Fugir da Cela

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    "Uma vez certo alguém disse:
Destruam esse templo
e em três dias o reconstruirei."

    "Se o destino é consciente,
ele foi bem irônico."

Século XV

     Aquela manhã o pequeno conde deu toda a sua comida para sua companheira de cela, pois o carcereiro não a alimentava acreditando que não duraria muito tempo sem os devidos cuidados. Entretanto o pequeno manteve-se convicto em ajudar a menina o quanto podia, por isso fez questão de insistir que ela comesse seu pão velho e bebesse sua água ferrogenosa, mesmo ela negando a alimentar-se devido a sua dor; seu rosto doía quando mastigava, seu ventre sofria e sua mente a pertubava com as lembranças horríveis que declaravam o triste fim de sua infância.

    Passaram-se três inacreditáveis dias após o ocorrido, a pequena dama continuava fraca mas havia melhorado muito em relação a seu estado anterior, melhorado de ua forma milagrosa, e o conde se alegrou com sua extraordinária melhora física, embora os olhos da mocinha, repletos de sofrência provassem o contrário e a garota permanecesse em silêncio, não dando-lhe uma única palavra, desde o dia em que se conheceram.

    Ele compreendia a solitude da moçinha, mas sua mente infantil desejava saber mais sobre ela, que parecia tão frágil e debilitada. Se deixou vencer pela curiosidade e evitando contato direto com a dama como se estivésse dando-lhe privacidade, dirigiu-lhe a palavra.

– Se a senhorita me permitir a pergunta, – iniciou com a boa educação que recebeu de seus tutores – como veio parar em um covio turco?

   A mocinha sentada na outra parede escondia seu rosto machucado nos cabelos soltos que agora encostavam no chão, as pernas bem fechadas, tentando esconder o que a camisa de seda não cobria, as mãos quietas sobre as coxas, a cabeça apoiada no canto da cela, mantendo a expressão mais quieta cujo o trauma lhe proporcionou.

– Perdoe-me, compreendo que não esteja pronta para falar – se arrependeu de perguntar segundos depois.

    Ele se recordou do dia em que os inimigos o capturaram e o levaram para a Anatólia, onde apodrecia há cerca de um ano naquela cela desde então.

– Estava com meu irmão mais velho na floresta quando os turcos apareceram. Mircea era o seu nome, tentou me proteger e o perdi naquele mesmo dia – confessou observando a garota pelas costas – Quando me sequestraram, o rei inimigo acreditou que o meu pai faria de tudo para me resgatar – seus olhos tornaram-se vazios ao relembrar do dia em que foi capturado, o dia em que perdeu seu irmão – mas meu pai sempre dizia que para vencer uma guerra e salvar o povo, sacrifícios devem ser feitos e que decisões difíceis devem ser tomadas em tempos difíceis, é assim em toda guerra – o olhar vazio do menino vagou para aquele dia, o dia em que desacreditou em seus sonhos recordou do dia em que o carcereiro lançou zombaria ante seu rosto gargalhando em sua frente dando-lhe a notícia de que seu pai não o resgataria. Naquele tempo ele chorou por muitos dias até se acostumar com essa nova vida – Por isso estou preso aqui até hoje – os devaneios cessaram e ele retornou à realidade, unicamente para sorrir sereno à companheira – Esta é a minha história, assim vim parar aqui na Anatólia, dentro da inabalável fortaleza de Egregoz – revelou a última frase com um pouco de desgosto, mesmo assim, fez com o intuito de que a dama se sentisse um pouco mais à vontade perto dele.

Segredos de Vlad(PAUSADO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora