Capítulo LXVI - SARA

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Era o meu dia de buscar comida e eu já estava voltando para casa, quando vi a Helô na esquina, provavelmente me esperando.

- Eu preciso muito, muito, muito de um favor seu - pediu, aproximando-se de mim com urgência.

- Pela sua cara deve ser um favorzão, né? - tornei, erguendo uma sobrancelha.

- Um mega favorzão, na verdade.

Concordei com um meneio de cabeça e pedi que ela me acompanhasse até a cozinha para que eu pudesse deixar a comida lá. Então seguimos para um dos quartos.

- Eu preciso que você acoberte uma saída minha – começou ela, desconfortável.

- Que tipo de saída? - tornei, franzindo o cenho.

- Você precisa confiar em mim, Sara - insistiu, preocupando-me um pouco. – Não me faça me arrepender de abrir o jogo com você.

Abri a porta do quarto e conferi se havia alguém nas redondezas que pudesse ouvir nossa conversa. Pelo tom sério da Helô, só podia ser algo bem grave. Para nossa sorte, estávamos sozinhas.

- Eu prometo te ajudar – comecei, séria. – Mas só se você prometer que vai me contar tudo o que está acontecendo.

Sua expressão assustada me mostrou que o buraco era muito mais embaixo do que eu supunha.

- Só se você prometer que não vai contar para ninguém. Ninguém mesmo!

Concordei com um aceno de cabeça e a vi medindo as palavras antes de começar.

- Tem algum tempo que eu e o Zeca andamos fugindo todas as madrugadas - começou, ressabiada. – Começou quando eu o vi fugindo e resolvi seguir ele. - Ao notar minha expressão acusadora, ela se apressou em defender-se. – Eu só queria provar pro Tonho que eu não sou uma inútil, Sara! Que eu sei me virar sozinha e que eu sou capaz de fazer coisas importantes também.

- Ah, Helô... - suspirei. – De novo isso?

- Deixa eu terminar – pediu. – Então eu descobri que o Zeca estava se encontrando com a Malu e com aquele cara que veio ameaçar o Zeca, que na verdade é o irmão dela.

- Você está brincando! - exclamei, chocada.

- Não estou. E tem mais: eles estavam bolando um plano para encontrar aquela tal terceira criança antes daquela gente louca do hospital.

- Isso não é só uma lenda?

- Eu também sempre pensei que fosse, mas não é. Na verdade, a Malu e o Bruno são a primeira e segunda criança, que tecnicamente, nem são mais crianças - ponderou. – Mas enfim, eles me descobriram e o Zeca me mandou pra casa, mas eu o ameacei, dizendo que se ele não me deixasse participar do plano, eu contaria tudo para a Iolanda. É claro que ele acabou cedendo e nós passamos semanas rodando em círculos sem saber exatamente para onde ir. Nesse meio tempo a Iolanda descobriu tudo.

- E foi por isso que eles terminaram – arrisquei.

- Eu pensei que ela fosse contar tudo para o Tonho e acabar com a minha felicidade, porque eu consegui provar para eles e para mim mesma que eu sou útil, Sara. Eu consigo fazer coisas incríveis. Coisas que eu nem sabia que conseguia.

- E o que fez ela mudar de ideia? - perguntei.

- Ela disse que odeia aquela gente mais do que nos ideia e então ficou tudo bem.

Conforme ela ia me contando aquela história sem pé nem cabeça, eu me perguntava quem era aquela pessoa que estava na minha frente. Em alguns momentos ela parecia uma completa estranha, mas em outros ela parecia a Helô de sempre.

- Nós quase desistimos, porque não havia nenhuma evolução nas nossas buscas, até que uma louca chamada Nice nos encontrou, alegando ser irmã dessa tal terceira criança, que na verdade se chama Flávia e está no hospital.

- Helô do céu! - exclamei, alarmada. – Me diz, por favor, que vocês não estão pensando e voltar naquele inferno.

- É pra isso que eu preciso que você me ajude. É nossa chance de frustrar os planos daquela gente.

- Ah, não! Nem pense que eu vou te ajudar nessa ideia ridícula. Não mesmo.

- Mas você já prometeu.

- Mas eu posso desprometer!

- É claro que não pode - brigou. – Promessa é promessa. Você é ou não é minha amiga?

- Sou, mas...

- Então confia em mim, Sara! - pediu, com olhar suplicante. – Nós sabemos o que estamos fazendo. Nosso plano foi muito bem arquitetado.

- E se acontecer alguma coisa com você? - indaguei. – O que eu vou fazer? Com que cara eu vou olhar pro seu irmão?

- Não vai acontecer nada.

Além da nossa amizade, eu estava levando em conta o fato de que eu nunca a vira tão realizada na vida – mesmo que parecesse estar morrendo de medo também. Talvez por isso, eu acabei cedendo.

- Tudo bem – disse, por fim. – Eu vou acobertar a sua saída...

- Obrigada, Sara! - gritou, jogando-se em cima de mim, num abraço muito alegrinho.

- Eu vou te acobertar, sim – continuei, muito séria. – Mas se você não aparecer até a hora que todos acordam, eu mesma vou contar tudo o que você me disse para o Tonho, entendeu?

Com um aceno assustado ela concordou com a minha condição e saiu do quarto, enquanto eu fiquei me perguntando se eu tinha feito a coisa certa ou não.

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E aí? Sara fez bem ou não em manter o segredo da Helô?

Completamos 19k! Obrigada a todos vocês :D

Beijinhos


A Terceira Criança - Livro 2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora