A carta

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Deixo o carro estacionado no passeio e entro em casa já tirando o casaco e o pendurando.

- Amor? – ouço minha esposa.

- O que foi?

- Uma prima sua veio aqui em casa, ela queria falar com você.

- Prima?

- PAI – minha filha corre até mim quando deixo a pasta em cima da mesa. A pego no colo e giro.

- E minha prima falou o que queria? – era tão estranho.

- Achei que só tivesse primo homem – ela me olha arqueando a sobrancelha.

- Eu não sei quem poderia ser. Tinha alguma característica marcante?

- Ela era bem bonita e elegante, papai – minha filha fica no meu colo e procura por meu celular na pasta.

- Era sua secretária? – ela pergunta desconfiada.

- Eu nunca faria isso com você – digo indo até ela e abraçando-a por trás – Eu vou tomar banho e já desço para te ajudar.

Subo para o quarto. Tiro a camisa e a calça e vou até o banheiro, mas na mesinha de cabeceira tem um envelope que chama minha atenção. É uma carta.

Querido,

Há tanto tempo sem nos vermos e finalmente te encontrei. Mas, agora, está comprometido e tem sua própria família, e eu, de besta esperando o dia em que seus braços me envolveriam e sua boca pronunciaria a palavra 'perdão', eu o teria perdoado ainda hoje, mesmo sem merecer nada que venha de mim.

Preciso te dizer que sinto falta dos nossos beijos avassaladores, das suas mãos habilidosas escorregando pelas minhas antigas curvas, das quais o tempo fez questão de deformá-las. Adorava a minha boceta pulsante no seu pau feroz, numa selvageria apenas nossa. Segredo de quatro paredes. Me perdia nos seus dedos carinhosamente vagando pelos meus cabelos, num lento aconchego, num descanso extasiado no seu peito ao som descompassado do teu coração.

Porém creio que nunca deve ter sido dominado por outros lábios novamente, principalmente pela boceta fedida da tua esposa, e não lamento, esse é o preço que você paga por me abandonar naquela estação de trem com a esperança de fugirmos. Não se preocupe também pago o meu, que por azar tem juros.

Você sabia da minha situação. Você disse que me amava, disse que cuidaria de nós, mas cá estamos longe de você, na vida miserável de uma amante das ruas, sonhadora de lar.

Mas eu sinto falta dos nossos momentos. Sinto falta de nós. Sinto falta de mim, poderosa e imponente ao seu lado sem nunca abaixar a cabeça. Sem nunca receber um não. E hoje é o que mais ouço.

Procuro em cada homem que me fode, o fogo da nossa paixão, mas vê você do outro lado do muro com sorrisos e flores de maneira que nunca senti ou vi, me quebra mais do estou quebrada. Nossa paixão virou cinzas que o vento levou e espalhou. Nem ao menos sabe meu nome, já esqueceu nossa história. Quer saber?

Vai se foder,

Sua ex.

Ouço a porta se abrir e minha mulher entrar, coloco a carta rapidamente atrás de mim.

- Que papel é esse?

1869Where stories live. Discover now