Capítulo 3

5 1 0
                                    

Diário pessoal de bordo (fragmento).

Comandante Yumi Musashino.

Ao ouvir a voz de Aquiles ecoando pelos corredores da nave, fiquei imaginando o que se passou pelos corações de cada membro da tripulação...

A bordo de uma espaçonave da Classe Spiritus, é estranho ouvir o alerta amarelo. Soa como algo improvável... Algo que jamais deveria acontecer.

*


— Chega de conversa-mole! — exclamou o tenente Benjamim analisando as possibilidades em seu console.

Sua atitude chamou a atenção do capitão, que questionou:

— Conversa-mole? Como algo subjetivo pode ter uma propriedade de ductilidade?

Yumi não acreditou que estava presenciando um diálogo daqueles em um momento tão delicado. Mas a presença de Benjamim à ponte de comando explicava muitas coisas.

— Conversa-mole, capitão! É quando alguém fala muito e não diz nada... Ou quando fala demais e não age, não entra em ação. É algo bastante comum entre os almirantes e comodoros, se é que você me entende.

— Hum... Informação registrada, tenente.

— Aquiles — chamou Yumi, fazendo os dois retornarem à realidade. — Precisamos eliminar os Borgs.

— Certamente! Vamos atacar o cubo e depois cuidaremos do planeta. Todos aos seus postos de batalha!

A Águia Predadora girou em seu eixo central e afastou-se do Martelo de Prata, deixando um rastro azulado em seu caminho. Manobrou no espaço próximo de Horusini e rumou em direção ao gigantesco cubo da coletividade.

— Todos os canhões de proa — ordenou Aquiles. — Disparar!

Da parte frontal da seção disco, três feixes de raios riscaram o vácuo ao mesmo tempo, cada um deles com elevado poder de destruição. A frequência da onda energética variava continuamente nos canhões triplos, para que o escudo Borg não pudesse se adaptar. Além disso, cada um dos feixes vibrava com características próprias, o que permitia que ao menos dois deles atingissem o objetivo, caso a coletividade se adaptasse a um. Este sistema só existia nas naves da Classe Spiritus, e era conhecido como canhão Triplex.

Como uma pequena estrela, um clarão amarelo surgiu no casco do cubo, desintegrando boa parte de sua estrutura descontínua. Um buraco cheio de metal incandescente sobrou no ponto onde as peças retorcidas foram desintegradas.

Como resposta, o cubo disparou suas rajadas esverdeadas contra a Aquiles, mas elas foram teleportadas com certa eficiência ao ponto exato de onde partiram. Atingido com suas próprias armas, o cubo sofreu pequenas explosões em diversos pontos, e assimilou imediatamente a lição: não deveria disparar novamente contra a Aquiles.

Mas ainda longe de se dar por vencida, a coletividade fez uso de raios tratores na esperança de paralisar a nave terráquea. Como um holofote, o halo amarelo incidiu sobre ela, todavia foi teleportado difusamente pelo espaço, e a Aquiles deu uma guinada para cima, fazendo uma curva aberta para ganhar distância.

Ao retornar, estava mais uma vez de frente para o inimigo.

— Vamos terminar o serviço com alguns torpedos! — disse o capitão, ele mesmo efetuando os disparos.

Dois projéteis correram como estrelas cadentes, prontos para penetrar o cubo no ponto onde o canhão Triplex havia feito um rombo do tamanho de uma Ave de Rapina.

No entanto, para o espanto de Benjamim e Yumi, ambos foram interceptados pela USS Ulisses, que surgiu diante deles com muita agilidade, usando o próprio escudo intransponível para desviar-lhes o caminho. Foi assim que os torpedos desapareceram ao tocar o ETR, e foram rematerializados em sentido oposto, perdendo-se no espaço.

— O capitão Nemo vai proteger a coletividade! — concluiu Aquiles manobrando novamente para se afastar do cubo.

Levou a Águia Predadora até a face oposta do cubo e disparou outra rajada com o canhão Triplex. Ela foi interceptada a tempo pela Ulisses, que se colocou mais uma vez com grande agilidade entre o disparo e a nave Borg.

Aquiles podia ser rápido, mas não ignorava que Nemo também era, por ser androide e estar igualmente conectado em simbiose positrônica com o computador central de sua nave.

— Não será fácil — comentou Aquiles. — Nemo é tão ágil quanto eu. Podemos ficar horas nesta batalha infrutífera.

— Em breve — lembrou Yumi —, outras naves da Frota estarão aqui para nos auxiliar.

— Isto pode ser muito ruim — explicou o capitão. — Enfrentar um cubo Borg e a Ulisses ao mesmo tempo pode levar muitas naves à ruína.

— Não pode ser! — falou Benjamim. — Nemo, sendo androide, jamais atacaria uma nave sabendo que seres humanos podem morrer!

— Mas ele pode proteger a coletividade e inutilizar as naves ao mesmo tempo, sem destruí-las. Não nos esqueçamos de que seu objetivo é levar as pessoas à assimilação. E um capitão androide, no comando de uma Spiritus, pode facilmente destruir os sistemas de defesa e ataque de uma nave comum, sem causar mortes, tornando-a vulnerável à penetração de Borgs carregando sondas de assimilação.

— Teríamos uma frota inteira comandada por Borgs em Horusini! — concluiu Yumi, assustada.

— Então — o tenente sentenciou —, precisamos resolver a situação antes que nossos companheiros caiam nessa armadilha.

— Aquiles — chamou Yumi —, o capitão Nemo está tentando se comunicar de novo!

— Ignore o chamado! Vamos fazer mais investidas contra o cubo.

Com uma curva fechada, a Águia Predadora voltou ao campo de batalha, procurando escapar da Ulisses. Mas o cubo não era uma ramificação inerte da coletividade. Desviou da rajada tripla de raios para deixar a outra nave terráquea em posição de defesa.

Aquiles tentou os canhões de ré tão logo passou de ambas, porém as duas dançavam no espaço, deixando a USS Ulisses sempre na frente do ataque. Os raios ou torpedos que conseguiam driblar esses movimentos eram insuficientes para causar danos sérios no cubo, que podia se regenerar.

— Eles aprenderam a se tornar imunes aos nossos ataques! — concluiu o androide, quase considerando desperdício de recursos continuar com aquele jogo.

Foi nesse instante que a primeira-oficial Yumi viu em seu console o que considerou o evento mais bizarro desde então: o cubo tentava se comunicar com a Aquiles.

Ela ergueu os olhos para seu capitão e viu que ele já estava ciente daquilo, pois desacelerava a nave e abria o canal de comunicação.

— A coletividade está querendo conversar — ela cochichou com Benjamim, que não entendeu, em princípio.

O monitor da ponte foi preenchido pela imagem de uma criatura Borg, visivelmente humanoide, apesar dos implantes e do olhar vago. Sua pele, pálida e brilhante, dava a impressão de alguém que viveu muito tempo imerso em água. Onde deveria haver cabelos, uma estrutura de conduítes estava fisgada, desde a testa até escorrer para trás, como uma cabeleira de cabos e fios.

Sua voz era mansa, porém incisiva, e não tinha o tom mecânico de que outros Borgs faziam uso para se comunicar. Encarando Aquiles como uma cobra que prepara o bote, ele disse:

— Eu sou Loquaz, da coletividade Borg... CapitãoAquiles, por que nos ataca, nós que somos humanos e temos, como os outros, odesejo de viver?... Nós somos um aperfeiçoamento da vida. Resistir a isto éinútil.

STAR TREK: SÉRIE SPIRITUS - Ep. 3 - Choque de TitãsKde žijí příběhy. Začni objevovat