3¡❄

108 44 76
                                    

Não quis parecer surpreso e, mesmo que a garota não pudesse ver sua reação, Gyujin segurou-se para não arregalar os olhos e dizer que sentia muito; não tinha de sentir, porque nunca passara por esse tipo de situação e isso seria algo que iria parecer rude demais. Afinal, o garoto possuía uma personalidade gentil.

Eunjin foi pega de surpresa. Claro que não era difícil identificar uma cega tola como ela, mas Gyujin parecia tão confortável e ciente de sua condição que a pergunta pareceu mais idiota do que ela. Mas mesmo assim continuou.

— Não me diga que...

— Não vou — Gyujin pareceu tirar as palavras da boca de Eunjin. — Não posso dizer que sinto muito, ainda mais quando nunca passei por isso pra saber.

— Eu não era cega — encolheu-se na cadeira e ajeitou o cachecol amarelo no pescoço. As pernas estavam cruzadas na cadeira e suas botas marrom estavam combinando. Eunjin tinha uma aparência adorável e infantil. Dessa vez Gyujin teve outros motivos para encará-la.

Ele fez o mesmo, inclinou a cadeira um pouco mais pra frente e conferiu a maquina trabalhando em suas roupas para depois voltar a atenção para o que Eunjin dizia.

Gyujin tinha o pensamento pouco diferente de Eunjin. Seria muito estranho para um garoto tímido como ele sair contando a um estranho seus planos para a noite, mas Eunjin parecia tão triste e desconfortável que falar foi a única coisa que viu como refúgio. Foi quase como se soubesse que deveria falar algo. Saber que talvez pudesse mudar seu humor seria um alívio. Era o que ele achava. Mas a verdade era que lá no fundo, bem no fundo, onde a nevasca não conseguia cortar, Gyujin fora tomado pela magia do natal quando botou os pés ali e as luzes piscantes não tiveram como alertá-lo que lá dentro jazia um coração doente e nada piscante.

— Eu tinha 13 anos — Eunjin respirou fundo e foi como se tivesse tomado o ar do garoto, porém isso parecia muito paranóico. — Era natal. Estava na casa da minha tia com meus pais e primos. Quis brincar de trenó. Mas eu não tinha um. Então eu peguei um pedaço de madeira da carpintaria do vovô. Subi na colina com o pedaço de madeira e escorreguei de lá no amontoado de neve. Perdi o controle e bati em uma árvore. Eu poderia ter desviado, mas eu fiquei com tanto medo que fechei os olhos ao perceber que iria colidir em algo. O que me faz muito triste mesmo é que eu só sei que foi uma árvore porque me disseram.

Cegueira pós-trauma — sussurrou alto o suficiente para que Eunjin escutasse e oferecesse um sorriso triste.

— Ah, me desculpe — a garota bateu na própria testa ao perceber que estava falando demais. — Talvez suas roupas já estejam limpas para você as colocar na secadora.

Perdera a concentração do que acontecia ao redor assim que Eunjin começou a contar do acidente e, por incrível que pareça, sentiu-se envolvido com tudo aqui e foi quase como se pudesse sentir o impacto do ocorrido. Quis confortar Eunjin, mas a menina parecia encolhida demais para que ele a tocasse.

— Como sabe disso?

— O barulho — disse, simplista. — A máquina acabou a lavagem. Meus ouvidos são mais sensíveis agora.

— Isso é ótimo — admitiu, querendo confortar Eunjin ou ao menos tentar distraí-la da nostalgia ruim. — Veja bem, eu não havia percebido.

— Talvez tenha razão — Eunjin esboçara um pequeno sorriso, mas isso foi suficiente para que Gyujin sorrise junto e levantasse para trocar as roupas de máquina.

Enquanto colocava as roupas na secadora, permitiu-se refletir. Eunjin permanecia sentada em sua cadeira, firme, sem mover um músculo sequer e o garoto sentia-se desconfortável agora que sabia do motivo. Talvez não precisasse fazer algo sobre isso e nem ao menos pensar, mas saber que Eunjin havia confiado suas dores a si, obrigou sua mente a responder de alguma forma.

Ligou a máquina e encostou na mesma, enterrado as mãos nos bolsos e encarando as paredes de vidro.

A nevasca havia diminuído e agora os flocos caíam do céu graciosamente. Gyujin não iria mentir; amava o natal demais para que pudesse concordar com Eunjin por conta de sua condição. Saber que a data remetia memórias ruins a alguém o fez querer gritar e acabar com isso o mais rápido possível. Não que não compreendesse Eunjin, mas o natal era bom demais para causar dores.

Respirou fundo e observou Eunjin dali, cabisbaixa, distante, inalcançável. Tinha conhecido-a naquela noite, mas tudo já parecia tão triste, porque era triste. Com isso, algo iluminou sua mente de que nem todas as épocas do ano eram felizes para os outros como era para si. Tinha de parar de ser egoísta em respeito a isso.

Caminhou cuidadosamente em direção à Eunjin e voltou a sentar-se ao seu lado.

— É por isso que está aqui? Sozinha?

— Talvez — suspirou.

— Já pensou na possibilidade de haver outra solução?

— O que você tem a dizer? — O tom brincalhão de Eunjin apareceu pela primeira vez na noite e Gyujin permitiu-se sorrir.

— Não sei — balançou as pernas em ansiedade. — Talvez seja legal levá-la para Pohang. A vovó faz uma comida muito boa.

Gyujin estava brincando, mas Eunjin soltou uma risada fraca, relaxando mais o corpo naquela cadeira. Apesar de não gostar do natal, desejou que Gyujin se divertisse e tivesse um dia repleto de coisas boas com o que a nevasca tinha a lhe oferecer.

Tudo continuava muito piscante, triste e distante naquela noite. Afinal, eram dois estranhos, uma lavandeira e uma véspera de natal.

Talvez o natal fosse mágico mesmo. E duas almas estavam prestes a presenciar um milagre.

ㅡ love before the first sight. up10tion + dia ! a christmas gift.Hikayelerin yaşadığı yer. Şimdi keşfedin