52. Eu estou bem

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Jake não saberia dizer o que o levara a abrir o minibar requintado que existia na sala de estar. Ele sabia que todos os seus movimentos eram cuidadosamente estudados por April, ainda presa à cadeira desconfortável. Ele também sabia que tinha que resolver tirá-la dali mais cedo ou mais tarde, no entanto, no que dependesse de si, seria para mais tarde.

Ele simplesmente achara que merecia esquecer tudo o que acontecera durante breves horas para então poder recolocar a sua máscara e ser o pilar daquele grupo de novo, a pessoa responsável e sensata que os protegeria com a vida sem pestanejar. Voltaria a ser essa pessoa, porque não conhecia outra realidade e porque era o que esperavam de si.

Depois de tudo o que acontecera naquele dia, sentira que merecia descansar a mente, forçar-se a deixar de pensar durante algum tempo. A sua cabeça doía por tudo o que fora obrigado a assimilar nas últimas horas e ele só queria poder ignorar a dor.

Jake não saberia dizer o que o levara a pegar numa garrafa de whisky escocês e refugiar-se no carro que os trouxera àquele país. Não conseguia perceber porque preferia isolar-se num carro roubado, pertencente a um homem que matara há poucos dias. Pertencente ao assassino do seu melhor amigo.

Talvez, inconscientemente, fosse mais fácil senti-lo por perto ali, a última ligação entre eles. Talvez fosse apenas porque não conseguia continuar naquela casa depois de tudo. Acabara de enterrar uma mulher que matara sem pensar para poder salvar a única que o fazia sorrir no pesadelo que era a sua vida no último mês. Ele matara Alana sem pestanejar quando sabia que podia apenas tê-la afastado de Kim sem grande esforço.

Quisera matá-la, admitia. Ainda sentia essa urgência sempre que relembrava Kim inerte sob ela, enquanto o seu rosto era macerado pelos punhos da loira desgovernada. Matara três pessoas no espaço de uma semana e tentava a todo o custo ignorar os seus sentimentos para que conseguisse manter a sua sanidade mental. Depois de tudo, o que restava da sua humanidade?

Ele sorriu sem vontade e releu o rótulo da garrafa quase vazia enquanto, na mesma onda de pensamentos difusos que iam e vinham de forma lenta, pensava que nunca estivera na Escócia. Como é que tendo vivido a sua vida inteira na Irlanda conseguira atravessar os Estados Unidos da América de norte a sul antes dos trinta anos mas nunca fora à Escócia?

Ele ainda ria quando uma das portas traseiras do carro foi aberta, terminando com o único momento só que conseguira ter em dias. Porque ninguém percebia que ele apenas queria estar sozinho?

– Hey.

Ele estava preparado para gritar com quem quer que fosse que o estivesse a importunar e então, quando ouviu a voz feminina e sentiu a sua presença ao seu lado, toda a raiva se dissipou. Nunca gritaria com ela, apesar de tudo.

– Anda tudo à tua procura, Jake. – Rachel sentou-se ao lado do amigo, que ocupava o banco traseiro quase todo, e os seus olhos desviaram-se de imediato para a garrafa que ele mantinha nas mãos. 

– Precisava de apanhar ar, só isso.

Rachel assentiu e recostou-se no assento, sentindo de imediato a diferença da temperatura em relação à da casa aquecida. As noites de meados de Setembro já pediam por agasalhos que eles não tinham, quando as únicas roupas que dispunham eram as que traziam vestidas desde o assalto na estalagem.

– Como é que estás? – A loira ousou perguntar, quando o silêncio se tornou desconfortável e ele continuou a levar a garrafa aos lábios, bebendo o seu conteúdo como se tratasse de água.

– Está tudo bem – respondeu ele, com um encolher de ombros que mostrava a disposição que tinha para conversar naquele momento. – A Kim só ficou com uns arranhões...

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