Nunca jogue "Eu Nunca"

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O dia da apresentação tinha chegado. Em especial naquela noite em que eu mais precisava dormir, Arthur chorou bastante. Mas eu não reclamei e nem me importei tanto. Eles estavam ali porque eu queria e eu sabia como seria. Mas cada vez que eu acordava, meu coração acelerava por lembrar da apresentação no dia seguinte. 

Nico ficou comigo do lado de fora o tempo inteiro antes da minha apresentação, e me levou até um chocolate pra me desejar sorte. Ramón também estava lá dando apoio, em especial pra Bruna. Felipe e Gabriel já eram efetivados, então puderam permanecer no anfiteatro durante a apresentação. Marco e Bruna esperavam a vez deles junto a mim. 

A primeira de nós a apresentar foi a Bruna. Saiu de lá sem fôlego, achando que tinha se atropelado toda, mas recebeu vários elogios, inclusive de outros setores. Marco seria um dos últimos, então eu e Bruna conseguiríamos assistir a apresentação dele. 

Tinha chegado minha hora. Meu estômago estava dando reviradas, meu coração aceleradíssimo, minhas mãos suavam de uma forma que eu podia sentir o microfone deslizar nela. Era uma ideia ousada que podia encontrar vários pensamentos conservadores, embora a empresa fosse bem jovem. Mas eu estava pronto. E fui. Minha apresentação contou com um vídeo que trouxe o impacto que eu desejava. Em geral, as pessoas pareciam muito conectadas com as ideias que eu apresentava e isso era bom. Recebi diversas perguntas e muitas delas eram precedidas de "é, realmente é algo bem ousado"... Mas eu consegui responder todas. 

Para divulgar o resultado, ficamos todos no palco do anfiteatro. Um vídeo foi exibido no telão, ao som daquela música de os Piratas do Caribe, com fotos de toda nossa trajetória no programa trainee. Todos nossos pontos foram contabilizados ao longo daqueles meses e, junto com o resultado da apresentação, foi formado um ranking, elegendo os cinco melhores trainees. Marco e Bruna ficaram em terceiro e quarto lugares, respectivamente. Eu, ainda que não conseguisse acreditar, tinha sido o primeiro lugar!

Bruna e Marco me abraçaram e eu ainda não conseguia reagir. Não era só pelo prêmio de 50 mil ou pela viagem. Era o prestígio de ver minha luta pelo projeto se tornar realidade. A empresa usaria minha ideia e isso me fazia a pessoa mais feliz do mundo naquele momento, porque milhares de LGBTs seriam beneficiados. 

Na noite do sábado, reservei o espaço de festas do prédio onde eu morava, que ficava na cobertura. A ideia inicial era sair e procurar algum rolê diferente. Mas achei que seria bacana alguma coisa por ali, assim o Hugo poderia participar e continuar cuidando do Arthur. 

A melhor parte é que o salão era todo isolado. Então a música não atrapalharia nenhum morador, e a gente atravessou a madrugada dançando até cansar. Mas quando cansamos, a ideia lançada na roda foi jogar "Eu Nunca". Alguém diz algo que nunca fez e aqueles na roda que tiverem feito, devem beber. O jogo mais perigoso pra um grupo de gente bêbada, principalmente porque o trato era não mentir de forma alguma. 

— Eu nunca beijei alguém do mesmo sexo... — Ramón começou o jogo. 

Todos beberam, tirando ele mesmo. Ok, naquele momento a gente tinha a confirmação que Iury não era exatamente hétero. Não quis fazer alarde, mas a Bruna, o Felipe e o Marco não perderam a oportunidade. Iury ficou vermelho.

— Vai falar que nunca desconfiaram? — Ele disse. 

— Eu e o Rafa desconfiamos no dia que a gente te conheceu. — Nico disse, rindo. 

— A próxima é a Bruna...š Alguém mudou de assunto.

— Eu nunca fiz sexo a três. — Ela fez uma pequena pausa e complementou, me olhando. — Ou mais que três. 

Naquela rodada, só não beberam a Bruna, o Ramón e o Hugo. Uma rodada inteira passou até chegar em Ramón novamente. 

— Eu nunca me apaixonei por alguém nessa roda que não fosse a Bruna.  

Amor de Areia (Romance LGBT)Where stories live. Discover now