Me acostumar com isso.

15.5K 970 400
                                    

Meu pai havia ido embora quando eu tinha entre treze e quatorze anos. Não houve nenhuma briga ou discussão enquanto ele fazia as malas, mas antes dele tomar essa decisão, houve uma série de palavras cuspidas que poderiam magoar qualquer um.

Minha mãe e ele viveram um verdadeiro inferno.

Ele se mudou para Flórida e eu sabia que ele tinha filhos, mas não sabia seus nomes e nem em qual série estavam no colégio. Não conhecia sua mulher e nem sua nova casa.

Tudo o que recebi do meu pai durante esses quatro anos fora dinheiro, numa poupança caso precisasse — coisa que eu não precisava.
Não recebi cartões de aniversário ou de natal. Nem mesmo e-mails.

Eu me lembro de minha mãe fingir estar bem diversas vezes enquanto seus olhos estavam vermelhos e seu peso diminuindo gradativamente, essa situação durou um bom tempo. Algumas semanas depois, eu soube que meu pai deixou o escritório que eles construíram juntos, vendendo sua parte para minha mãe.

Na época, Sinuhe e Alejandro se tornaram ainda mais próximos à nossa família, mas Camila e eu não éramos exatamente amigas.

Agora, no entanto...

— O que você veio fazer aqui? — Perguntei, tirando coragem de dentro de mim para dizer alguma coisa.

A verdade é que haviam milhares de coisas que eu queria dizer, mas nada parecia suficiente.

Ele era um estranho.

Com sua pose, e todo aquele jeito ríspido.

— Eu vim te ver, Lauren. Eu soube dos acontecimentos no seu colégio, e imaginei...

— Imaginou o quê? — Interrompi, sentindo minha voz embargar. Não chora, não seja a garotinha do papai. — Que eu precisaria de algum conselho estupido só porquê temos a mesma genitália?

Minha mãe me observava em silêncio.

— Imaginei que precisaria conversar.

Claro, porque certamente ele seria a pessoa com quem eu conversaria, né?

— Não seria com você, pai. — Cruzei os braços, forçando o choro a descer pela garganta.

— Entendo. — Ele disse, olhando para os pés. — Bom, eu estou na cidade e Roxane também, junto com seus irmãos. Se você quiser, nós podemos... Fazer alguma coisa juntos. — Sua voz parecia perdida, quase como se estivesse envergonhado. — Vamos ficar até domingo. Aqui está o cartão do hotel.

Ele depositou o cartão sob o aparador no hall de entrada e virou-se para ir embora.

— Obrigado, Clara. — Olhou para minha mãe, que apenas assentiu. — Até mais, Lauren.

Não fora exatamente um encontro pacífico. Mas eu estava bem sem ele, e minha mãe também. Seu tempo de se provar um bom pai, — ou pelo menos um pai decente — já havia passado.

— Vou tomar banho. — Fechei os olhos com força e subi as escadas.

Meu banho durou cerca de cinquenta minutos. Eu estava com raiva, confusa e talvez um pouco triste. Não porque eu sentia falta do meu pai, mas porquê ele escolheu justo esse momento para tentar me conhecer melhor, quando ele poderia ter escolhido tantos outros.

Minha formatura no ensino fundamental.

A primeira vez que ganhei um campeonato de videogame.

Ou o meu primeiro dez em matemática.

Até a vez em que estrelei Alice no País das Maravilhas no quinto ano, mesmo que eu tenha vomitado no garoto que encenava o chapeleiro maluco.

Conqueror  G!PWhere stories live. Discover now