Capítulo 2 - Irmão

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- Não gostaram da surpresa? - meu irmão pergunta.

- Tem certeza que quer ouvir a minha resposta, Edi?

Minha mãe coloca sua bolsa azul sobre a mesa e senta ao seu lado para conversar logo após ele voltar para a poltrona com sua pipoca.

- Não ligue para o que Rafael diz, estávamos sentindo muito sua falta.

- Fale somente por você. - retruco.

- E como está tudo por aqui? - Edi pergunta enquanto mastiga pipoca - Tudo normal?

- Até você voltar? Sim, estava tudo maravilhoso! - respondo ainda insatisfeito com sua presença.

Sabia que aquele comportamento deixaria minha mãe chateada, mas em nenhum momento hesitei em não agir daquela forma.

- Já chega, Rafa! - Dona Glória exclama o mais alto possível. - Não consegue ser menos irritante pelo menos uma vez?!

- Só esperava um pedido de desculpas. Enquanto isso não acontecer, não espere que eu seja legal! Fingir simpatia é algo que não consigo fazer.

Vou para o meu quarto, fecho a porta e coloco meus fones de ouvido.

Tento me tranquilizar para não perder o controle. Sei que faço muita besteira quando fico irritado.

Baixo o volume da música para tentar ouvir sua conversa e saber se estavam falando de mim. Obviamente estariam. Por que ainda me importo com isso?

Ainda nada tranquilo, nem pensando em relaxar, me levanto e me aproximo a porta para ouvir um pouco melhor, pareciam cochicharem.

- Seu irmão está estressado porque nunca namorou nenhuma garota ainda. Quando arrumar uma, ele vai se aquietar. - Dona Glória não poupa palavras. - Acredito que não demore tanto, já que hoje o pastor Elton o chamou para conversar. Pode esperar, daqui um tempinho vamos ver Rafael de mãos dadas com uma moça fiel a Deus.

Isso doeu e ainda mais ao ouvir Edi gargalhar.

- A senhora ainda não sabe? - ele continua rindo. - Pensei que Rafa já tivesse contado!

Edi continua dando gargalhadas como se tivesse acabado de ouvir uma piada super engraçada.

- Ele já está namorando? - ela pergunta.

- Não sei. - Edi tenta parar aos poucos sua "crise de riso" e responde. - Pergunte a ele.

Volto a me deitar na cama e coloco novamente os fones de ouvido. Não era para eu ter ouvido aquele papo que me deixou pior do que eu já estava.

Confesso que não estou bem. Preciso de alguém para conversar, mas quem vai querer ouvir meus problemas? Quem ouviria os problemas de um garoto gay que, por medo, evita correr atrás de seus sonhos e de seguir sua própria vida?

Ligo para Suellen. Ela atende e consigo ouvir música alta no fundo.

- Alô?! - Su fala ao atender.

- Tá em casa?

- O quê?! - ela gritando responde sem ouvir o que perguntei.

- Você tá em casa?! - pergunto novamente em um tom mais alto.

- Não! Me liga mais tarde. Não posso falar agora! Tchau! - ela desliga.

Agora realmente não tenho com quem conversar. Meus pensamentos estão me matando e essa casa parece estar me sufocando. Preciso respirar.

Alguém bate na porta.

- Rafael? Abre a porta. Preciso falar com você.

Minha vontade de ouvir qualquer palavra vinda de minha mãe ou de meu irmão era quase nenhuma. Mesmo assim me levanto, respiro fundo e abro a porta para ela entrar.

Dona Glória entra e logo se senta na minha cama ao meu lado. Não consigo olhar em seus olhos, estava com medo de encarar ela e logo em seguida as lágrimas começarem a escorrer.

- O que está acontecendo? - ela pergunta me olhando seriamente. - Está tão diferente. Agora falando grosserias, com um jeito um pouco rebelde. É isso que estão te ensinando na igreja?

- Só tô cansado...

- Cansado de quê? - ela me interrompe. - Você tem tudo que precisa em casa. Sempre tira boas notas na escola e é um dos adolescentes mais queridos da nossa igreja. Te entender é um pouco difícil para mim.

- Não preciso que me entenda. Só quero que me respeite e me deixe ficar tranquilo. Estou sob muita pressão e... Acho que é isso. Preciso de um tempo sozinho. E agora que Edi voltou...

Dona Glória se levanta da cama sem paciência.

- Não vou aceitar que fale mais coisas sem noção sobre seu irmão! Pensei que fosse uma boa ideia conversar contigo, pelo visto é uma perca de tempo. Vou para reunião de três horas da tarde. Está ficando insuportável essa sua richa com Edi.

Ela finalmente sai do meu quarto.

Realmente queria dizer, contar tudo sobre essa mágoa que sinto de Edi e o que ele fez de tão grave, entretanto, serei o único culpado por tudo que aconteceu. Sempre deixo o medo tomar o controle das coisas e assumir o rumo que acabo tomando.

Nunca contei esse segredo para ninguém. Já se passou tanto tempo desde o fato que se descobrirem, terei que me conformar em ser uma piada para todos.

A porta está destrancada e Edi entra em meu quarto.

- Conseguiu contar para ela dessa vez? - perguntou num tom desconfiado - Sabe as consequências que isso pode acarretar caso venha a tona, não é, Rafa? O único afetado será você.

- Eu não contei. - respondo em um tom baixo.

- Engraçado. Na frente dela, você é um leão falando comigo. Agora, por exemplo, estamos só nós dois, você muda.

- Já falei, sabe o que eu quero e o que preciso. O que custa me pedir perdão? Eu só preciso disso para te ver com outros olhos e deixar tudo no passado.

Edi volta a dar gargalhadas. Ele só fazia aquilo porque sabia que me irritava ao extremo.

- Nunca te pedirei perdão, Rafa. Foi bom para mim, na verdade, foi ótimo, maravilhoso se duvidar. Por isso, jamais escutará de minha boca um pedido de perdão por algo que eu curti. Nem parece que me conhece.

O medo que sinto de meu irmão mais velho é terrível. Meus atos parecem todos desnecessários. Se aproveita, pois sabe que consegue me desestabilizar completamente.

Já a noite, não consegui dormir. Ele estava no mesmo quarto que eu, e com certeza também estava acordado. Me levanto levemente para ir ao banheiro. Vejo que são quase duas e quarenta da madrugada.

De frente para o espelho do banheiro, vejo meus olhos inchados novamente após chorar horrores baixinho.

Não tenho costume de trancar a porta do banheiro quando entro de madrugada, e Edi sabe e disso, pois crescemos juntos, ele conhece todas as minhas manias.

Aproveitando disso, me deu um susto ao também entrar no banheiro para fazer xixi.

Lavo meu rosto e tento sair do banheiro, mas ele me segura pelo braço ao acabar e ainda com seu órgão genital para fora de seu pijama, fala baixo no meu ouvido direito.

- Não pense que esqueci os milagres que conseguiu fazer daquela vez.

Meu PastorWhere stories live. Discover now