Capítulo 2

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Aquele sorriso ficou gravado na mente de Lena como uma foto em um negativo. Ela não conseguia desviar o olhar. O amigo também a olhou, fazendo uma análise geral dela. Respondeu alguma coisa ao outro e continuaram a conversa entre eles.

Lena se sentiu decepcionada. Quer dizer que ela não era boa o suficiente pra ele? Ela era boa até demais. Deu as costas e continuou​ rebolando com as amigas. Apesar de tentar ignorar o tal garoto tatuado, a cada minuto seus olhos procuravam por ele, o que a incomodava, afinal, se quisesse mesmo, poderia ir até ele e dar o primeiro passo. Mas alguma coisa a impedia, uma timidez que não era comum pra ela.

Maria avisou que ia ao banheiro e todas foram com ela, as amigas não abandonavam umas às outras na multidão. Acabaram encontrando um camelô com um preço bom e ficaram por perto. E, seguindo o cronograma, seguiram para o próximo bloco no final da tarde. Lena quase se esqueceu do garoto, mas seu sorriso voltava a todo momento. Naquele dia especialmente ela não se interessou por nenhum outro, parecia que nenhum deles se destacou como o turista presunçoso.

A noite ia descendo na cidade e o calor não dava trégua. A cidade ainda fervilhante de blocos estava muito iluminada. Às dez, Lena e as amigas voltavam pras ruas para a próxima folia depois de tomarem banho e trocarem as fantasias na casa da prima da Maria, que ficava mais perto, na Lapa. Bairro esse, que em fins de semana normais já era cheio, no carnaval, então, parecia um caldeirão de gente. Além das atrações carnavalescas e dos bares ecléticos de sempre, havia até uma trupe se apresentando na praça dos arcos, muitas pessoas em volta se divertindo com o show improvisado.

As meninas iam a uma festa com tema de carnaval. Era uma dessas que pipocam pela Lapa aos montes, nem precisam de pretexto, mas o carnaval é um tema bom demais pra deixar passar. Com o nome na porta, as meninas entraram sem esperar na fila que percorria a calçada até o final na rua. Entraram no lugar iluminado por cores diferentes acompanhando a música​.

Depois de tomar o primeiro drink, Lena se sentia ainda mais alegre do que o normal. Estar na companhia das amigas em um lugar agitado dava energia pra ela. Deram uma volta pelo lugar, já bastante cheio apesar de cedo. O DJ tocava funk e elas não resistiam à batida. Ao som de "Olha a Explosão" as meninas fizeram jus à música. Jogando os cabelos e descendo até o chão, Lena jogava charme para os garotos em volta, mas só queria mesmo se divertir. Ainda não tinha achado alguém que superasse o sorriso do cara tatuado de mais cedo.

Quase podia ver ele ali, com a covinha na bochecha aparecendo quando dava um meio sorriso, um copo na mão e a atitude de quem sabe que é gostoso. Só que a imagem dele agora era distorcida pelas luzes da festa, a pele mudava de cor. Verde, azul, rosa. Espera, não era imaginação. Era ele mesmo. Lena apertou os olhos embaçados pela bebida e confusos com as luzes. Lá estava o turista esnobe com seus amigos.

Lena não conseguia acreditar naquela coincidência. Sem parar de dançar, comentou com Tata sobre o garoto. Claro que elas já tinham trocado ideias sobre os​ caras dos blocos e todas já odiavam o tatuado esnobe naquele momento. A amiga de Lena se virou pra ver o tal menino com os olhos cerrados em sinal de desaprovação antecipada. Depois olhou de volta para a amiga e disse "nossa, ele é muito gato, não sei se vou conseguir odiar ele". Lena riu da piada e continuou a dança.

Não tinha certeza se ele a tinha visto e ficou dividida entre se fazer ver pra mostrar o que ele perdeu ou passar despercebida e evitar se humilhar sem querer. Decidiu pela segunda opção. Porém mais uma vez seu olhar tinha vida própria. Ela girava, subia e descia, ia e voltava, mas nunca o perdia de vista. Por mais que tivesse tomado uma decisão, estavam muito perto um do outro e foi inevitável que ele a visse. Mas ela agiu como se não soubesse da existência dele. Para evitar continuar encarando o cara, ela foi até o bar buscar outra bebida.

Já estava suada, o ar condicionado não era suficiente pra conter o calor do verão em um espaço com tantas pessoas dançando. Lena se abanava na fila esperando sua vez de pedir, assoprava os peitos e tirava o cabelo da nuca. Finalmente chegou sua vez, ela pediu duas caipirinhas para dividir com as outras e esperou mais um pouco. Encostada no bar, ela deu uma olhada no ambiente. Muitas pessoas fantasiadas, inclusive ela, que, dessa vez, era o I de MIGA, era pra ser uma boa referência, mas agora ela não tinha tanta certeza. Ela pensava "olha aquela fantasia maravilhosa, aquele teve bom gosto, mas o amigo...", mas perdeu o fio do pensamento quando viu que o garoto tatuado vinha na direção do bar com outro amigo.
O bartender ainda não tinha preparado as caipirinhas e ela não podia fugir dali. Eles entraram na fila e conversavam aos gritos por causa do som. Ele a viu, ela tinha certeza, porque o mesmo sorrisinho brotou na boca dele. Só que dessa vez ele não desviou o olhar, parecia tentar descobrir se já tinha visto ela antes.

Ela manteve o olhar enquanto durou o dele. Seu coração batucava e ela perdeu a visão periférica, só via ele. Finalmente ele desviou o olhar para gritar no ouvido do amigo. Lena achava que mais uma vez ele a esnobava, mas em seguida ele saiu da fila e caminhou até ela. Definitivamente a música tinha parado porque ela não conseguia ouvir nada. Só o sangue bombeando no ouvido. E de repente havia um som.
- Oi.

Gamer - amor em jogoWhere stories live. Discover now