63. Humana

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❝O poder corrompe. O poder absoluto corrompe absolutamente.❞


– Creio que não fomos apresentados.

Jake ouviu a arma ser carregada atrás de si e apenas fechou os olhos quando percebeu, por um instante, que estavam em perigo. Antes que pudesse focar-se no homem desconhecido que os descobrira naquela divisão pessoal, o moreno procurou, inconscientemente, por Kim que entretanto desaparecera do outro lado da cama. Ele agradeceu profundamente pela atitude da rapariga, mesmo que tivesse sido promovida pelo medo. Kim tinha de se manter escondida pelo tempo que conseguisse enquanto Jake assumiria a única presença no apartamento para o bem e para o mal.

– Eugene, terminar – ordenou o homem de imediato até o holograma desaparecer e tudo voltar ao estado em que haviam encontrado a sala. A parede voltara a refletir o mosaico fotográfico e a rapariga projetada já não era uma assombração presente.

O homem caminhou pela divisão ampla e dirigiu-se a Jake, empunhando a arma de forma descontraída e tamborilando os dedos livres pelo cano do projétil.

– Então, em que te posso ajudar? – questionou, inexpressivo. – Vieste procurar a cura para ti? Queres uma visita guiada pelas instalações? Fartaste-te da defectus que encontraste e vieste entregá-la? É de madrugada, rapaz.

Jake notou como o lábio superior do homem se curvou com dificuldade sobre os dentes imaculadamente brancos e direitos. A sua mão, estrategicamente colocada perto da arma que trazia presa às calças, formigava de tensão e talvez adrenalina, se o seu corpo ainda a pudesse produzir, ao notar o quão perto o desconhecido estava. Decidindo fitá-lo com igual altivez Jake notou a testosterona a intensificar a densidade do ar que se respirava no local. O homem continuou a sorrir, ainda que dele não viesse nenhuma emoção decifrável, e Jake sustentou a visão até o sentido lhe falhar e ser o momento certo para reagir.

Não tão rápido quanto queria, mas da única forma que a sua condição lhe concedia naquele momento, Jake desprendeu a arma das calças e empunhou-a com vigor contra o intruso. Antes que pudesse pestanejar de novo o som cortante ressoou pela divisão. Kim encolheu-se o melhor que pôde, concentrando-se em manter o coração dentro do peito enquanto não descobria o autor do tiro; Jake debateu-se com a dor e sangue que jorrava da nova ferida na mão que empunhara a pistola. O disparo certeiro fê-lo atirar a arma para longe, antes que pudesse fazer qualquer outra coisa.

– Há algo que deves saber antes de tentares medir forças comigo – avisou o outro, mantendo o sorriso distante e composto. – Tu e os teus amigos só entraram aqui porque eu quis. Só viste esta animação e conheceste a Eugene porque eu quis. Manipular as câmaras foi de génio, mas apenas serviu para que chegasses aqui antes de qualquer um de nós.

O homem aproximou-se da mesa vítrea e manipulou os gráficos até a parede projetar o mosaico dos vídeos das câmaras de segurança de todas as divisões do edifício. Jake sabia que chegara à célula-mãe de toda a organização depois de ter visto a propaganda que não lhes era destinada, no entanto, naquele momento ele teve a certeza de estar na presença de um dos maiores impulsionares daquele projeto demente. O homem, que Jake reconhecia da foto de grupo que vira há minutos no computador, tinha acesso a todo o complexo. Provavelmente era o responsável por Kim e por todas as outras raparigas que nasciam para odiar e matar.

– Os teus amigos não se vão safar e creio que a defectus também não. – Kim, ao associar-se ao adjetivo, encolheu-se o mais que pôde debaixo da cama, temendo ser vista pelas câmaras de vigilância. – Obrigada por tê-la trazido para onde pertence. Facilitas-nos o controlo. Mesmo que ela queira brincar às escondidas continua a estar no sítio certo e o seu destino não muda.

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