Capítulo Sete

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Segunda-feira...

Adriana nem precisava se olhar no espelho para perceber que seus lábios ainda estavam inchados, mas a realidade no espelho era ainda mais cruel. Parte do rosto parecia mais inchada que no dia anterior.

Não poderia trabalhar daquele jeito, mas não tinha como escapar da faculdade. Tinha um trabalho valendo nota e não podia faltar. O que iria dizer às pessoas?

Muito pior do que o próprio sofrimento era ter de enfrentar os olhares perscrutadores das pessoas, ter de inventar mentiras.

Mas não era a primeira vez que aquilo acontecia, que recebia socos ou tapas de Roberto, embora tivesse de admitir que os golpes estavam cada vez mais violentos e frequentes. Depois, ele pedia desculpas. Sempre pedia desculpas e prometia que ia mudar. Só que tornava a fazer a mesma coisa.

Não, corrigiu-se Adriana rapidamente, ele não tornava a fazer a mesma coisa. Roberto estava cada vez mais descontrolado, e ela cada vez mais sucumbida ao medo, ao desespero.

Ainda estava pensando nisso quando desceu para a cozinha e preparou o café da manhã. Roberto desceu em seguida, mas ela sequer olhou em sua direção. O desprezo, puro e completo era a única coisa que ele receberia daquele dia em diante, ela prometeu a si mesma. Em seguida, foi ao quarto da filha para acordá-la e aguardou ali, sentada na beirada da cama, que a menina terminasse seu banho.

De uma maneira estranha, Letícia permaneceu tão quieta quanto a mãe, enquanto ela vestia sua roupa de escola. Mas, abruptamente, a menina agarrou-se em seu pescoço e a abraçou forte.

−  O que foi, querida? – sibilou Adriana entre os dentes. Ela mal podia falar.

−  Eu amo você, mamãe. – Foi tudo o que a menina disse. – Amo muito você.

Em outro momento, Adriana perceberia a aflição que a filha a apertava, a tristeza em sua voz. Naquele momento, porém, Adriana só conseguia sentir a própria angústia, a própria dor.

Quando enfim se encontrou sozinha em casa, pegou o telefone e ligou para o gerente da empresa onde trabalhava, alegou que caíra da escada. Foi a única coisa que veio à sua cabeça e a mesma mentira que inventou à filha. Depois, deixou-se cair na cama e chorou, pela própria incapacidade de reação.

Daniel procurou a prima durante a aula, mas não a encontrou. Mesmo assim, no encerramento da última aula, como sempre fazia, aguardou por ela em frente à sua sala.

−  Professor, – chamou-o Luiz, um aluno alto e moreno que todos os professores conheciam muito bem, pois, desde o início das aulas, destacara-se como um dos mais engraçadinhos da turma – está aguardando a Adriana?

−  Sim. Ela não veio hoje?

−  Só na terceira aula.

Daniel procurou não demonstrar qualquer apreensão.

−  E já foi embora?

−  Já.

−  OK. Obrigado – agradeceu Daniel, virando-se em seguida para sair.

−  Professor...

O rapaz parecia querer falar mais alguma coisa, Daniel voltou-se outra vez para ele.

−  Pois não.

−  Podemos conversar?

Tudo o que Daniel queria era voltar para casa. Estava cansado e com sono, pois mal conseguira dormir durante o final de semana.

...Where stories live. Discover now