Inverno part.2

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É engraçado como as coisas tendem acontecer de maneira rápida e desesperadora. Antes, eu me sentia doente, mas não fisicamente e sim mentalmente. Sempre tive o cérebro um pouco lerdo e quando criança, fui diagnosticado com déficit de atenção. Me sentia mal ao ver a pena das pessoas sobre mim. "O pobre garoto não consegue se concentrar", eles diziam.

LiAh, a garota que conheci como bartender em um bar de quinta parecia não se importar em andar com um estranho, ela sorria a cada coisa que via como estivesse em um parque de diversões e não no meio da rua. Pela primeira vez em muito tempo, eu mantive os meus olhos vidrados em alguma coisa: nela. A maneira como arrumava o seu cabelo curtinho e em seguida metia as mãos pequeninas dentro dos bolsos de seu casaco enorme. Ela não só caminhava, como parecia saltitar e vez ou outra eu ouvia os seus suspiros inspiradores, como quem vê uma coisa bonita e então se sente bem. Acho que a observei demais, pois ela riu assim que olhou para mim, certamente me achando um completo idiota. 

— Eu tenho mais um lugar para te mostrar, Hyuk. Quero te dar uma coisa de natal. – falou baixinho e se segurou no meu ombro quando encontrou uma calçada elevada de pedrarias, onde poderia caminhar apenas com um pé à frente do outro, como se fosse uma linha. 

Por um segundo, ela estava ali, sorrindo e brincando no meio fio, mas no outro, a garota simplesmente caiu no chão, praticamente morta, desfalecida e sem nenhuma explicação. O meu pulso acelerou em trezentos porcento e quando me joguei no chão ao seu lado, pude ver o ar de sua vida saindo de seu corpo. Eu teria de ser rápido se quisesse salvá-la. Eu tinha que salvar LiAh.

O telefone da ambulância não saía da minha cabeça em hipótese alguma, mas porque será que eu não lembrava agora?

Seus olhos reviraram e eu ouvi alguém gritar sobre ela estar convulsionando ou algo assim, mas a minha atenção se perdeu no caminho entre um momento e outro, já eu, fui empurrado - provavelmente alguém que soubesse o que estava acontecendo. - O número da ambulância surgiu na minha mente e eu disquei 119 o mais rápido que consegui. LiAh tremia todo o seu corpo e eu já me sentia desesperado quando uma mulher subiu em cima de si e começou uma massagem cardíaca. Porque isso tinha que acontecer justo agora?

As minhas mãos estavam descontroladas e só encontraram repouso quando eu segurei na cabeça da menina que sofria um ataque cardíaco no meio da calçada em uma véspera de natal. Ótimo. A emergência chegou depois de tanto tempo, mesmo assim eu ainda estava lá. Não poderia deixá-la sozinha naquele momento. Quando me dei conta, estava dentro da ambulância, segurando uma máscara de respiração no rosto de Liah. 

Os paramédicos examinavam seu corpo inteiro e eu fui chutado algumas vezes pelos dois homens que cuidavam dela. O meu coração se acalmou por um segundo quando a vi parar de tremer, mas acelerou novamente quando disseram algo sobre uma nova parada cardíaca. Como era possível alguém sofrer tanto assim? 

Um dos paramédicos tomou o meu lugar e fez uma respiração boca-a-boca, mas LiAh não deu o mínimo sinal de reação e então, uma nova massagem em seu peito fora feita. Pensei se não estariam a machucando pela força em que faziam em seu tórax. Os aparelhos barulhentos na cabine me deixavam atônito, o carro passou a ir quase na velocidade da luz, revirando todas as coisas ali dentro, inclusive eu. 

— O coração parou, o coração parou! – disse um.

— Ligue o desfibrilhador! – gritou com o outro e eu fui empurrado mais uma vez para um canto da ambulância. 

A maquininha gelada e feiosa mostrou sua utilidade, e eu fiquei com medo de que LiAh não resistisse a algo tão forte. Ela não ia morrer, ia? 

A ambulância parou, mas não impediu que os paramédicos continuassem seu trabalho. A camisa de LiAh fora levantada, mostrando o seu top e eu fiquei ainda mais nervoso quando o primeiro choque foi direcionado à região de seu peito. Ela acabou sendo entubada e com a respiração forçada, seu coração finalmente voltou a bater. 

LiAh conseguiu chegar no hospital e mesmo com medo de estar ali, fui obrigado a preencher uma ficha de admissão de paciente. Eu sabia apenas o seu primeiro nome, o resto, inventei. Um médico veio ao meu encontro quando eu já me preparava para ir embora. Eu ainda teria uma noite super patética com a minha irmã e sua família. 

— Você conhece ela? – acenei com a cabeça. — Sabe se ela já teve outros casos semelhantes? – abanei a cabeça. — LiAh acordará daqui alguns minutos. Geralmente os pacientes deste tipo não podem ficar sozinhos, você se incomodaria em ser seu responsável? – abanei novamente — Ótimo! 

Não costumo achar nada sobre médicos, mas aquele senhor com certeza não é normal.

Quando finalmente encontrei a menina sentada em sua maca, mexendo em seus dedos com sua cabeça baixa de forma que os seus cabelos caíam sobre o seu rosto, não permitindo a minha visão, me acalmei, mas não totalmente. Ouvi apenas o som que sua boca fez, entregando o seu sentimento. O choro.

— Olá...

LiAh me olhou no mesmo segundo. Parecia estar surpresa e seus olhinhos vermelhos se apertaram quando ela sorriu para mim.

— Oi! – ela disse rápido — Foi você quem me trouxe para cá? Sinto muito pelo susto.. Achei que teria mais tempo... – acabou sussurrando a última parte.

— Sem problemas, você... Você vai avisar os seus pais que não pode ir mais para a ceia de natal? – me sentei na cadeira lisa que havia ali.

Por algum milagre as compras para os meus sobrinhos e para a minha irmã ainda estavam comigo mesmo após toda aquela situação, então lembrei que não poderia passar o meu natal com eles, mas eu nem estava triste.

— Não, a minha mãe está no exterior e eu não conheço o meu pai, então... – ela juntou os ombros mostrando sua despreocupação. — O natal nem é tão importante assim p'ra mim.

Nem pra mim, quis dizer.

— O que acha...

Eu não deveria me oferecer. LiAh não tinha ninguém aparentemente, o que era super suspeito considerando que ela é tão espontânea e comunicativa. Conquistou a minha amizade sem que eu nem percebesse.

— O que você acha de passar o natal comigo?

Ela me olhou de maneira engraçada e eu quase ri quando ela riu. LiAh balançou a cabeça e fez um sinal de legal com o polegar. Acho que aquilo era um sim, mas vinha a parte confusa: como fazer uma ceia de natal em um hospital?

— O que acha de, no ano que vem tivermos um banquete? Eu tenho uns chocolates na minha mochila, acho que por hoje é o suficiente. – ela estava tão calma, mas o aparelho ao seu lado pareceu enlouquecer por um segundo. Quando percebi, se tratava dos seus batimentos.

— Você está feliz? – perguntei incrédulo. LiAh sofreu duas paradas cardíacas em um único dia e não tinha ideia de como ainda estava viva, mas estava feliz.

— Essa é a primeira vez que tenho um natal! – ela bateu as duas mãos e então apontou para a sua mochila ao qual eu segurava. Quando abri, vi as embalagens com o chocolate que ela havia falado. — Escolha qual você quer..

Os bombons tinham formatos diferentes e eu escolhi um que tinha a embalagem verde, era um ursinho, ela pegou o amarelo, um coração.

— Feliz natal.

— Feliz natal, Hyuk!

WINTER |•| Kwon Hyuk- DeanWhere stories live. Discover now