Explicações

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Eu poderia muito bem ter ido ao hospital primeiro ou quem sabe falar com o sr.McJack e ver o que ele iria querer em troca do favor. Mas esperei que ele saísse para fora do hotel, atravessasse a rua e entrasse na padaria, provavelmente iria tomar café. Bom, ainda não estava na minha hora mesmo.
Era domingo e não deviam ser nem 6:30 da manhã.
Fui até a recepção. A secretária, que aliás, já me conhecia, conversou um pouco comigo. Estava telefonando para Richad a fim de anunciar minha chegada quando Becca me encontrou, parecia que faziam décadas que não à via.
- Kimberlly! Você sumiu! - Me abraçou - Por onde esteve? Temos que marcar de sair de novo, não acha?
- Só que dessa vez deixe a chave do seu carro bem longe de mim - brinquei.
- Com certeza!
A secretária disse que eu poderia subir.
- Becca, nos vemos depois, e sim, vamos marcar qualquer hora para colocar o papo em dia.
Ela ergueu o polegar segundos antes de eu me dirigir ao elevador.
Bati na porta do famoso 992, não foi Richard quem atendeu, e sim uma mulher de cabelos curtos cor acaju e pele clara. Não era muito alta e os olhos eram tão verdes quanto os do filho... Devia ser a Sra. Laurent, eu já tinha visto aquela figura em fotos mas agora parecia diferente, mais velha e mais sofisticada... A julgar pelas roupas. Péssimo momento para discussões... Péssimo momento...
- Você deve ser a faxineira - Ela tinha um sotaque diferente.
- Sou sim mas não está na minha hora de trabalho... Arrr... Vim falar com o Ri...- Ahh - Sr.Laurent - Consertei rapidamente.
Seu nariz se franziu como se sentisse algum fedor.
- Dormiu na rua,garota? - Ela analisava o que um dia foi um vestido de grife francesa.
Eu estava realmente suja, tinha tirado os saltos assim que peguei o carro e acho que até os tinha esquecido lá dentro...
Muito legal bater de frente com a temível sra. Laurent, descalça e com roupas sujas.
- Eu...
- Não se explique. Ouvi Richard dizer.
Aaaah ... Ele falou a ela sobre o carro ... Aah meu Deus!
- Estava perdida e queria que o meu filho fosse atrás de você? - Soltou uma risada sem graça alguma.
Encolhi os ombros incerta do que ela estava querendo.
- Conheço mulheres do seu tipo... - Apertou minhas bochechas, a unha raspando na carne - Acham que podem fisgar um homem rico e se darem bem na vida!
Soltou outra risada, dessa vez soltando minhas bochechas, evitei checar se faltava um pedaço. Estava assustada demais pra isso.
- Não é isso! - Juntei coragem pra falar.
Ela gargalhou como se eu fosse a atração do circo.
- Só saiba que com o meu filho não será assim! Ou você acha que eu, Diane Laurent vou deixar que alguém como você - Fez cara de aversão ao me examinar de cima em baixo - Seduza...
- Eu não estou tentando seduzir o seu filho! Que inferno! Ele me chamou para jantar! Ele! Porque somos amigos! - Não iria contar toda a verdade, claro, nada sobre namorada de aluguel, nada sobre eu ser a luz na escuridão, ela não precisava saber dos detalhes sórdidos.
- Amigos! - Zombou - E claro que você não irá se contentar apenas com isso, aposto como logo logo vai arrumar uma barriga!
Jogar velhinhas sádicas de sacadas de hotéis seria motivo suficiente para pegar prisão perpétua?
- A senhora me respeite! E para a sua informação não sou esse tipo de pessoa não! Se acha que eu seria capaz de dar o golpe do baú ,ou qualquer outro, está terrivelmente engana...
- Então suma! Desapareça! Deixe Richard em paz! - Suas narinas se inflamaram - Trouxe comigo uma amiga da família, uma moça linda, recatada, diferente de você... Ela sim serve para o meu Richard - Provavelmente era milionária também... Me peguei pensando - Agora você... - Gargalhou - Parece até uma piada! - Do nada fechou a cara. Pelo jeito bipolaridade era um problema de família - Agora dê o fora!
Não me mexi.
Eu queria matá-la por me comparar com aquele tipo de mulher mas também queria saber se Richard disse alguma outra coisa para deixá-la tão enfurecida. E onde estava ele agora? Será que já havia saído para trabalhar? Não era possível, mais provável que ainda estivesse dormindo, ele tinha um sono pesado.
- Vim falar com o Richard - Não me preocupei em dizer Sr.Laurent e acredito que isso tenha piorando minha situação, porém eu não estava nem ai! - E não vou sair daqui até que ele mesmo diga...
- Aaaah, você vai sim! - Falou veemente.
Ela fez menção de bater a porta, coloquei o pé entre o batente e a madeira branca e minha nossa! Doeu pra cacete quando a porta quase esmagou meu pé descalço.
Empurrei a porta mais um pouco, passei pela velha sádica e entrei no apartamento, fui direto para o quarto de Richard.
Tive a decência de bater dessa vez, se eu arrombasse com certeza ele iria reclamar, e com razão.
Bati novamente já que ninguém respondeu da primeira vez.
- Mãe eu já não disse pra... - Richard começou dizendo, o que significava que ele já tinha acordado.
E então abri a porta.
Bem, felizmente( ou não) ele não estava pelado, muito pelo contrário... Quer dizer, usava apenas um short de dormir... Encontrava - se sentado na cama mas não sozinho... À sua frente uma mulher alta de corpo escultural, cabelos ruivos e rosto angelical, permanecia sentada com as pernas cruzadas, usava uma camisola branca e não parecia estar de sutiã. Assim que entrei sua cabeça automaticamente girou e aqueles olhos turquesa me encararam. Richard pareceu sem jeito, não de uma maneira brava. Nem de longe. Os olhos estavam arregalados mas acho que não devia estar surpreso com minha visita, me conhecendo um pouco, ele devia prever que eu exigiria explicações.
Mas o que eu realmente não esperava era dar de cara com aquela outra mulher .
Não foi exatamente ciúme... Tudo bem, foi mais ou menos isso, assumo.
E eu não devia ter me sentindo daquele jeito, não mesmo!
Fiquei ali na porta paralisada sem saber se ia embora ou continuava parada olhando.
A mulher - devia ser a linda e recatada- que a Dona Diane Diaba trouxera, na esperança de juntá-la com o filho. Coitada da pobre moça.
- Kimberlly... - Não sabia se o fato de Richard me chamar pelo primeiro nome (como não era de seu costume) podia ser visto como algo bom.
- Acho que não é uma boa hora... - Dei alguns passos para trás.
- Acha? - A Sra. Laurent falou logo atrás de mim.
Richard levantou da cama, passou uma camisa Polo azul pelos braços e calçou os chinelos.
- Mellanie , pode nos dar licença por favor?- Sua voz emitia autoridade.
A mulher me deu uma olhada de fera ferida e saiu do quarto, muito recatada... Até parece!.
Richard fechou a porta, se virou pra mim, porém tornou a abri - la novamente, colocando a cabeça pra fora.
- Ah! Diane, seria muito gentil se você tivesse a decência de não ouvir atrás da porta.
Não sei bem o que a sra. Laurent respondeu mas ouvi alguns resmungos vindo do corredor.
- Então... Sua noite parece ter sido divertida - Falei seca.
- Não tanto quanto está imaginando.
- Não sabe o que estou imaginando - Empinei o queixo.
E não estava nem aí se ele tinha se deitado com a linda e recatada. Não mesmo!
- Dane-se o que está imaginando, Drayton... Minha noite foi um inferno!
Acabei rindo, meu conceito de inferno era diferente.
- Até parece que foi você quem passou a noite na cadeia!
Suas sobrancelhas caíram como as de um cachorrinho abandonado, um bom ator, seu arrependimento foi tão convincente que quase me enganou.
- Drayton... - Balançou a cabeça - Sente-se, vou explicar o que houve.
Pesquei umas seis vezes seguidas.
- Quer me dar explicações?
Franziu a testa.
- É isso que veio fazer aqui, suponho.
Assenti.
- É, mas... Geralmente você tá pouco se importando em justificar seus atos.
Ele quase sorriu.
- Geralmente você não rouba carros, eu acho... - Ergueu as sobrancelhas para enfatizar sua incerteza.
- Não! não costumo fazer isso - Elevei os ombros.
Eu disse que apostaria meu rim que ele não me daria uma justificativa... Devia começar a tomar cuidado com minha conclusões precipitadas.
Ele se sentou na cama e gesticulou para que eu me ajeitasse na cadeira em frente ao computador, e assim fiz.
Virei a cadeira de rodinhas de frente pra ele.
- Eu iria passar aqui para pegar o casaco, certo? Pelo jeito o voo da Diane se adiantou... Quando cheguei ela já estava aqui com uma mala e Mellanie, ao que parece, mamãe está solteira novamente... Falei que tinha um compromisso e teria que sair e ela aprontou o maior drama dizendo que eu estava fazendo desfeita à sua visita - Revirou os olhos - Claro que seus desmaios de fingimento já não me enganam mais... Então não me importei, peguei meu casaco no quarto e sai apressado, mas essa foi a oportunidade perfeita pra ela sumir com minha chave.
Não me surpreendia vindo daquela mulher engenhosa.
- Então comecei a te telefonar para que você arrumasse um táxi ou coisa do tipo e adivinha? Você não atendeu!
Suspirei .
- Sem bateria - Falei com um sorriso amarelo.
Estendeu a mão.
- Posso ver o celular?
Arregalei os olhos ofendida.
- Está duvidando de mim!? - Comecei a me levantar, mas como quem deve não teme, entreguei o celular à ele - Pode ver, está completamente sem carga!
Pegou o celular, mas nem se quer tentou ligá-lo como achei que faria.
Ficou de pé, mal olhou para o aparelho, atravessou o quarto ainda com ele na mão e atirou da janela do quarto. Imediatamente fiquei de pé.
- Espero de verdade que tenha sido um presente do seu ex-namorado. - Não tive nem forças para tentar levar aquilo NA esportiva. Era um D E S A F O R O
- COM QUE AUTORIDADE VOCÊ FAZ ISSO!? - Atravessei o quarto até a janela onde Richard permanecia, olhei para baixo, era muito alto, nove andares... Não vi nem sinal do aparelho mas levando em conta que a piscina ficava logo ali em baixo eu fazia ideia de onde ele estava uma hora dessas... Coitadinho, havia morrido afogado.
Comecei a dar socos no peito de Richard que segurou meus pulsos, achando graça.
- Por quê. Fez. Isso!? - Perguntei tentando me soltar.
- Aquela porcaria de celular nunca funciona quando se precisa dele! Se pensar bem, te fiz um favor! - Ele parecia mesmo acreditar que tinha me feito um favor .
- Você não pode sair jogando as coisas das pessoas pela janela assim! Quem você pensa que é!? - Ainda estava presa pelos pulsos.
- Deixa disso Drayton, te pago outro depois, com uma bateria que preste.
Balancei a cabeça.
- Não Richard. Você não vai me pagar mais nada! Não quero mais nada seu, entende?
Eu não queria dar esse gostinho à mãe dele, dar a ela um motivo para continuar me chamando de golpista interesseira, não mesmo.
- Eu joguei, eu pago, e te aconselho a não reclamar.
- Eu já disse que não quero, droga! - Me soltou como se eu tivesse pegando fogo.
- O que há de errado com você? Por quê está gritando?!
Por quê ele estava insistindo!? Minha Nossa!
- Não sei... Acho que... Estou com os nervos abalados.
Consertou uma mecha de meu cabelo que estava fora do lugar, a proximidade fez meu ritmo cardíaco se acelerar.
- O que você disse de mim pra sua mãe?...
Se afastou um pouco para me avaliar com desconfiança
- Ela te falou alguma coisa? - Isso parecia intrigá-lo.
- Responda minha pergunta primeiro.
- Bem, depois dela tanto insistir em saber o que seria esse compromisso importante, falei que precisava ajudar uma amiga perdida... Depois ela pediu uma ficha completa sobre você - Sua risada era nervosa - Ela sabe que não tenho muitas amigas .
Percebi um ênfase na última palavra.
- Pensei que você fosse estar soltando fogo pelas ventas! - Fez careta - Por causa do jantar... - Expliquei
- Ah! Isso. Realmente, eu queria matar você - Não deixei de notar que o verbo "querer" estava no passado.
- O que disse para os Hoffer?
- Você tinha assuntos familiares para resolver. Will compreendeu, claro. Desejou o melhor para sua irmã.
Anui. Ele não desejara "Melhoras", e sim "O melhor". Tanto quanto eu, Will sabia que o dia devia estar próximo. Como o médico disse "Só por um milagre". Não deveria restar nem um fio de esperanças, mas era impossível não acreditar que ela fosse se recuperar.
- Como ela está? - Richard estava me surpreendendo com sua cordialidade.
- Não sei. Ontem estava péssima, não tem forças nem para abrir os olhos. Não tive notícias hoje.
- Não devia estar no hospital?- Estávamos tão próximos agora que eu podia sentir seu calor.
- Ãh... - Comecei a falar, mas seus dedos roçaram minha bochecha de leve e perdi a linha de raciocínio. A gente sempre começava assim, depois vinha o beijo e então os pedidos de desculpa e o constrangimento.
Eu devia estar à caminho do hospital naquela hora, devia estar com minha mãe tentando acalmar seu desespero, dizendo que Cibelly iria sair dessa. O fato de eu não estar lá agora tornava todo o meu sacrifício em vão.
Pensar em minha irmã estava me deixando deprimida e nostálgica, queria que alguém me abraçasse e dissesse que ficaria tudo bem, queria alguém que me alegrasse e me desse forças para enfrentar tudo aquilo e eu sabia que era um erro pensar que Richard pudesse ser essa pessoa, mas eu não me importava.
Em menos de uma semana eu fiz mais idiotices do que se pode contar e todas elas tinham relação com a minha irmã, e na maioria Richard estava comigo, mesmo que me provocando, ou eu a ele. Aquele morde e assopra era a única coisa que fazia com que meus problemas parecessem estar longe. Acabava me esquecendo de tudo quando estava com ele, e isso era um erro!
A iniciativa foi minha. Puxei seus cabelos com tanta força que segundos antes de sua boca se colar à minha ele soltou um gemido, estávamos mais famintos do que nunca, seu beijo machucava meus lábios tamanha era a urgência, mas também não me importei com isso, eu só queria que o momento durasse pra sempre, que fosse possível guardá-lo em um pote para revivê-lo sempre que tivesse vontade, queria continuar a sentir as borboletas no estômago da maneira que só Richard me fazia sentir. O beijo durou somente uns poucos segundos até que alguém entrasse no quarto, sem bater...
Involuntariamente empurrei Richard para longe, como fizera da última vez, só que naquele momento o motivo para tal ato foi outro. Parada na porta a sra. Laurent me fuzilava com os olhos. Se ela fosse capaz de emitir raios lasers eu estaria mortinha.
- Por quê todos insistem em entrar sem bater!? - Richard estava mesmo bravo, pois a veia de sua testa saltou avermelhada.
- Por quê você insiste em me dar desgosto!? - Rebateu a mãe.
E lá vamos nós outra vez...




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