Marta se endireitou na cadeira e sorriu para Asia:

- Como disse, tivemos vários nomes, em diferentes regiões do planeta, mas o nome que ficou foi Nemtsi, o nome que os Selvagens nos deram. Vem do eslavo, é o equivalente aos Bárbaros, para os Gregos e Romanos; povos que falam língua estrangeira. Eles só nos chamavam assim e esse foi o nome que acabou nos identificando, nos separando dos Selvagens. Somos rápidos, ágeis, intuitivos e alguns dos nossos possuem habilidades mais pronunciadas. Vladímir acredita que, com concentração e treino, conseguiríamos fazer o que "ele" faz. Eu não acredito muito nisso. Vladímir é muito diferente de nós! Enfim, também temos uma vida mais longa e envelhecemos mais lentamente que os humanos. Infelizmente, anos acumulados não representam necessariamente maturidade - comentou Marta ao ouvir os irmãos entrarem ruidosamente pela porta da frente.

- Olá! Bom dia, Johanna! Está melhor?

- O que vocês fazem aqui? Não deveriam estar com Vladímir? - disse Marta, deixando transparecer certa impaciência.

- Ele já está subindo - respondeu o mais alto sem olhar para Marta e sorrindo para Asia.

- Então, aguardem na sala, estou conversando com ela.

- Está bem, está bem. Você anda com muito mau humor, Marta! - os dois saíram do quarto.

- Como eu ia dizendo... Durante o início da Idade Média, éramos tribos isoladas que compartilhavam crenças em comum. Na época, nossa única unidade eram os acordos feitos entre nossas antigas famílias, que se comprometiam a ajudar umas às outras diante de um inimigo, mas ainda não éramos muito organizados. Aos poucos, e depois de muitos conflitos, fomos nos constituindo em uma sociedade. Dispersa, mas com uma unidade de governo, composta por membros das famílias mais antigas. Os acordos nos uniram em um único povo, separados dos Selvagens. Seguimos assim... Unidos sobrevivemos melhor.

Marta já havia encerrado sua narrativa quando ouviu os passos de Vladímir atravessando a sala. Ele entrou no quarto, olhou fixamente para Asia e perguntou de maneira gentil:

- Sente-se melhor, Johanna? Sua mãe correu muitos riscos vivendo sozinha com você, aqui, no meio de humanos. Você poderia ter ficado sem ajuda.

- Minha mãe confiava que Yeda me ajudaria. Ela ajudou a família de Yeda na Guerra - chamava a atenção de Asia, a aparência de Vladímir. Ele parecia ter uma postura diferente das outras pessoas, movia-se de maneira diversa, como um líder diante da certeza de suas decisões sem, contudo, deixar de demonstrar o que, para Asia, era paternalismo absolutista.

- Eu sei, eu sei. Muito louvável, mas imprudente, já que a Sra. Klein morreu. Por sorte, os outros a estavam vigiando.

- Acho que ela estava contando com isso também - respondeu Asia de maneira um tanto desafiadora, provocada em resposta à autoridade que ele impunha e ela rejeitava.

- Seu pai era humano? - perguntou ele.

Esta pergunta desmontou a postura segura que Asia havia edificado diante dele, e aturdida respondeu:

- Não...! Quer dizer, não sei...

Asia nunca havia pensado nessa possibilidade. Aliás, ela nunca havia pensado nisso. Mas com expressão confusa, olhando para o chão, começou a pensar: "Será possível? Mamãe sempre falou de nós duas, nunca de papai!".

- Isso é possível? - perguntou, erguendo os olhos para Vladímir.

- Vocês conviviam muito com humanos, pode ser. Nossas mulheres podem ter filhos com humanos, é raro..., mas é possível - Vladímir respondeu à pergunta de Asia e a observava de maneira questionadora.

Nemtsi e Selvagens - As almas cativasOnde as histórias ganham vida. Descobre agora