Capítulo 17 - Marcelo

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― Sabe muito bem que só tomo café depois da minha caminhada ― ela diz e olha para a mesa do café e não fala mais nada. Apenas sai da minha frente e segundos depois ouço a porta da frente se fechando.

O sangue ferve em meu corpo. Tantas emoções me invadem neste momento que eu não consigo descrevê-las. Cenas da minha infância passam como flashes pela minha cabeça.

Minha mãe saindo e me deixando sozinho em casa.

Um corpo caído no quarto e sangue pelo chão.

Uma menina chorando, correndo pelo quintal.

Eu ergo a mão para esmurrar a mesa, mas consigo pará-la no ar. Saio da cozinha e vou até o escritório. Olho para as minhas mãos, estico e encolho os dedos. Sinto meu maxilar se contrair e minhas pupilas dilatarem.

Preciso fazer alguma coisa para aliviar esta tensão. Preciso extravasar esta carga negativa que me assola.

Por que Isabel está me tratando com tanto desprezo? Será que não me ama mais? Será que expirou o prazo da aposta? Que loucura!

Pego um livro, mas não consigo ler. Preciso de algo que exija exercícios físicos.

Vou até o jardim perto da piscina e começo a podar algumas plantas desordenadamente. Se eu não canalizar pra outra coisa toda esta energia negativa, acabarei libertando todos os demônios que vivem dentro do meu peito. E isso é o que mais temo. Se forem libertos nem eu mesmo poderei detê-los.

Depois pego uma enxada e começo a capinar. Rapidamente o suor molha a minha camisa. O sol está extremamente quente. E a nuvem escura que vi mais cedo já desapareceu e não há nenhum sinal de chuva no céu límpido e claro deste domingo.

Jogo a enxada para o lado, arranco toda a roupa e pulo na piscina. Nem me importo se alguém me verá pelado. Quero me libertar de tudo que me prende. Nado de uma extremidade à outra até me cansar. Apoio meus braços na beirada da piscina e descanso um pouco.

Fecho os olhos por uns segundos.

― Mãe!

― Mãe!

Outro flash da minha infância.

Dou um mergulho e vou até o outro lado. Sinto a tensão diminuir um pouco.

Ouço alguém chamando lá fora. Sinto que a voz está se aproximando cada vez mais.

Não dá tempo de sair e vestir as roupas. Encosto-me na lateral da piscina e fico só com a cabeça de fora.

Vejo Roberta se aproximando e faço sinal para ela parar. Ela se assusta.

― Desculpe, Sr. Marcelo. O Sr. pediu para eu passar aqui hoje. Eu não vim mais cedo porque imaginei que fosse dormir até mais tarde...

Ela ficou parada de longe, de jeito que não via meu corpo na água.

― Não foi a Isabel?

― Talvez seja então. Mas foi do celular do senhor que recebi a mensagem.

― Pode ir lá para dentro. Isabel vai chegar daqui a pouco. Com certeza foi ela.

Roberta sai apressada e vejo quando ela entra em casa.

Nado mais alguns minutos e depois saio. Pego minhas roupas e visto.

* * *

Eu tomo café com Roberta. Isabel está demorando. Normalmente ela caminha durante uma hora e volta pra casa. Já faz duas horas e uns vinte minutos que ela saiu.

Mar de rosas e de espinhosOnde as histórias ganham vida. Descobre agora