para o lado silenciosamente. O corredor era iluminado por uma luz vermelha que piscava constantemente. A sirene era mais alta ali e fazia seus ouvidos doerem, fazendo seus nervos ficarem à flor da pele. Era como se parte do seu cérebro implorasse por uma batalha. Desde que havia sido trazido de volta à vida, um ano atrás, todas suas lutas foram apenas treinamento, não havia a adrenalina de um risco real.
          Jason viu vários júniores, com os quais tinha aula, parados às portas doa quartos com expressões confusas e nervosas. Ninguém estava nos corredores, ninguém indo em direção às portas. Quanto tempo fazia que os sêniors estavam lutando?  
          Jason viu Emma e Julliet à alguns metros de distância e eles entraram em um acordo: precisam saber como estava indo às coisas. Seguiram pelo corredor apressados, os três lado a lado. Viraram à direita no corredor e avistaram Blair olhando pela janela de vidro das portas de aço.
          Eles passaram pela Sala das Experiências, um cômodo gigantesco de três andares quase inteiramente de vidro duplo, e viram que não havia ninguém lá. Sempre havia alguém criando alguma coisa, uma arma, uma invenção maluca, testando teorias, desfazendo maldições, mas desta vez não havia nem uma única pessoa. Isso lhe causou calafrios.
          A porta seguinte tinha cinco metros de altura e feita de madeira de carvalho, era a Sala das Armas e Instrumentos, o arsenal arcano, estava entreaberta, outra coisa incomum. O protocolo de segurança proibia que qualquer júnior de ter acesso a aquela área, as únicas armas que eram permitidas para recrutas novatos eram as de treinamento. Quando os sêniors começaram o combate ao invasor, no calor do nervosismo de batalha deveriam ter se descuidado e deixado a porta aberta, mas aquilo ainda assim era estranho. 
          Em um ano, Jason só viu o abrigo em estado de emergência duas vezes. Sabia poucas coisas sobre como deveria agir nesses casos, embora a regra geral fosse bem simples: júniores deveriam manter distância e deixar o combate para os seniores. 
          — Isso está bem feio. — avisou Blair.
          — Alguém se machucou? — perguntou Jason.
          — Ainda não.
          Quando Jason chegou na porta e olhou pela pequena janela de vidro viu que a briga estava feia. Um grupo de seniores estava diante de uma porta vermelha aberta de onde saíam tentáculos brancos gigantes, como os do monstro que assassinou Gabriela cinco meses atrás. Ele havia voltado? Jason ficou congelado.   
          Viu Josh e Sophia entre os guerreiros, brandindo suas armas com maestria e se movendo com agilidade e precisão. Ele pensou que mesmo coberta de suor e sangue verde, Sophia estava linda. 
          Foi quando um tentáculo serpenteou e se enrolou envolta do pescoço de um dos seniores e puxou para dentro da porta, desaparecendo em um clarão. Os outros gritaram palavras de ordem e antes que pudessem reagir, mais tentáculos serpentearam para fora da porta indo de encontro à outros seniores, que como o primeiro fora puxado para dentro da porta. Os tentáculos não voltaram a aparecer e o único som que eles ouviam era o de suas respirações no vidro.
          Alguém gritava ao seu lado.
          Jason não percebeu que mais juniores se apertavam tentando ver o que estava acontecendo na Sala das Portas.
          — Precisamos fazer alguma coisa! — gritou Gus, um dos Juniores que estava próximo à Jason.
          A voz de Eva, a inteligência artificial arcana, anunciou no auto falante:
          — Protocolo 5794, alerta vermelho, segurança comprometida, iniciando confinamento de emergência em 5 minutos. Todos se encaminhe para seus dormitórios. Seniors e especialistas já foram convocados para defender o abrigo. Todos se encaminhe para seus dormitórios. Não há nada à temer. Todos se encaminhe para seus dormitórios.
          Foi quando ele puxou Emma pela gola da camiseta e correu de volta para o caminho em que veio na direção da porta de madeira.
          A Sala das Armas era diferente de tudo que já havia visto na vida. O lugar era iluminado por uma luz azul e tinha pelo menos o dobro que parecia do lado de fora. Nas paredes havia uma confusão de objetos presos sem praticamente nenhuma organização ou divisão lógica, uma bareta estava ao lado de uma flauta de ouro, um arco logo baixo de um urso de pelúcia e uma M4 próximo de uma faca de cozinha. Eram metros de armas presas às paredes, brancas, de fogo e objetos úteis em missões como mochilas, guarda chuvas, isqueiros, canivetes suíços, búsulas, lanternas e rádios. Eram tantos objetos que ele perdeu um tempo precioso antes de perceber o motivo pela qual tinha ido até ali.
          — Eva, rastreie os sêniors. Quero saber onde eles estão. — disse Emma ao seu lado.
          O relógio dela se acendeu.
          — Eles foram levados para Roak Fant Island, ao sul do mar negro, coordenadas…
          Jason olhou ao redor e pegou uma mochila, preenchendo-a com tudo que achou necessário o mais rápido que pôde enquanto Eva dava descrições sobre o lugar onde todos, inclusive Sophia, haviam sido puxados. 
          — O que vocês estão fazendo? — perguntou Frederico parado na porta do arsenal.
          — Nós vamos atrás dos outros. — disse Blair passando por ele e buscando suprimentos em seguida. 
          O garoto loiro olhou perplexo para todos.
          — Vocês estão malucos? Aquela coisa pegou todos os sêniors e especialistas do abrigo. Que chances vocês têm? — perguntou com a voz aguda e estridente.
          Jason o encarou com uma seriedade de um ex-pretor e disse com a voz calma e firme:
          — Essa é a nossa casa e eles são nossos amigos, se você não está preparado para arriscar a sua vida pela causa, então saia da frente e vai se abrigar no seu dormitório.
          Frederico tremeu como se fosse começar a chorar e saiu andando em direção aos dormitórios. Muitos outros juniores curiosos o seguiram enquanto Eva continuava a contagem regressiva no auto falante.
          Jason tinha um pressentimento quanto àquele momento. Viu alguns dos recrutas que haviam se inscrito no teste de graduação seguir o garoto loiro de 14 anos, todos com medo, mas era preciso mais do que coragem para entrar naquela briga.
          — Qualquer um aqui, que não se sente seguro em enfrentar diretamente provavelmente a situação de maior perigo de suas vida, com, talvez, altas chances de extinção, volte agora para o seu dormitório. Tenham a mente que não há nenhuma garantia que voltaremos. — disse ele, se voltando ao pequeno grupo que vasculhava a Sala de Armas e Instrumentos.
          Todos o encararam por alguns segundos. Dois deixaram a mochila no chão em um barulho abafado e passou por ele voltando para os quartos. Os outros não vacilaram o olhar. Era isso, esse eram seus companheiros de batalha. 
          Batalha. Jason percebeu que ainda não tinha escolhido uma arma. Olhou ao redor. Várias opções de armas disponíveis, ele estava habituado à espadas e havia muitas ali. Olhando para as paredes, ele viu uma lança de ouro imperial reluzir entre várias armas de fogo. Ela tinha vários detalhes em prata e inscrições nas lâminas que à distância não conseguia ler. Sentiu um puxão no estômago em direção à lança que tinha uma ponta em cada extremidade, era como se ela estivesse chamando-o, escolhendo-o. 
          Quase que hipnoticamente, Jason puxou uma escada que deslizou pela parede, ele subiu dez degraus e assim que tocou a lança, as lâminas se retraíram e o cano encolheu até ser tão pequeno quanto um canudo cabendo facilmente em seu bolso.
          Ele saltou da escada e então seguiu até à Sala das Portas, onde Emma e Julliet já o aguardavam.
          — É isso. — suspirou Emma.
          — Acho que isso é um "boa sorte à todos e tentem não serem extintos". — disse Natalie.
          — Nós vamos voltar com os outros. — exigiu Jason mais para si mesmo do que para os outros — Não aceito nenhum outro cenário.
          Julliet atravessou primeiro, os outros foram logo atrás dela. Ele tomou toda a sua coragem e atravessou a porta aberta. O clarão pálido e o barulho de algo se quebrando ecoou pela mente de Jason, e em um nanosegundo ele estava parado de pé próximo a uma praia de areia branca, as ondas se quebravam logo à sua frente. Atrás de si havia uma porta antiga, do período medieval, e ruínas de um forte. E ele estava sozinho.  
          A praia estava intacta, não havia pegadas e nem sinal de seus companheiros. O coração de Jason gelou por um segundo, temendo o pior, antes da razão controlar os seus batimentos. 
          Esse é o teste, pensou. Algo no seu interior, seu instinto, o estava dizendo o tempo todo que o que tinha visto não era real. Talvez uma ilusão criada por Eva? Poderia ser até mesmo por um inquisidor, com seus poderes mentais, plantando imagens em sua cabeça. No entanto ele sabia, que esse era o seu teste de graduação, adiantado intencionalmente por causa do fim da Lei Marcial. 
          A Rainha havia feito um pedido que soou claro e objetivo para Jason: passe no teste. Óbvio que aquilo aumentava a pressão sobre seus ombros, mas o que o motivava agora era o desejo de voltar para casa. Ele sabia o que ser uma porta significava e isso explicou também para qual panteão era aquela missão diplomática, o seu. Se ele passasse no teste ele iria para casa, se não passasse talvez nunca mais tivesse a chance de ver os amigos e a irmã novamente.
          Jason olhou ao redor, do seu lado esquerdo havia um paredão de pedra muito íngreme de doze metros de altura, isso o deixava com dois caminhos possíveis, poderia seguir pela praia até talvez dar a volta ou entrar na mata atrás de si. A extensão da ilha era enorme, poderia levar dias para achar algo se caminhasse sem rumo testando própria sorte.
          Se estivesse com os poderes de semideus poderia simplesmente voar e ter uma visão completa do lugar.
          Pense, Jason, pense. Ele notou que ainda estava pensando como um semideus. Os arcanos tinham uma inteligência artificial capaz de acessar qualquer tecnologia humana e arcana e utilizá-la. Câmeras, notebooks, sistemas de seguranças e claro, satélites, tudo ao seu dispor. Foi quando entendeu o que tinha que fazer. 
          Passo um: analisar e decidir para onde ir. Ele não tinha dias, o tempo máximo para o cumprimento do teste era 24h, precisava saber exatamente onde estava e para onde ir, não tinha tempo a perder. Além do mais, havia a parte mais importante, e possivelmente parte da sua avaliação: a estatística. A estatística é o estudo da magia e de como combatê-la e absolutamente tudo que os arcanos eram, defendiam e faziam era baseado nisso, em um estudo aprofundado e detalhado da magia.
          Diferente dos semideuses, os arcanos trabalhavam com dados cada vez mais específicos. A magia era mista, havia inúmeros panteões de deuses com suas diferentes magias naturais pelo mundo e havia a magia roubada da cúpula, os arcanos estudavam por anos para aprender a diferenciá-las. Magias naturais deviam ser protegidas e mantidas como estão, não importa se um titã do tempo está tomando conta dos Estados Unidos ou se uma deusa primária decidiu acordar e destruir a humanidade, isso é problema do panteão à qual essa magia pertence. Agora, se alguém descobriu a magia e a está usando fora do contexto de um panteão, como por exemplo para dar poderes à um humano insignificante e torná-lo poderoso o suficiente a ponto de hipnotizar metade de um país para criar seguidores robóticos e zumbitizados, então os arcanos apareciam. Saber a diferença dos dois e como impedir o segundo tipo, era estatística e Jason era um dos melhores estatísticos da sua turma.         
          O passo 1 dependia disso.
          — Eva, por favor me mostre o mapa químico e térmico e verifique se há qualquer conexão tecnológica em toda a ilha. — disse ele.
          O relógio se acendeu em uma luz azul e respondeu:
          — Não há conexões tecnológicas na ilha. É possível dizer que ninguém habita aqui há pelo menos 100 anos.
          Um mapa holográfico surgiu diante dos olhos de Jason, o scanner térmico mostrava diversos animais de sangue quente e humanos, possivelmente os outros arcanos, se movendo em pontos isolados. Não sabia como cada um tinha acabado sozinho em algum lugar aleatório, não era assim que a travessia de portas funcionava, mas os especialistas deveriam ter dado um jeito. Não viu nenhum sinal dos sêniors, mas já desconfiava que eles não estariam ali de qualquer forma.
          A imagem holográfica do mapa mudou e diversas linhas surgiram, como as linhas imaginárias de coordenadas, deixando a imagem cheia de riscos. O hologramas começou a oscilar fazendo um barulho desagradável como a de uma TV antiga que não estava funcionando fazendo ser impossível de compreender. Jason deu dois tapas no relógio, mas isso só pareceu piorar ainda mais a conexão fazendo a tela ficar embaçada em uma tonalidade azul.
         — Eva, faça uma releitura biométrica da floresta e…
         — Há uma inter… ferência na conexão, bio... mal sucedida. — interrompeu a voz robótica falhando
          A imagem oscilou ainda mais e se apagou. Havia alguma coisa muito poderosa afetando os sistemas da Eva e ele concluiu que teria que ir para a parte mais alta daquela ilha se quisesse ter uma boa visão, mais ampla, do ambiente. Pegou o cano em seu bolso, sem saber exatamente como convocar as lâminas. Ele ergueu o braço para frente, como se desse um soco no ar, e a lança surgiu brilhando como se reluzisse no sol, sendo feita de ouro poderia muito bem ser isso.
Jason começou a caminhar para o norte torcendo para que estivesse indo para o caminho certo.
          Por mais que a umidade da floresta parecesse em boas condições, o ar ali era pesado e abafado e não demorou muito para que Jason começasse a transpirar como um frango no forno. Ele pisou em uma samambaia e imediatamente um lagarto gigante, maior do que ele, correu assustado, deixando-o com o coração acelerado para trás. O garoto já estava ofegante, passou os dedos entre os fios loiros e encharcados de suor e engoliu em seco. Era apenas um lagarto, ele pensou. Era só um animal, Jason
          Ele seguiu adiante, quase um metro de distância depois, escutou um barulho de galho se quebrando atrás de si e parou instintivamente, olhando para trás rapidamente, porém não viu nada. O barulho se fez novamente só que desta vez de outro lado da floresta. Jason olhou ao redor e não viu nenhum perigo iminente, então disse a si mesmo que poderia ser apenas algum animal silvestre, talvez mais lagartos. Era possível que estivesse próximo à um ninho deles e uma lagarta-mãe estaria muito furiosa com a invasão em seu território. Esse pensamento lhe causou um arrepio involuntário na nuca e ele apertou o passo desejando sair o mais rapidamente daquela parte da ilha.
             Enquanto caminhava, a terra quase plana começou a ganhar relevo, passou por um terreno cheio de pedras e uma nascente que corria na direção em que tinha vindo, logo estava subindo uma serra e quando menos percebeu se viu sobre as bordas de um planalto consideravelmente alto. Ali de cima conseguia ver todo o caminho traçado até onde se encontrava e um boa parte da ilha. Cerca de 60% era coberta por uma mata tropical, o restante era divido em colinas rochosas, uma montanha do outro lado e um vale que seguia um largo rio, que daria um ótimo lugar para um picnic.
          Jason ergueu o pulso e o mapa holográfico surgiu do relógio, desta vez a imagem estava nítida e não oscilava.
          — Eva, faça novamente um escaneamento do caminho percorrido até aqui até uma área em um raio de 500 metros de distância. — disse Jason.
          Em menos de um segundo o mapa holográfico mostrou novamente linhas por toda a extensão do território, aquelas linhas eram as linhas de Ley, uma espécie de previsão mágica presente, passada e futura.
          As linhas de Ley são correntes mágicas e são originais fixas. Elas existem desde que o mundo existe e tudo que é mágico se originou delas. Há muitos séculos, quando surgiram os deuses, eles eram capazes de não apenas utilizá-las, mas também de redirecioná-las, criando assim novas linhas através das originais, linhas mágicas secundárias. Assim, eles não precisavam mais estar em cima de uma linha de Ley para utilizar magia, eles podiam invocar uma nova corrente até onde eles estavam e aí poder utilizá-la como bem quisessem.
          É confuso, mas pense o seguinte. As linhas de Ley são como o wi-fi,, sem ele você não tem internet, sem as linhas de Ley não tem magia. Elas ficam em lugares específicos, a grande maioria do mundo não possui uma corrente mágica, aí você, que deseja usar magia, precisa ir até uma área com esse wi-fi ou você pode utilizar um roteador-duplicador para puxar o wifi original para você. Então é claro que os deuses preferiram duplicar as linhas originais. 
          Diferente das originais, esse wi-fi duplicado é temporário e desaparece se não for usado com frequência, se dissipando totalmente. Várias outras pessoas herdaram a habilidade de duplicar as linhas de Ley, como os semideuses, os arcanos e basicamente quase qualquer ser mágico. Foi quando as linhas duplicadas foram redirecionadas também, criando linhas triplicadas, quadruplicadas, até que o mapa ficou uma bagunça de linhas como galhos de árvores, se galhos de árvores fossem linhas retas. 
          Todos os segundos linhas surgiam e desapareciam, se você piscasse poderia perder uma grande mudança. Quanto maiores, mais poderosas eram a corrente mágica e algumas linhas foram tão duplicadas que eram quase invisíveis. 
          Então tinha as linhas curvas. Linhas retas eram linhas naturais, linhas curvas era um redirecionamento feito por pessoas que não tinham permissão de usar magia, uma espécie de gambiarra do mal, por isso a corrente não era perfeita. Claro que havia algumas dessas pessoas que eram tão boas em praticar magia que a curva que a linha fazia no mapa era quase imperceptível. Para a sorte de Jason, esse não era o caso. Seja lá o que fosse que estivesse naquela ilha, estava usando magia ilegal de uma forma muito mal feita e por isso havia duas linhas curvas indo em direção a um lugar que ficava bem na frente de Jason. 
          Três juniores estavam em um lugar cheio de linhas, mas todas lá eram retas. Outros dois estavam em um cruzamento de linhas de Ley originais e somente Jason estava indo em direção às linhas curvas. O filho de Júpiter começou a descer o planalto em direção ao vale com cuidado.
          Escondida no meio da mata, havia um templo meio destruído. As paredes de pedra cinza escuro estavam cheias de lodo e em algumas cresciam cogumelos que Jason desconfiava que não fossem comestíveis. O lugar era mais ou menos do tamanho dos templos em Atenas, informação que ele sabia, porque havia estado lá e visto tudo pessoalmente, mas aquele era mais alto. 
          Um galho se quebrou bem ao seu lado e ele se virou segurando a lança pronto para atacar. Ele se deparou com uma raposa branca bem pequena, talvez filhote, fuçando um buraco. O animal o olhou nos olhos fez um barulho que parecia uma risada estranha e correu. 
          Jason voltou a sua atenção ao lugar. O templo era bem aberto, basicamente um grande quadrado sem teto e com boa parte das paredes destruídas.Haviam pequenas estátuas esculpidas nas paredes verde-musgo e que estavam enroladas em galhos que surgiam no chão como tentáculos de madeira. 
          Algo lhe dava arrepios, como se alguém sussurrasse seu nome, ou estivesse lhe vigiando nas copas das árvores. Os mapas de Eva  não detectavam nenhum movimento suspeito ou algum perigo imediato, mas isso não o impediam de se manter em alerta e considerar sua intuição, para o que quer que fosse essa presença. Ele havia estudado sobre templos e o resquício de magia que ficava neles mesmo depois de serem completamente destruídos, aquele era frio, diferente do resto da floresta, a magia ainda estava ali à espreita.
          Seu corpo tremeu involuntariamente.
          — Eu sei que você está aqui e você sabe que estou aqui. — disse ele para o nada, esperando uma resposta, mas receoso de escutá-la. — Então porque a gente não começa logo com isso?
          O nada não respondeu.
          A raposa regougou novamente atrás de si e ele ignorou.
          Jason olhou o mapa novamente, os arcanos pareciam envolvidos em alguma briga, baseado em seus batimentos cardíacos, e começou a se perguntar se estava no lugar errado. As linhas curvas que terminavam ali ainda estavam visíveis, portanto haviam sido usadas recentemente, mas mesmo assim não havia nenhum sinal de calor perto dele. Nem mesmo os dos pássaros ou de qualquer animal, era como se todos os animais tivessem fugido.
          Espera. Ele se virou. A raposa ainda estava à dois metros de distância, farejando a terra à procura de comida, o que a princípio não era suspeito. A única coisa estranha era que raposas eram animais de sangue quente e ela não aparecia no mapa de calor. 
          Jason a olhou de soslaio, a raposa já havia parado de fuçar por comida e agora o encarava imóvel e fixamente com uma sabedoria racional escondida sob seus olhos laranjas, o que para um animal era impossível. Foi quando percebeu que ela era o inimigo, encarando-o como se estudasse uma presa com os lábios repuxados em um sorriso pontudo e assustador. 
          Ele apertou a lança, apontando a lâmina para frente sem fazer movimentos bruscos, mas a raposa analisa cada pequeno movimento seu. Ele aguardava pelo ataque dela, ela aguardava pelo movimento dele. Então outra coisa atacou. Algo agarrou os pés de Jason e o puxou para trás fazendo-o cair de cara no chão. Ele se virou rapidamente e viu grossas raízes apertando sua canela com tanta força que achou que seus ossos iriam partir. Golpeou várias vezes e as inscrições pareceram cintilar brevemente enquanto as lâminas afundavam na madeira como manteiga fazendo seiva escorrer pelos seus tênis. Poucos segundos depois, as raízes o soltaram e recuaram para a floresta como se ele tivesse conseguido ferí-las.
          — Que merda foi isso?
          Ele se levantou, sentindo o tornozelo reclamar do peso. 
         A poucos metros de distância, as estátuas estavam paradas, fora de seus postos nas paredes do templo, com lanças e espadas em mãos, como se tivessem pensando em usar a distração para atacá-lo, e a sua inimiga raposa estava sentada encarando-o fixamente enquanto balançava suas caldas. Sim, caldas, ela tinha 10. Jason tinha certeza que só havia visto uma na primeira vez que a viu. 
          Como se já esperasse outra coisa acontecer, Jason viu as dez caudas da raposa se desprender do corpo, e automaticamente não havia apenas uma raposa de dez caudas e sim 10 raposas cada uma com uma calda. O garoto contraiu os músculos da mandíbula e apertou a hastes da lança, já a raposa por sua vez se aproximou dele lentamente e por um momento Jason acreditou que estava alucinado porque conforme as raposas se aproximavam elas ficavam maiores. Ele se afastou contidamente, um passo de cada vez, evitando fazer movimentos mais rápidos, as raposas andavam lado a lado em uma sincronia treinada. O garoto sentiu algo enrolar em seu tornozelo e se virou rapidamente despedindo golpes enquanto tentava não perder as raposas de vista. As raízes haviam voltado dessa vez eram mais grossas e o apertavam cada vez mais enquanto subiam pelo seu corpo como serpente, ele já sentia seus ossos se partindo. Os tentáculos de maneira já estavam em sua cintura, então calculou que teria no máximo alguns segundos antes dos seus órgãos serem esmagados.
          A raposa o atacou, mas por sorte ele viu o pulo dela e de seus clones segundos antes. Ele girou a lança cortando duas que guinchou e espirrou sangue verde nele. Sufocou um grito quando outras duas morderam seus braços. Ele se balançou e as bateu contra uma parede, quando conseguiu que elas o largasse, acertou-as com a lança em dois movimentos rápidos. 
          Jason gritou. Os galhos apertavam seu estômago e a dor era insuportável. Os nós dos dedos estavam brancos pois ele apertava a sua arma com força. Sentiu o suor escorrer pela nuca.
          Foi quando a madeira começou a chiar e fumegar. Seus pés começaram a formigar e a sensação subiu pelo seu tronco até a altura dos ombros. Jason imaginou que iria morrer de novo.
          — Fique quieto. — disse uma voz atrás dele. — Isso é ácido.
          — Blair? — sua voz saiu rouca e fraca.
          — A única, a não ser que aquela de Gossip Girl conte. Nesse caso, eu sou só a primeira. 
          As raízes chiaram mais alto e caíram no chão, sem vida e sem se moverem novamente. Jason olhou ao redor e percebeu que a raposa havia sumido.
          — Obrigada por salvar a minha vida contra não-faço-ideia-do-que. — suspirou ele.
          Blair sorriu.
          — Um estatístico tão bom quanto você ainda não percebeu? — provocou ela. Ele fechou a cara, tentando parecer irritado, mas ela apenas riu. — A ilha é viva e odeia intrusos.
          Ele se colocou de pé e gemeu. Alguns de seus ossos estavam quebrados, a costela partida estava pressionada contra seu pulmão.
          — Aí.
          — Ei! Vai com calma.
          Blair o carregou até o encostar na parede, fria e pegajosa, do templo. A mulher de meia idade tirou de uma bolsa de lado um kit de primeiros socorros e se prontificou a cuidar dele. Começou limpando os cortes e dando seu melhor em colocar talas em suas pernas. Jason olhou ao redor, conferindo o perímetro. As estátuas estavam no chão, partidas em diversos pedaços e não havia nenhum perigo à vista.
          — Como você lutou contra as nossas amigas de pedra tão rápido? — perguntou.
          — Quando eu notei que a ilha estava me atacando, criei logo um bloqueador de magia com ametista. — respondeu ela — Joguei um aqui assim que cheguei e parei a força mágica daqui, a ilha teria que passar pelo meu escudo para nos atacar agora.
          — Isso explica o porquê da raposa ter sumido. 
          Blair fez uma careta.
          — Que raposa?
          Jason olhou pelo ombro da alquimista e a cor sumiu dos seus olhos.
          — Aquela que está bem atrás de você.
          Blair se virou rapidamente e Jason viu quando suas luvas se transformou em mãos robóticas que despertariam a curiosidade de Leo. Uma raposa pulou nela e a puxou para fora da sua visão, outra pulou nele no exato momento em que levantou a sua lança perfurando-a na hora, mas ele bateu com força na parede do templo que desabou levando-o junto.
           Jason caiu no chão com um baque doloroso. Ele se viu rodeado de 8 raposas grandes o suficiente para serem do tamanho de um urso adulto, duas ainda jorravam sangue verde e mancavam, porém pareciam igualmente ameaçadoras. As raposas grunhiram e mostraram os seus sorrisos pontudos como se tivessem sorrindo zombeteiras para o garoto. Ele sentiu o coração acelerar descompassadamente, a sua cabeça começou a latejar e a sua visão escureceu gradativamente, só depois de uns segundos percebeu que não estava prestes a desmaiar. Sua visão voltou, mas seu ouvido zumbia.
          Ele viu uma raposa rasgar a perna de Blair enquanto ela tentava socar outras duas que atacavam sua cabeça. Viu em câmera lenta quando as outras 4 restante investiram contra ele e por um segundo teve medo. Foi quando notou que o sol havia ido embora e as árvores pareciam se inclinar para ele o deixando com uma sensação de claustrofobia. A magia do bloqueador deveria estar se dissipando.
          Sophia dizia que depois que você se tornava um arcano, morrer ficava mais fácil, mas ele odiaria reprovar no teste e nunca mais poder ver seus amigos antigos novamente. 
          Um arrepio percorreu novamente o seu corpo, e desta vez soube que não era um arrepio normal, era como uma corrente de eletricidade ganhando vida em seu corpo como uma adrenalina que ligou no máximo todos os seus sentidos até que única coisa que sentia era a eletricidade.
          Então aconteceu, Jason sentiu seu corpo atrair algo extremamente poderoso, como um magnetismo do qual saberia que não iria conseguir fugir, o céu se rasgou e um raio atingiu o garoto que instintivamente abriu os braços liberando toda aquela carga que seu pequeno corpo conseguiu suportar. Seu corpo estava quente e imediatamente sentiu a dor das fraturas se dissipando. Um clarão seguido por uma explosão varreu a mata e quando dissipou, Jason se viu ainda no mesmo lugar e a raposa, apena uma agora, estava caída perto de uma árvore, imóvel e de volta ao seu tamanho de filhote. As árvores estavam inclinadas, mas não para a direção de Jason. Abaixo dele a terra havia escurecido por causa do raio e o seu corpo quente cheirava a queimado. Sua roupa e seu cabelo estavam chamuscados.
          A energia que o atingiu se foi e suas pernas perderam a força. Jason caiu de joelhos respirando fortemente, as costelas ainda doíam um pouco, mas não pareciam mais quebradas.
          — É, esse é um jeito de resolver as coisas. — gemeu Blair. — Dar uma de Tempestade quando ela se torna uma entidade em Fabulosos X-Men.
          Jason riu e caminhou em direção à amiga.
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M.A.( Mensagem da Autora):
O próximo capítulo será no acampamento pelo ponto de vista de Nico di Angelo e será postado ainda hoje, segunda-feira dia 23 de novembro, então esperem por Solangelo é claro!

E aí? O que acharam? O que entenderam? O que não entenderam? Ansiosos pelo que?

POR FAVOR COMENTEM, esse é o meu salário.

O Riandoverso e o Diário das Sombras Nº: 32Onde as histórias ganham vida. Descobre agora