36. Uma noite de sexta-feira

24 6 2
                                    

Júlia trabalhou normalmente naquela sexta-feira sem levantar qualquer suspeita de que aquele era seu último dia. Iria para casa no final do dia, arrumaria suas coisas e sumiria do mapa. Pensou em inventar uma desculpa no trabalho, talvez acreditassem, mas ela sabia que não voltaria a trabalhar lá, era inútil dizer qualquer coisa. Ela sabia que as únicas pessoas que poderiam ir atrás dela na loja era Miguel ou Lara e que pouco se importaria com que eles lhe dissessem, afinal os dois já sabiam que ela era uma assassina. Já no prédio Júlia queria dizer alguma coisa, sua tia de vez em quando aparecia por lá e ela gostava de sua tia, bem, do jeito que sabia gostar. Uma oportunidade de trabalho na Tiffany de Nova Iorque parecia uma oferta difícil de se recusar e era isso que pretendia dizer no sábado de manhã ao porteiro quando saísse com suas malas e ao telefonar para sua tia.

Júlia chegou em casa e teve uma surpresa boa quando viu sua tia sentada na poltrona.

-Tia Débora, que visita maravilhosa! -disse correndo em sua direção para abraçá-la.

Débora Marcondes deixou ser abraçada sem muito entusiasmo.

-O que houve, titia? -perguntou Júlia carinhosamente, bancando a sobrinha perfeita.

-Nada...Eu só fico triste quando penso na Amelinha.

Júlia olhou para as malas que já estavam prontas na sala e pensou que sua tia estivesse chateada porque ela não avisou nada a respeito, por isso foi logo dizendo:

-Não fique triste, tia. Temos uma ótima notícia para comemorar! Recebi uma proposta de trabalho irrecusável. Amanhã viajo para Nova Iorque para ser gerente da loja mais badalada da Tiffany. Eu tentei falar com você, mas não consegui.

-Que notícia maravilhosa! -disse Débora esforçando-se em sua atuação.

- Vamos abrir uma champagne. E não fique com essa carinha triste que eu virei sempre visitá-la!

Júlia pegou uma garrafa de Veuve Clicquot, estourou e encheu as duas taças. Serviu uma taça para sua tia e brindaram. Débora esforçou-se para dizer com o máximo de entusiasmo que conseguiu:

-Ao seu sucesso, meu anjo!

-Obrigada, Titia! -disse sorrindo.

Débora bebeu sua champagne sem pressa. Era ótimo poder estar ocupada com alguma coisa sem precisar dizer nada, pensou.

-Tia, eu quis tanto te agradecer por aquele lanche maravilhoso, mas, como eu te falei, eu não consegui falar com você -disse com um sorriso nos lábios.

-Não precisa agradecer, meu anjo. Você sabe que sempre faço tudo para você com o maior prazer -Débora tentava falar coisas da maneira que usualmente falaria com Júlia, mas faltava-lhe força e intenção.

Júlia voou para dar mais um abraço em Débora. Se Débora não soubesse que tudo que leu foi escrito do próprio punho de Júlia, acharia que Júlia era mesmo um anjo.

-E a que devo a visita, minha tia linda? E vamos animar, viu?

-Eu só estava com saudades -respondeu.

-Ai! Eu também! Deixa eu encher seu copo, Titia. Quer comer alguma coisa? Tenho ainda aqueles salgadinhos que você comprou para mim que eu sei que adora.

-Seria ótimo -respondeu Débora, pensando que enquanto estivesse com a boca cheia não precisaria falar.

Débora e Júlia beberam mais champagne e comeram alguns salgadinhos. Para sorte de Débora, Júlia contava entusiasmada tudo o que sabia sobre Manhattan e Débora limitava-se a sorrir e comentar outras curiosidades que sabia da ilha.

Café ForteOnde as histórias ganham vida. Descobre agora