Capítulo VIII

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Apesar da noite mal dormida, Selene não se sentia nem um pouco cansada. Pelo contrário, sentia-se inquieta, ansiosa. Foi um esforço parar de tamborilar os dedos na imensa mesa de carvalho. Seu café da manhã permaneceu intocado.

A garota observou Balken terminar de beber o vinho, erguer uma faca e bater suavemente na lateral da taça, produzindo um tilintar. Todos se levantaram.

— O próximo mês virá acompanhado de acontecimentos decisivos para o destino do reino.— Sua voz tempestuosa ressoou pelas porcelanas e cristais.— Telbeth, meu filho, aproxime-se.

O rapaz foi até o pai, relutante e nervoso. As narinas dilatavam-se e a garganta oscilava. Receava receber outra surra e, automaticamente, seus músculos se tensionaram ao aproximar-se do homem.

— Com seu aniversário de dezenove anos, a coroação não tardará em chegar, é preciso estar preparado.

Telbeth fitava o chão com tanta intensidade que parecia desejar ser engolido por ele. Selene sentia que podia cortar a tensão presente no ambiente com uma faca.

— Os preparativos estão sendo iniciados. Hoje será um dia cheio para todos nós. Dispensados.

Mãe e filha se retiraram, porém o primogênito foi forçado a ficar, preso pela mão firme do pai em seu antebraço. Balken sussurrou algo em seu ouvido e o rapaz assentiu, com o peito subindo e descendo rápido demais.

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Quando Selene entrou no quarto, uma criada já a esperava, como sempre. Porém, sua agitação e apressamento não eram habituais. Ela fora instruída a conduzir a garota até uma grande sala com várias janelas, onde fariam as provas dos trajes comemorativos.

— Que bela moça você se tornou, Selene. Há tempos não a vejo.

Teressa, a alfaiate, sorria ao lado de um manequim. Os cachos escuros presos num coque arqueavam seu rosto, deixando-a com uma aparência séria. A menina adorava aquela mulher, e, como não podia abraçá-la, limitou-se a sorrir e fazer uma mesura.

— Dizer que está a mesma de sempre já seria um grande elogio— disse a jovem, subindo no pequeno tablado de madeira posicionado à frente de um grande espelho.

O sorriso de Teressa aumentou enquanto ela abria uma mala suspeitosamente grande.

— Este aqui é para o aniversário— comentou, contemplando o próprio trabalho.— Precisa vesti-lo para termos certeza de que está perfeito.

Selene assentiu, e a criada afastada se aproximou para despi-la. A alfaiate, com todo o cuidado, retirou o traje de dentro da mala e o esticou numa mesa de madeira que fora colocada ali. Não era possível vê-lo por completo por causa dos manequins, caixas e malas, porém a jovem sabia que seria magnífico. Sempre eram.

Pela primeira vez, porém, Selene não se sentia eufórica ou animada, sentia culpa. Um ressentimento tão grande que anulava o brilho de qualquer joia, tecido ou enfeite.

— Aqui está!— exclamou a mulher, exibindo o vestido.

Após ser vestida, a jovem admirou-o pelo espelho.

A musselina cinza circundava-a como uma névoa densa e as pedras dispostas por todo o seu comprimento assemelhavam-se ao granizo que despencava do céu. Não possuía mangas, e a gola alta cobria metade de seu pescoço. Um traje tão...

— Sério. Sua mãe queria trajes que transmitissem seriedade. E, veja pelo lado bom, combina com seus olhos.

De fato, combinavam.

— É muito bonito, Teressa. Deve ter trabalhado nele por um bom tempo...

— Ah, sim, claro que trabalhei. Serviu bem?

— Perfeitamente.

— Bem, já pode retirá-lo, então.

Selene assentiu, e a criada começou a auxiliá-la. Parecia encantada com a vestimenta, acariciava o tecido como se fosse um tesouro precioso...

— Teressa?— chamou a menina, o que fez a moça baixar o olhar, constrangida.— Poderia tecer um presente?

— Presente? Para quem?

— Uma colega.

— Ora, é claro. Só precisaria das medidas dela, você as têm?

— Hum, não. Mas são parecidas com as de... Qual é mesmo o seu nome?— Ela nunca fora informada de seus nomes. Conversar diretamente com um criado era inadmissível.

— Anna— respondeu, os olhos arregalados.

— É, são parecidas com as de Anna.

Teressa alternou o olhar entre Anna e Selene algumas vezes antes de dizer:

— Muito bem. Venha aqui, querida.

Anna, trêmula, subiu no pequeno tablado para ser medida, baixando o rosto para esconder um sorriso.

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Balken caminhou lentamente até o aparador para pegar sua garrafa de rum. Em seguida, aproximou-se do filho e despejou o líquido em um copo de cristal. Deixou que o aroma forte infiltrasse em suas narinas e inebriasse os pensamentos do filho, então puxou o copo para perto de si e sentou-se atrás da mesa escura de carvalho, em sua cadeira.

— Você me decepcionou, Telbeth. Quase não lhe reconheço mais como filho.

O rapaz baixou a cabeça e fechou os olhos. Se tivessem mais um daqueles dolorosos diálogos...

— Porém não posso mudar o sangue que corre em suas veias. Logo irá assumir o trono, e precisa estar preparado.

Ele abriu os olhos, mas não se movimentou.

— Também precisa saber...— sibilou o homem, levantando-se—...que não perdoarei mais deslizes de sua parte. A coroa poderá estar em sua cabeça, mas o poder sempre estará em minhas mãos.

Telbeth sentiu um calafrio percorrer sua coluna quando o pai segurou a parte de trás de seu pescoço com uma das mãos. O anel de rubi roçava em sua nuca, propositalmente.

— Tenho algo a lhe dar— declarou, apontando para uma pequena caixa no meio de sua mesa.

O rapaz caminhou até ela, impelido pela mão em seu pescoço. Pegou-a com delicadeza e a levou à altura dos olhos. Quando abriu, pôde ver a ornada chave de ferro que o pai sempre carregava no peito. Ele o olhou apelador, porém o homem admirava o objeto, encantado.

— Siga-me.

˚✧₊⁎༚*・゜゚・*:.。..。.:*・'・*:.。. .。.:*・゜゚・*
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Até a próxima 🤍

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