Capítulo 1 - Todos Possuem Fissuras

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Capítulo Introdutório


Thomas Brent virou à esquerda, seguindo a placa que informava a direção dos sanitários. Saindo de sua ronda habitual, o homem de meia idade atravessava os corredores da empresa com pressa. Embora vestindo sua farda e em presente serviço, ele não parecia estar em estado pleno. Das raízes de seus cabelos grisalhos escorriam gotas de suor e o olhar caído denotava cansaço e preocupação.

Ele estava confuso, após anos como guarda noturno, aquela era a primeira vez que sentia-se de tal modo no trabalho: agitado, apreensivo, estressado. E o pior, era que não parecia ter motivos para isso, sua saúde física estava bem nos últimos dias e não havia nada de anormal ou estressante em seu serviço habitual.

Frequentemente ele espiava por cima dos ombros, com quase certeza de que alguém o observa de perto, mas seus olhos encontravam somente os arredores vazios. Àquela altura da madrugada, a maioria dos trabalhadores já havia partido, restando somente sua equipe de segurança noturna e alguns funcionários de limpeza.

Por ser um dos principais pontos de controle e proteção do país, o prédio mantinha-se seguro e fortificado mesmo durante a noite. Era praticamente impossível um intruso conseguir acesso àquela área, pelo menos não até que todos os alarmes soassem estrondosamente. Brent sabia bem disso, afinal, era o principal responsável pela segurança daquele turno. Ainda assim, o sentimento de perseguição continuava, e parecia aumentar a cada instante.

Ele seguiu seu caminho rapidamente, repetindo-se que não havia nada para se preocupar, ainda assim, seus olhos se moviam acelerados, atentos a qualquer ruído que pudesse justificar a causa daquele terror.

Os corredores ao longe permaneciam mergulhados em penumbra, trazendo uma sensação opressora e desconfortável para seu subconsciente. O coração começou a bater ainda mais forte, a respiração lentamente se tornava mais difícil. "Preciso me acalmar" pensou. "Não há nada de errado aqui." Ele tentava racionalizar, mas sua atenção não saia do cenário em volta.

Então, no meio do caminhar, ele de repente parou.

Seus olhos identificaram uma imagem destoante no cenário. O que era aquilo parado no final do corredor? Parecia uma sombra, ou um borrão quase indistinguível que jazia inerte em um local que não deveria haver nada. Inicialmente cético, Brent apertou os olhos e a imagem lentamente foi se tornando mais clara. Com somente metade revelada pelo canto do corredor, aquilo parecia ter uma forma humanoide, com dedos finos que seguravam a quina da parede e uma silhueta comum, com um braço, uma perna e uma cabeça, que o homem enfim reparou, parecia coberta por um véu negro. Sua espinha gelou instintivamente.

Inicialmente ele tentou se convencer de ser outro segurança observando-o ou mesmo uma funcionária perdida, mas algo ali pareceu complementarmente irreal. O homem sentia claramente que aquela mancha negra o encarava com minúsculos quatro olhos brilhantes, espreitando-o silenciosamente da escuridão.

— Boa noite, senhor. ― A voz despreocupada que surgiu surpreendentemente próxima fez o guarda veterano se sobressaltar. — Está tudo bem? — Era o faxineiro Herbert, que agora franzia o cenho para o estado do homem à sua frente.

Visivelmente assustado, Brent encarou o velho faxineiro e voltou a olhar para o que lhe amedrontava antes, mas não havia mais nada lá. O local permanecia vazio, como sempre estivera.

— S-sim... Não se preocupe. — Ainda com o corpo tenso, o guarda forçou-se a falar. Certamente havia algo de errado com ele naquela noite.

— Tem certeza? O senhor está meio pálido. — O idoso ainda o analisava, preocupado. Embora novo no emprego, o funcionário sentia já conhecer o chefe de segurança o suficiente para saber que ele não estava em boas condições naquele momento.

Vultress: A Salteadora de Fissuras [Arco I: Rapina]Where stories live. Discover now