22. Peso das correntes - Parte II

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Missa

Brion estava vivo.

Vivo.

Foi aquele pensamento que a manteve sã. Era o que a mantivera de pé, mesmo quando era empurrada e insultada. Foi o comprometimento pela segurança do irmão a chave para não revidar os socos e chutes. Não conhecia aquele lugar, nem aquela gente. Mas não era idiota para não perceber que estava na capital de Infrante, Aentriv. Uma cidade que jamais pensara — ou quisera — pisar. Um lugar que na sua infância não passava de contos e boatos. Onde o rei que nunca vira — e nem veria — vivia com seus três belos filhos.

Um agora coroado. Uma já morta. E outro um suposto assassino.

Belos filhos.

Brion. O nome ecoou dentro dela enquanto a arrastavam por corredores escuros e cheios de celas imundas. Não diferentes das prisões dos vampiros. Ele está bem, está vivo, repetiu para si mesma como um mantra.

Kalorion. Seu lobo, sua criança. Morto. Assassinado. E ninguém se lembrava, ninguém ligava... além dela. Ódio ferveu dentro do seu peito. Tinham matado Kalorion. Seu lobo, parte da sua matilha. Ela lembrava-se do pequeno filhote que resgatara e cuidara. Fora o primeiro ser vivo que se importara com ela. Missa lhe deu um nome e ele lhe deu amor incondicional. Kalorion não se importava de quem ela era. Bastarda ou Híbrida, nada disso tinha importância na língua do lobo, eram apenas coisas idiotas criadas pelas pessoas. Ela o amava como sua criança.

Seus olhos encheram-se de ódio e fúria.

Kalorion estava morto, mas Brion estava vivo. Seu lobo defendera sua outra criança até o fim. Ela não deixaria que a última pessoa que amava morresse. Não suportaria a morte de mais um.

Os soldados que a carregavam a jogaram em uma cela escura sem nenhum cuidado. Missa rolou pelo chão úmido e escorregadio, os grilhões feitos de uma pedra escura batendo em suas pernas como chicotes duros e esfolando seus pulsos já feridos. Ela levantou em instinto, mas voltou a cair com um chute forte da mulher-soldado. A Lobisomem se agachou diante dela, pegando pela corda da focinheira. A estranha rosnou em seu rosto, ordenando que ficasse quieta. Missa quis arrancar a pele do rosto daquela mulher, rasgar sua garganta e jogá-la contra a parede. Ela quis urrar e quebrar aquela maldita pedra-negra contra a parede, queria libertar suas mãos e seus pés para avançar contra o outro soldado e esmagar a cabeça dele na parede do corredor.

Entretanto Missa não fez nada daquilo. Brion estava com a garota Demônio. Todavia, a garota estava com eles. Proteção temporária era frágil e limitada. Então, ao em vez de fazer tudo aquilo, ela submeteu-se. Ficou muito quieta enquanto eles prendiam os grilhões dos seus pulsos e tornozelos contra a parede do fundo da cela, onde a escuridão era intensa e quase parecia se mover de tão viva. A mulher lhe deu mais um chute antes de partir com o companheiro. A porta de ferro fechou-se com um terrível rangendo, deixando as trevas engolirem a cela e Missa.

Ela sentou no chão... o que era a única coisa que podia fazer, já que as correntes curtas não a deixavam ficar nem em pé nem deitada.

Missa fechou os olhos, encostando-se na parede fria. Não havia nenhuma janela no cubículo, além de uma pequena abertura na porta, de onde uma luz tremulava forte e quente demais para ser feita de magia. Uma tocha.

Merda.

Ela rangeu os dentes, frustrada com o silêncio. Na estrada, estivera trancada e sozinha, mas pelo menos havia o som dos pássaros, o movimento da carruagem, a luz que adentrava por uma janela estreita coberta por barras de ferros grossas, as conversas dos soldados, a agitação do acampamento e os encontros com a menina Demônio.

A Lei da EspadaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora