Capítulo XXVI - Fim da Parte 2

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Selene revirou todos os cantos possíveis em busca de algo que servisse em Caden mas a única coisa que tinha além de vestidos e saias eram calças de montaria feitas sob medida. Nenhuma serviu. Ele tirou o disfarce e ficou de calções e camisola. Deschia também.

— Esperem um segundo. — Ela saiu e pediu para que um guarda chamasse especificamente por Anna. Ele obedeceu, um pouco intrigado.

Ao voltar e fechar a porta, levou um susto ao ver Caden encostado na parede atrás dela. Deschia estava sentada na cama, com uma perna cruzada sobre a outra.

— Sabe, eu não me importo de usar um dos seus vestidos. Calças são desconfortáveis — disse a garota.

— É só escolher — respondeu Selene. Deschia ficou desacreditada por uns segundos, mas logo correu até o guarda-roupas e começou a admirar as diferentes peças.

A princesa voltou seu olhar para Caden, ainda encostado na parede, tão pálido como uma vela.

— Está tudo bem?

— Uhum.

— Tem certeza? — Dessa vez, a resposta foi uma careta que a fez apontar para a porta do banheiro. Ele correu com as mãos na boca

— Ele vai ficar bem. Nós nos curamos rápido. — Deschia deu um meio sorriso para Selene e ela soltou um suspiro.

— Me desculpe por isso.

— Não foi você quem nos prendeu lá dentro.

As duas ficaram em silêncio por um bom tempo, enquanto Caden colocava as tripas para fora no banheiro. Quando uma tosse convulsiva e abafada se manifestou, elas correram para ajudá-lo.

A primeira coisa que viram foram as manchas pelo chão. As roupas brancas de Caden estavam manchadas de vermelho. Ele limpou a boca com as costas da mão e soltou um gemido.

— Isso é...

— Sangue. — Medo tomou conta dos olhos de Selene. — Deschia, tem uma jarra d'água no meu quarto... — A garota saiu tão rápido quanto entrou, ansiosa para desviar o olhar daquele monte avermelhado. A princesa ficou e pegou uma toalha de cima de um banquinho com três. Ela olhou para o penico cheio de sangue coagulado enquanto ajoelhava e quase vomitou também.

— Aqui está.

— Obrigada, Deschia. Caden, beba um pouco e cuspa.

Um ou dois minutos depois, batidas soaram na porta. Selene atendeu rapidamente e deu um suspiro de alívio ao ver Anna. Ela a segurou pelos ombros e disse.

— Eu gostaria de poder explicar tudo, mas não temos tempo. Preciso que pegue a maior quantidade de itens da enfermeira que conseguir trazer. Rápido.

A criada começou a questionar, porém ao ver a urgência nos olhos da princesa, saiu apressada. Selene voltou para o banheiro assim que ela se foi e viu uma confusão aguada e sangrenta ali. Deschia estava verde.

— Aqui está muito sujo. Vamos para o quarto. — Ela tirou Caden do chão com a ajuda de Deschia e pegou um baldinho de madeira e mais uma toalha antes de sair dali e fechar a porta.

— Eu comi... uvas. E pão. Acho que foi isso. — Selene olhou para ele. Ela o viu comendo na sala em que estavam antes, só não achara que isso aconteceria depois.

— Tudo bem, vai passar — disse, deitando-o na cama. Ele estava arrepiado e isso a deixou arrepiada. Deschia olhou debaixo da porta e depois levantou o olhar para eles, com o dedo indicador na frente da boca. Os guardas estavam bisbilhotando.

Selene ferveu de raiva, mas não fez nada além de morder a língua e fazer silêncio. Deschia se juntou a ela e arrancou outra flor do cabelo, Caden se encolheu na cama.

— Calma — disse com um suspiro. Na mesa de cabeceira, havia uma taça com água até a metade. A garota a pegou e colocou algumas gotas dentro da flor que incharam e embranqueceram. Dessa vez, o rapaz bebeu sem reclamar.

Um tempo passou e Caden permaneceu estável. Quando Anna voltou, quase derrubou tudo no chão ao ver uma garota com o cabelo feito de flores em pé ao lado da princesa e um rapaz ensanguentado deitado em sua cama. Selene levou um dedo à frente da boca enquanto fechava a porta atrás da moça.

— V-Vossa Alteza...

— Shhh. Não se preocupe. — Selene retirou a maleta da mão da criada, a levou até a cama e a abriu. — Não se preocupe, Anna.

A moça permaneceu parada. Deschia deu um sorriso e Caden levantou a cabeça e deu um aceno fraco, o movimento o fez tossir mais sangue.

— Ah, céus. Ah, céus! Ele está... — Anna começou a passar mal, e Selene foi acudi-la enquanto a jovem feérica se
encarregava de escolher medicamentos.

— Anna, ele vai ficar bem. Sente-se um pouco. — A princesa, que era uns quinze centímetros mais alta, inclinou-se sobre ela e passou um braço por seus ombros. — Isso, muito bem.

— É só suco de framboesa — disse Caden, piscando um olho. E tossiu de novo. Selene inspirou fundo e foi até ele.

— Deschia, há algo útil aí dentro?

— Tem espinheira-santa. Pode servir se eu encantá-la — Anna arfou ao ouvir aquilo.

— Você faz magia? — perguntou estupefata.

— Ah, sim. Vou tentar intensificar o efeito e... vocês verão.

Selene assentiu e pegou uma toalhinha de cima da cama para secar a testa suada de Caden. Ele estava gelado e tremendo, mas sorria tolamente.

— Você até que é bonitinha. — Ela franziu a testa e o ignorou, o que o fez rir. O garoto apertou os lábios para não tossir no rosto de Selene.

— Estamos fazendo muito barulho — sussurrou Anna, olhando para o vão da porta sem se mover. — Muito.

Todos congelaram em seus lugares e seguiram o olhar da moça. Três pares de botas estavam bem próximos. O nervosismo e a tensão aumentaram exponencialmente no quarto. Selene foi até a porta e se abaixou até encostar a bochecha no chão. Ela ouviu os guardas cochichando para que chamassem o Rei.

Ao se levantar, riu alto:

— Cuidado com este alfinete, Anna. Quero um vestido perfeito, mas não quero uma barriga furada.

As três a acompanharam, e riram também. Por sorte, não precisavam disfarçar o temor assustado em seus olhos.

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Marylia, Olga e Matteo abandonaram a pensão e saíram no meio da noite, olhando quase sempre para trás.

As ruas estavam enfeitadas e silenciosas e a impressão que tiveram foi a de que eles eram as únicas pessoas no mundo.

A Lua de Sangue, ainda alta no céu, parecia prolongar a noite. A manhã só começaria quando a ferida vermelha no céu cicatrizasse e os raios de sol pudessem brilhar novamente.

Até a aurora parecia distante demais.

*・゜゚・*:.。..。.:*・'・*:.。. .。.:*・゜゚・*
Oie! Chegamos ao fim de mais uma parte 🙃
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Até a próxima!

O Encanto da LuaWhere stories live. Discover now