03. scars and hair

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Meus pulsos ardiam no dia seguinte, minha pele queimava, mas a sensação que a dor me causava não poderia ser melhor. O simples fato de que eu sentia dor  me agradava. Suspirei, atravessando o portão azul da escola depois que desci do ônibus escolar. Minha mochila pesava pelos livros que eu havia pegado na biblioteca para ler, mas que não havia conseguido sequer terminar. 

Eu amava ler com todas as minhas forças, mas eu simplesmente não conseguia mais. 

Passei primeiro na biblioteca para entregar os livros, a bibliotecária, Lena Potter, sorriu na minha direção e perguntou o que havia achado dos livros. Eu sorri forçado e disse críticas divertidas que poderiam ser construídas apenas com as poucas páginas e o enredo que eu havia lido sobre cada, mas ela pareceu gostar. A senhorita Potter me indicou mais alguns livros e eu disse que iria passar por lá depois da aula e que deveria ir agora, ela concordou e falou que me esperaria. 

Eu não passei mais tarde.

Eu me enfiei no banheiro e comecei a procurar desesperadamente algo em minha mochila. Os corredores estavam vazios, sabia sobre tudo naquela escola naquele horário. Sabia tudo sobre a escola em qualquer horário, provavelmente era uma das melhores alunas que havia pisado ali nos últimos anos, e literalmente, a única que era amiga dos professores. 

Mas o título logo seria apagado, tenho certeza. A diretora nunca iria mais falar ou tocar em algo que remetesse meu nome, ninguém iria. 

Não gostam de falar sobre coisas que acontecem assim.

Achei.

Suspirei, erguendo lentamente a barra do meu moletom, não por receio, mas com cuidado para que o pano não se sujasse ou esbarrasse em alguma ferida aberta. Vi os cortes, mais uma vez. Segurei a lâmina com força e cortei a palma da minha mão no processo, me encarei no espelho e a coloquei no pescoço, exatamente onde minha jugular pulsava. 

Vamos, vamos, faça isso.

Bufei, negando com a cabeça. Não, seria deprimente morrer na escola. Não queria que algum idiota encontrasse meu corpo e tudo que sentisse fosse pena, não era digna de pena, só queria que me enterrassem logo. 

Escutei o sinal tocando, guardei todas minhas coisas e vi as gostas de sangue escorrem pelo meu braço.

Lavei as mãos. Abaixei o moletom. Fui embora. 

Queria me causar dor, mas ainda mais que isso. Quanto mais me cortava só conseguia pensar em algo: nela. Nos cortes profundos em seus pulsos quando a visitei no hospital e no seu olhar em minha direção. 

Sem você eu morro.

Acho que realmente morreu... Agora é meu fantasma, querida

"Ah, okay, pergunta." Lauren murmurou depois de comer uma colher de seu sorvete e então apontar com ela para mim. "Como um gênio, o que acha. Qual livro é melhor: O Ladrão de Raios ou O Prisioneiro de Azkaban?"

"Deus, essa não vale." Eu ri dela, enquanto também comia uma colher do meu sorvete. Estávamos em uma lanchonete perto da escola depois do período de aulas, ela havia me convidado. "É tipo escolher entre um filho."

"Mas você não tem filhos." Ela me rebateu, de forma divertida. 

"Oras, os livros são meus filhos." Sorri em sua direção e ela revirou os olhos, rindo também. Seu celular não tardo em começar a tocar e ela franziu o cenho, confusa, enquanto olhava o visor. Logo, uma expressão irritada tomou conta do belo rosto e ela apenas recusou a chamada. "Está tudo bem?"

"Minha mãe, está tudo bem." Ela disse, desligando o celular rapidamente. "Mas então, outra pergunta."

"Manda."

"Quanto tempo vai demorar para você aceitar sair comigo?" Ela perguntou, direta, me encarando com aquele olhar intenso de sempre que me fazia perder o ar. 

"Bom, você nunca me pediu isso." Sorri, a rebatendo, enquanto apoiava um cotovelo sobre a mesa. Se minha mãe visse a cena nesse momento, provavelmente tinha batido com a colher de sorvete no meu braço. 

"Touché." Ela riu, antes de se inclinar na minha direção. "Quer sair comigo, em um encontro, Camila?"

"Vamos lá." Sorri de forma torta e ela me acompanhou, voltando a prestar atenção em seu sorvete. Como podia ser tão linda?

"Camila." Ouvi a voz do professor de física me chamando e o encarei, o olhar ainda meio perdido. O olhar da sala estava completamente em mim enquanto minhas mãos apertavam com força a madeira da mesa. "Está tudo bem?"

Soltei rapidamente meus dedos da mesa e sorri. "Claro, sim. Desculpe, estava falando comigo?"

"Poderia nos dizer o que seria um corpo não eletrizado?"

"Claro." Assenti. "Um corpo neutro." Respondi, com certa certeza na voz. 

"Muito bem." Ele sorriu em minha direção antes de olhar para um aluno que se sentava no fundo. "Entendeu, Brian?"

Sua voz estava repleta de sarcasmo, o que fez com que a sala risse do garoto. Eu apenas sorri de forma forçada como todos, antes de encarar meu caderno e suspirar. Peguei um lápis e comecei a rabiscar o canto das folhas, sem saber realmente o que estava desenhando. 

No final da aula, olhei meu desenho.

Era uma garra, com unhas gigantes e apoiada em uma delas estava ali algo que eu não esperava: uma forca. 

Sai da sala como todos, mas um pouco com mais lentidão. Meus amigos estavam na frente, correndo para o ônibus como o usual. Apenas andei lentamente, me sentando em um lugar mais a frente, não queria ouvir o barulho que o fundo sempre fazia. Ultimamente, eu não estava mais no meio da bagunça e das risadas, eu só fugia dela.

Peguei meu fone e os coloquei, abrindo a pasta de música do meu celular. Normalmente eu as nomeava em datas, mas com números embolados que só eu entendia, estava escutando a playlist de março fazia mais de dois meses. 

Drowning estourou em meus tímpanos, adorava a melodia e a letra me levava em pensamentos estranhos que eu adorava pensar sobre. Nas diferentes formas em que eu poderia acabar com tudo aquilo. 

Porém, alguém sentou ao meu lado no banco do ônibus e puxou um dos meus fones. Eu encarei a pessoa de uma forma irritada e percebi os mesmo cabelos familiares. 

Castanhos avermelhados, a franja lisa e o rabo de cavalo. Seu sorriso de covinhas me irritava, eu preferia outros tipos de covas. Seu olhar era estranho, algo como amigável. 

"Ei, Camila." Ela disse, com aquela voz e eu ergui uma de minhas sobrancelhas. Ela encarou meu celular e franziu o cenho. "Gosto do EDEN também, mas acho que ele tem músicas mais animadas."

"Essa é animada." Eu disse, de forma rude. Ela deu de ombros, não se importando com meu tom. 

"Quer conversar?" 

"Não."

"Meu nome é Ariana." Ela sorriu outra vez, começando a ficar nervosa. Eu assenti, oferecendo um fone para ela. 

"Quer escutar também?" 

Ela me encarou de forma estranha, também fiquei um pouco confusa com minha ligeira vontade de compartilhar músicas. 

"Me indique músicas então." Completei. 

Ela sorriu, assentindo. Buscando em meu Spotify alguns álbuns e logo uma melodia doce tocava em meu ouvido. 

Bom gosto musical.

oi amoras. a fica vai ter em média uns 10 capítulos e no máximo 15. eu amo vocês :) volto amanhã ou depois.

n corrigi 


blood and tears.Onde histórias criam vida. Descubra agora