— Arthur. — Ele não tirou os olhos do livro.

— É um prazer conhecer você, Arthur — disse ele, sentindo-se corar. — Eu me chamo Gabriel, como o Sr. Mendes disse antes. V-você estuda aqui faz tempo?

Arthur balançou a cabeça, confirmando.

— Desde o primeiro ano do fundamental — explicou.

— Poxa! É muito tempo! — Gabriel ponderou, olhando ao redor, para as pessoas nas outras mesas. Percebeu que havia um menino olhando para a mesa deles, mas o garoto abaixou os olhos para o caderno quando foi flagrado. A professora ainda tagarelava monotonamente, agora sobre a vida da autora e de como surgira a ideia dos sete livros. — Acho que você é um dos poucos interessados em leitura nesta sala. Os outros estão quase dormindo enquanto ela fala.

— É, eu gosto muito de ler — Arthur retorquiu. — É a minha forma de me desligar da realidade.

— Você curte séries também? — Gabriel disparou.

— Gosto! Minha irmã e eu sempre fazemos maratona!

— Que divertido! — Gabriel exclamou. — Eu sou filho único, então sempre faço maratonas sozinho. Minha mãe sempre dorme quando a gente tenta assistir alguma coisa juntos. Eu queria ter um irmão, deve ser bacana. Às vezes me sinto sozinho sabe, mas é coisa de momento. Acho que hoje é meu dia de sorte, Arthur. Achei cem reais na rua, e agora tô conhecendo um potterhead. Tem como meu dia melhorar?

Arthur deu uma risada meio sem jeito. Percebeu que Leo o encarava pelo canto dos olhos.

— É, nunca se sabe... — Arthur disse simplesmente.

Eles ficaram em silêncio por um instante.

— Me mudei para cá nesta semana — Gabriel explicou, voltando a tagarelar. — Minha mãe recebeu uma proposta de emprego. Ela vai começar a trabalhar na Mineração Luporini como pesquisadora.

— Legal! Vocês vieram de onde? — Arthur fechou o livro, usando o marca páginas e decidiu puxar um pouco de assunto. Não se lembrava de Enrico ter contratado alguém, ainda mais para o setor de pesquisas.

— Indaiatuba. Não é muito longe daqui. A gente sempre voltava para cá vez ou outra para visitar os meus avós, antes deles morrerem — Gabriel elucidou. — Minha mãe nasceu aqui mesmo, mas foi embora cedo.

— E o seu pai? — Arthur questionou.

— Ele morreu quando eu tinha uns seis anos — ele explicou com os olhos melancólicos. — Num acidente. Somos só minha mãe e eu mesmo.

— Sinto muito! Seja bem-vindo a Cipriano!

Quando tocou o sinal, uma buzina anasalada, indicando o fim da aula de literatura, Maria Helena deixou a classe. Serena e Tereza se viraram em seus assentos, encarando Arthur e Gabriel.

— Oi — Serena exclamou com um sorriso. — Bem-vindo ao Advanced School! Meu nome é Serena!

— Obrigado. — Gabriel sorriu, inseguro.

— E eu sou a Tereza — ela acrescentou. — Vai gostar daqui, Gabriel. Se precisar de ajuda, é só falar com a gente!

Ele apenas sorriu. Para onde quer que se virasse, os olhos curiosos das outras pessoas estavam sobre ele.

O resto da manhã se passou do mesmo jeito. Após a aula de Literatura, tiveram que suportar duas seguidas de física; o professor Wagner foi o único que fez Gabriel se levantar e se apresentar para turma toda.

Na hora do intervalo, uma pausa de vinte minutos, ele foi convidado a sentar-se à mesa com os amigos de Arthur no refeitório. Serena, a menina ruiva, apresentou todos eles para Gabriel, e ele logo reconheceu que era Leonardo o nome do garoto que não parava de olhar para a mesa deles durante as aulas.

Quando o dia estava perto de terminar, a professora de Geografia pediu que Arthur levasse Gabriel para um tour pelas instalações do colégio. Eles guardaram os materiais na mochila e deixaram a sala para trás.

A propriedade era imensa, mas ele tinha trinta minutos até que o sinal ecoasse novamente. Arthur mostrou para Gabriel as instalações do prédio antigo e mostrou onde ficavam os prédios do ensino fundamental. Ali naquela parte havia também o espaço kids, com um refeitório só para as crianças. Depois, eles atravessaram para o outro lado, onde havia o refeitório com a lanchonete para os alunos do ensino médio.

Subiram as escadas, explorando os corredores.

Arthur mostrou as salas de conferência, o estúdio de artes, o laboratório de informática e química, o teatro e a biblioteca. Logo após, desceram as escadas e se encaminharam para o departamento de esportes. Arthur continuou com o tour, guiando Gabriel de volta para as áreas externas. Assim que deixaram a quadra poliesportiva para trás e atravessaram pela passarela de vidro, Arthur mostrou ao novato o campo de futebol. Havia uma turma ali tendo aula de educação física e algumas meninas estavam sentadas na arquibancada apenas jogando conversa fora, esperando pelo sinal tocar para irem embora.

O tour acabou mais rápido do que Arthur pensou, então eles se acomodaram debaixo da sombra de uma árvore, sentando-se nos bancos de concreto.

— Com certeza deixei passar alguma coisa — Arthur comentou. — Mas com o tempo você vai se acostumar e não vai se sentir perdido.

Gabriel riu.

— Mesmo assim, muito obrigado! — Agradeceu. — Isso aqui é enorme! Acho que vou precisar de um mapa para poder me localizar de vez em quando! Será que você pode me passar seu número? Assim a gente vai conversando e você pode me contar um pouco mais da escola.

Arthur pensou por um instante. Então o anjinho em seu ombro disse: você não sabe quem esse menino é, Arthur, não passe seu telefone. Em contrapartida, do outro lado havia o diabinho e ele dizia: você o achou bonito sim que eu sei, deixa de frescura e passa logo esse número pro garoto.

— Passo — Arthur decretou, ouvindo ao diabinho. Ele cantou os números de forma pausada, observando Gabriel tamborilar os dedos pelo teclado numérico do smartphone.

— Valeu, Arthur! — Gabriel agradeceu. — Me diz seu sobrenome pra eu salvar aqui!

— É sério que você não sabe quem eu sou? — Ele lançou, levantando-se quando o sinal tocou. — Luporini. Arthur Luporini.

Gabriel congelou no mesmo instante.

— Meu Deus! — disse ele, constrangido. Sentiu o rosto queimar. — Nossa, me desculpa, sério! Meu Deus, como eu sou idiota! Eu não o reconheci da TV! E-eu sinto muito pelos seus pais, Arthur.

— Tudo bem — Arthur disse. — Acontece. Me manda uma mensagem depois para gente trocar uma ideia.

— Posso te passar meu número também?

Arthur riu.

— Pode ser.

Então Gabriel ditou os números devagar, olhando Arthur mover os dedos pelo celular.

— Obrigado, Arthur. — Gabriel se levantou. Os olhos vibrantes encararam Arthur com cautela.

— Quer almoçar comigo? — Arthur lançou o convite num supetão. — Tem um restaurante muito bom no boulevard do Vechiatto aqui perto.

Vechiatto era o maior supermercado de Cipriano, sempre muito movimentado. O estacionamento tinha três andares e mesmo assim era difícil encontrar uma vaga para estacionar nos finais de semana. Isso porque bem ao lado havia um boulevard com praça de alimentação com duas redes de fastfood, um restaurante de comida japonesa, lotéricas, caixas eletrônicos e perfumarias.

O supermercado era o ponto de encontro de algumas pessoas devido ao boulevard. Cipriano não tinha shopping, apesar de o antigo prefeito ter anunciado um projeto acerca da futura instalação e construção. O projeto nunca saiu do papel, mas agora Samuel estava estudando as novas possibilidades.

— Claro! Quero sim! — Gabriel aceitou. — Só preciso avisar minha mãe quenão vou almoçar em casa. Assim a gente se conhece um pouco mais. Eu sei quefalei demais na aula de Literatura, mas não sei o que me deu. Geralmente, eusou bem na minha, acho que... não queria me sentir excluído.

O Jogo dos Segredos [1] DEGUSTAÇÃOWhere stories live. Discover now