✥ㅡ CINZAS DAS CHAMAS ㅡ✥

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Na formação do Reino Lunar, ano 201

O cheiro de sangue e carne pútrida me faz torcer o nariz, e franzir a testa logo em seguida quando dor percorre meu rosto inteiro com o movimento.

Mas nada se compara com a dor desta visão.

O resultado que a Guerra nos deixou não é nem um pouco agradável. Corpos e mais corpos despencados no chão - ou partes de corpos - preenchem cada centímetro do gramado que antes era puro verde mas que agora brilha em um ígneo vermelho. Sangue inimigo misturado com sangue aliado. Sangue dos meus companheiros. Sangue que eles quiseram derramar para me proteger; um príncipe que nunca foi merecedor de tudo isso e que teria sim oferecido sua vida em troca das que foram perdidas nesse campo de batalha.

Mancando fortemente em direção à maior concentração de corpos empilhados ㅡ onde a briga havia sido feia ㅡ, procuro por algum rosto conhecido ou sobreviventes. E também pela rainha, que decidiu não ficar apenas esperando na tenda e resolveu se vestir igualmente aos demais homens e se juntou à guerra. Ela não usou nada que pudesse diferenciá-la dos outros homens; uma jogada para que ninguém a impedisse quando saiu escondida de onde era designada a ficar, em um dos barracões bem longe e perto da rota de fuga para qualquer emergência. Uma estratégia também para que ninguém a encontrasse caso pensássemos no pior que poderia ter lhe acontecido.

Ela tem que estar viva. Ela tem que estar viva. Tem que estar.

Em completo transe e passando por poças e poças de sangue, olho para cima e encontro o céu azul me encarando de volta. Como pode estar assim e não nublado, principalmente em um dia como esse? Como pode o sol brilhar tanto hoje enquanto nós estamos completamente submersos nas trevas?

O último raio de sol da manhã anterior havia sumido atrás das grandes colinas ao nosso redor, dando-os visão privilegiada da guerra que acontecia. Após isso, não vimos mais seu brilho. As nuvens escuras lotaram o céu e desde então fomos castigados pela chuva, que aumentou a quantidade de lama em nosso campo de batalha e assim fez com que muitos dos nossos soldados morressem.

O cheiro da carne em decomposição é minha única certeza de que ainda estou vivo e que estivemos bem perto da derrota. Tão perto que ainda não acredito totalmente que vencemos. Tão perto que eu posso ver em minha cabeça vários flashbacks dos tempos antigos quando eu era apenas um garoto já no campo de batalha só esperando que um dos inimigos viesse por trás e me desse um golpe certeiro para me derrubar.

O brilho das espadas ao meu redor são como um soco no estômago, uma memória aterrorizante que me perseguirá até o fim dos meus dias. A batalha chegou a um ponto tão difícil que eu mal me lembro de sequer levantar o braço para atacar. A exaustão, cansaço e miséria foi o suficiente para que eu passasse a lutar totalmente no automático, não me preocupando mais sobre o que era realidade ou a imagem que minha cabeça projetava pelos dias sem dormir.

Tanto sangue. Tanta dor. Por favor, permita que ela esteja viva.

Eu não sabia com quem estava falando; meus lábios se moviam, mas eu não ouvia nada saindo. Minhas mãos tremem, mas ainda assim não há nada que elas busquem.

Uma lágrima escorre por meu rosto quando olho ao redor, a sombra vermelha marcando o chão como ferro quente na pele de animais, cicatrizando para sempre meu coração. Minhas pernas tremem pelo esforço, mas continuo me forçando a continuar caminhando e olhando para cada um que lutou ao meu lado, inclinando a cabeça em reverência para eles. Mortos. Por minha causa.

A ƑILHA ƊO ƑOƓO - A MALƊIƇ̧ÃO ƊO SOLSƬÍƇIOWo Geschichten leben. Entdecke jetzt