Capítulo 55

225 18 8
                                    

Numa vingança motivada há mais de trezentos anos, era de se esperar que ela acabasse através do sangue que a desencadeara..

Vida

Do alto da colina eu via os carros se encaminhando para o castelo. Uma caravana de trailers ciganos era algo impressionante de se ver com todo o nosso colorido. Mas, de onde estávamos, éramos invisíveis para quem andava na estrada. O que era bom, já que Hamish não podia imaginar que nós, e eu em particular, estávamos ali.
Ian, garboso em suas roupas ciganas se aproximou de mim.
_ Então esse é o castelo do seu pai...
Virei-me para Ian.
_ E de muitos antes dele, Ian. Algo de séculos de existência.
_ Por Santa Sarah, é muito grande. Mas não é tão grande quanto o mundo. Você é cigana, Vida. Conseguirá viver entre essas paredes?
Eu tornei a olhar para o castelo.
_ Em poucos dias, ele se tornou meu lar, Ian. Tanto quanto o haŕas.
Ian permaneceu em silêncio por alguns minutos. Tudo que se ouvia na campina era o som do vento gelado que vinha do Norte.
_ Ventania sentirá sua falta. - claro que ele não falava apenas da sua égua de estimação.
Eu o abracei com a familiaridade de irmãos.
_ E eu sentirei saudades também. - E eu não falava apenas da égua.
_ Então é a hora da Condessa Cigana tomar o seu lugar na história daquele castelo, prima.
_ Sim. É a hora da Condessa Cigana retomar o seu lugar. - disse lembrando-me da Condessa Katrina.

Destino

Todos estavam reunidos no grande salão. Minha ansiedade crescia a medida em que os ponteiros do relógio corriam e sabia que, ao meu lado, minha mãe sentia o mesmo.
Além dela, outra pessoa estava ansiosa. Mas não pelos acontecimentos que se deserolariam em pouco tempo, mas pelo fim deles. Assim que eu, minha mãe e Mac chegamos a Craigmoor, Seamus veio me procurar. Ele mal pode conter a agitação.
-"E então Alexander? Vocês resolveram atender ao meu chamado e vieram para a cerimônia?"
"Estamos aqui não estamos? " - disse minha mãe de má vontade, representando seu papel.
"Vamos ate o  escritório, quero falar com você sobre algumas novidades que eu ouvi em Londres." - eu disse a Seamus.
"Espero que não demore. Sabe que eu não gosto de atrasos. Principalmente quando eu sou o dono da festa."
Eu tinha que admitir que Seamus sabia mesmo reapresentar.  Se eu não soubesse de nada, estaria irado com a arrogância que ele expressava.
Mas uma vez longe dos olhares, ele se voltou para mim; a súplica em seu olhar.
"E  então ?"
Fiz um sinal para ele para irmos até a sacada.
"Ele está bem, Seamus. Está debilitado, machucado, mas já foi levado para uma clínica particular onde não farão perguntas. Uma equipe de bons médicos e enfermeiras está cuidando dele."
Seus olhos azuis brilharam com lágrimas contidas.  Há alguns anos, um homem que chorasse na minha frente eu tachariade fraco. Mas Seamus tinha força dentro de si. Enfrentar o suplício do seu companheiro para viver uma mentira não devia ser algo fácil.
" Eu nunca poderei lhe agradecer o que fizera. Mas e quanto a ele?"
Eu sabia a quem ele se referia.
"Por mais algumas horas, ou nem isso, Seamus. Ele será  desmascarado. Eu lhe prometo."
E agora estávamos ali. Seamus já havia sido investido com o título de conde de Kingcraig e estava recebendo as declarações de fidelidade dos outros membros do clã,  quando Duncan veio correndo.
_ Milorde, uma caravana sobe pela estrada. - avisou Duncan. - No primeiro trailer tremula a bandeira cigana.
Hamish adiantou-se.
_ Mande fechar os portões, Seamus! Eles não devem entrar no castelo.
Seamus ficou pensativo por alguns minutos.
_ Milorde? - Duncan estava esperando.
_ Deixem eles entrarem. Vida Ivanovitch era a herdeira do clã, mas também era uma deles. Eles têm o direito de pranteá-la. Vá recebê-los, Duncan e traga-os ate aqui.
Duncan correu para a entrada do castelo e Hamish olhou para o seu sobrinho e seu olhar era de ódio puro, por ele ter desobedecido suas ordens. Vi ele pegar o celular e discar um número. Ele falou por alguns instantes e tive a satisfação de vê-lo empalidecer. Provavelmente estavam lhe dando a notícia do resgate de Andréas. Ele olhou para mim e eu lhe sorri de volta.
Nesse momento uma senhora, de cabelos negros e prateados presos no alto da cabeça e com muitas joias, entrava pela porta de braço dado com um homem que eu sabia ser o primo de Vida. E sua avó, ou Baba como ela a chamava. Meu coração bateu forte por saber que minha amada estava próxima.
Após um rápido cumprimento o homem se adiantou. Seamus se levantou para recebê-lo.
_ Eu sou Ian Ivanovitch, líder do clã cigano Ivanovitch e viemos para honrar nossa parente Vida Ivanovitch que sabemos faz parte de sua família e que deveria estar aqui nesse momento.
_ Embora não fisicamente, a presença de Vida será sempre sentida por nós, os Kingcraig. Sua presença honra-nos e conforta, senhor Ivanovitch. - declarou Seamus.
Ian cumprimentou-o e uma cadeira bordada foi trazida. Ela parecia um trono e a senhora sentou-se nela. Ian se posicionou ao lado dela e um grupo de músicos aproximou-se. Começaram a dedilhar uma música triste ao violão.
Um grupo de dançarinos entrou e começaram a se apresentar. Eles formaram um círculo e, sozinhos ou em dupla, eles adentravam o círculo e dançavam conforme os seus costumes.
Havia dançarinos romenos e espanhóis. Cada um expondo seu sentimento nos pés, nos giros e nas mãos que batiam na cadência de seus próprios corações.
De repente, um novo grupo de dançarinos apareceu pelos portões, adentrando ao salão. Todos homens, com suas roupas pretas e lenços na cabeça. A mesma cor rubra repetia-se no lenço que lhes rodeava a cintura, servindo para prender os punhais de prata que reluziam à luz das luminárias.
Uma dançarina de rosto velado seguia no meio deles. À sua entrada, os dançarinos recuaram como se ela fosse uma rainha. Ela se posicionou e começou a dançar.
Nesse momento, minha mãe ficou ao meu lado e segurou minha mão. Eu não tirava os olhos de Hamish e ele não tirava os olhos dos dançarinos. Seu olhar era de puro ódio e, tenho a certeza, que se ele pudesse e tivesse uma metralhadora à mão, ele teria matado todos eles.
Alguma coisa na postura da dançarina, fez com que ele descesse do tablado onde estava ao lado do sobrinho e fosse na direção dos dançarinos. Soltei a mão de minha mãe e me movi também na mesma direção.
Sem aviso, ele sacou uma arma e pegou a dançarina pelo braço. Ela arrancou o véu com a outra mão e olhou para Hamish com raiva. Eu saquei a minha arma na mesma hora.
_ Você tem sete vidas, vadia? - ele esbravejou com ela.
_ Eu teria oito se for para frustrar seus planos, MacDougal! – Vida respondeu no mesmo tom.
Ele a colocou de costas para ele como um escudo e apontou a arma em sua têmpora.
_ Não se aproxime, Burton! - ele gritou ao me ver apontar a arma na sua direção.
_ Pare, Hamish. Acabou. - disse Seamus se levantando. - Seus planos deram errado desde o ínicio, meu tio.
_ Não me chame assim, seu bichinha! - ele gritou – Você sempre foi um covarde. Desonrou o nome MacDougal. Um nome de tradição milenar.
_ Você desonrou esse nome, Hamish. Em busca de sua vingança vazia. - Seamus retrucou.
_ Eu tinha uma missão! Fazer um MacDougal dono de Craigmoor. Expulsar para sempre os Kingcraig da face da terra. Fazê-los pagar por sua traição.
_ Traição?! - minha mãe se adiantou. Eu procurei deixá-la atrás de mim, pois Hamish era imprevisível e podia querer atirar nela. - Desde o início, foram os MacDougals que nos traíram. Inspirados por ciúme e inveja.
_ Largue a arma, Hamish! Agora! - eu me aproximei mais dele.
Quando ele engatilhou a arma, duas coisas aconteceram. No mais antigo truque feminino que existia, Vida pisou no pé dele usando o salto quadrado do seu sapato. Com a dor, Hamish se curvou e a soltou. Com um giro de bailado, Vida se afastou dele e uma lâmina brilhou pelo salão ao mesmo tempo em que eu atirava.
Ferido duas vezes, Hamish caiu no meio do salão de pedra. Corri ainda com a arma em punho e me abaixei perto do corpo. Meu tiro o tinha atingido no ombro direito, mas a lâmina o atingira direto no coração. Ela era trabalhada com pequenas flores com rubis, parecendo muito com um outro punhalzinho que eu já tinha visto. Então, olhei na direção que a lâmina partira e vi de pé, a idosa senhora com seus cabelos negros entremeados com fios brancos soltos pelos ombros, amparada pelo primo de Vida, Ian.
Numa vingança motivada há mais de trezentos anos, era de se esperar que ela acabasse através do sangue que a desencadeara..

A Condessa CiganaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora