Capítulo Quatro

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Oscilando entre o ódio e a amargura pela própria inércia, Adriana atirava cabides sobre a cama, enquanto procurava uma blusa que pudesse esconder as manchas arroxeadas estampadas em seus braços e em seu pescoço. Em pleno verão, seria obrigada a usar uma blusa de mangas compridas e gola alta para esconder as marcas de um amor doente, pensou ela, sem perceber que Roberto já havia acordado e estava observando-a.

−  O que está acontecendo? – perguntou ele, algum tempo depois.

Adriana virou-se. E seus olhos estavam cheios de mágoa, de raiva, que Roberto fingiu não perceber.

−  Olha só o que você me fez! – e apontou para a mancha escura em seu pescoço. – Como posso trabalhar assim?

−  Não precisa trabalhar se não quiser – disse ele, sem qualquer sentimento de constrangimento ou culpa. – Posso falar para o Mário que você não está se sentindo bem hoje.

Ela sentiu a raiva crescer, ao perceber que era exatamente isso o que ele queria.

−  Faz isso de propósito, não é? Faz isso porque quer que eu desista de trabalhar. Não é isso, Beto?

Ele deu de ombros.

−  Não tenho culpa se sua pele marca por qualquer coisa.

Adriana chegara ao limite de sua paciência. Durante todos aqueles anos de casamento, fizera de tudo para viver bem com o marido, já que sempre acreditara que o matrimônio era algo sagrado e para a vida toda. Reconhecia agora que havia cometido um grande erro ao permitir que Roberto tomasse o controle de sua vida, antes mesmo de se casarem.

Ela pediu demissão na empresa onde trabalhava como secretária assim que oficializaram o noivado, porque Roberto insistira que ela deveria cuidar da papelada do casamento e da decoração do apartamento que eles iam morar, visto que ele não tinha tempo de fazê-lo.

Na verdade, ele sentia um ciúme enorme dela com o ex-patrão, mas Adriana estava apaixonada demais para enxergar isso. Além do mais, no fundo, ela sabia que Roberto tinha alguma razão para se sentir inseguro.

Afinal, embora seu ex-patrão fosse quase cinquentão, era um homem extremamente charmoso, educado, e adorava desfilar com mulheres jovens. Ele se insinuara para ela muitas vezes, convidando-a para jantar, mas obviamente Adriana recusara a todos os seus convites. Ela queria casar, constituir uma família. E quando encontrou alguém que verdadeiramente a amava, que era louco por ela, não teve qualquer dúvida que seus sonhos se realizariam.

No entanto, bastou apenas que ela manifestasse seu desejo de voltar a trabalhar fora, quase dois anos depois do nascimento de Letícia, para que o homem que um dia prometera amá-la e respeitá-la aos pés de uma cruz mostrasse sua verdadeira face. Roberto passou a dar palpites sobre o que ela deveria vestir, quando saía para procurar emprego, além de monitorar seus passos.

Em princípio, ela preferiu acreditar que o marido fazia aquilo apenas por excesso de zelo. Como Roberto sempre dizia, havia violência demais nas ruas, e isso servia para justificar todos os exageros, inclusive para que ele ligasse quase o dia inteiro para o seu celular, para saber onde ela estava, com quem estava e para onde ia depois. E quando Roberto conseguira uma vaga para ela na empresa onde trabalhava, novamente Adriana não quisera admitir a hipótese de que aquela era a única forma que ele havia encontrado de continuar com o controle de sua vida.

Com o passar do tempo, ela encontrara justificativas até mesmo para as violentas manifestações de ciúme que o marido apresentava de vez em quando, inclusive as agressões físicas que sofria. Mais uma vez, ela quisera acreditar que Roberto só tinha todo aquele ciúme porque a amava demais, porque tinha medo de perdê-la. Ele lhe dizia isso com frequência suficiente para fazê-la acreditar. Além disso, após os insultos e agressões, Roberto sempre suplicava seu perdão e se tornava magnificamente terno, jurava por Deus que nunca mais faria aquilo de novo e a enchia de presentes e mimos.

...Where stories live. Discover now