Sobre tudo, sobretudo.

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Quatro pessoas acompanharam com olhos preocupados a trajetória da sofrida Sorte, e apesar de todos calmamente convergirem para segui-la, apenas a pessoa que estava mais próxima da saída por onde a jovem passou pôde ir atrás dela imediatamente. Os demais ficaram presos em tratos sociais com indivíduos que se aproximavam para comentar acerca do ocorrido e lamentar com falsos pesares.

Sorte seguiu por um corredor com piso de madeira que emitia som característico a cada passada pesada. A mulher avistou uma escrava pelo caminho, que a olhava com surpresa. Ao lado da mulher, que tinha em mãos uma cesta com tecidos sujos, havia uma porta dupla.

— Que cômodo é este? — Sorte perguntou com voz chorosa enquanto apontava para as portas.

- É a sala de chá de Sua Alteza, Vossa Graça. - A mulher respondeu.

- Me chame de Sorte. - Pediu aos soluços enquanto pousava a mão sobre uma maçaneta dourada. - Está destrancada?

- Sim, sinhazinha Sorte. - A mulher franziu o cenho sem entender o que ocorria.

- Só "Sorte". - Pediu antes de entrar no cômodo e fechar a porta atrás de si.

Finalmente só, abriu o berreiro.

Andou até um sofá, onde se sentou. Apenas as cortinas luxuosas, o tapete, os móveis e algumas bebidas em um canto se faziam testemunha de sua tristeza.

Sorte ouviu vozes no corredor, mas foram breves e ela não entendeu o que diziam. Depois que se calaram o silêncio reinou enquanto a jovem chorava até se cansar do lamento. Quando por fim as lágrimas secaram, Sorte se levantou e a passos lentos alcançou uma garrafa de cachaça que estava em um aparador no canto da sala. Serviu um copinho e tomou um gole da bebida. Não era apropriada para damas, mas era o que ela tinha em mãos. Tinha costume já que bebia em casa, e apenas em casa. Nunca se arriscaria a ficar ébria em um ambiente estranho.

- Fica melhor quando você chupa limão após beber. - Uma voz conhecida veio da direção da porta e Sorte se virou em um sobressalto.

Congelou com a segunda dose de cachaça a caminho da boca, e calada, observou enquanto o homem forte vestido em preto e branco entrava no cômodo. Ele abriu um sorriso e fechou a porta atrás de si.

- Vossa Graça... - Sorte, embaraçada, não sabia o que dizer ou como agir, por isso depositou o copo ainda cheio sobre o aparador e cruzou as mãos frente ao corpo.

- Pode me chamar de Azarado. - Disse movimentando a mão em um gesto descontraído, como quem dispensa um assunto. - Como se sente senhorita Olivares?

- Me chame de Sorte. - Ela pediu, tentando não parecer impertinente. - Me sinto bem, obrigada senhor.

Mentiu, pois as regras sociais ditavam que não devia incomodar um marquês com suas preocupações mundanas. Se bem que ele já a vira beber, então nada mais seria tão escandaloso. Exceto se despisse o corpo.

- Não precisa mentir para mim, Sorte. - Ele falou enquanto se sentava em um dos sofás luxuosos. Mesmo se movimentando, não tirou os olhos de sobre ela. - Penso que deves trazer essa garrafa e o copo até aqui. Tens tempo de conversar com um recém chegado?

O homem falou como se Sorte tivesse um leque de outras opções e ela gostou, mesmo sabendo que só tinha uma escolha alternativa, a de partir. Para tal, precisaria passar novamente pelo salão, e ainda não reunira coragem suficiente para seguir por tal caminho. Por isso ela pegou a garrafa e o copo cheio e se dirigiu ao sofá. Sentou-se no lado oposto ao de Azarado, restando dois lugares vazios entre ela e o homem.

- Sinto-me atropelada por uma manada. - Confessou e em seguida bebeu o gole de cachaça que estava no copo. A bebida desceu queimando, mas ela não fez careta. - Humilhação é a palavra que define meu estado.
Colocou o copo sobre o sofá e Azarado o pegou. Serviu no recipiente um pouco de líquido amarelo e entornou.

Sorte e o Marquês (Donas do Império - Livro 1) [CONCLUÍDO]Where stories live. Discover now