Capítulo 10

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          — Éramos dois jovens completamente apaixonados. Ignorávamos aquilo que sabíamos que aconteceria. Nós nos apegamos a uma esperança sem sentido. A tal ilusão do amor que pode transformar pessoas de fato transforma, porém apenas a quem está sentindo e compartilhando do sentimento. O pai dela não estava. Meu segundo prêmio não significava absolutamente nada, eu não era digno de desfrutar daquele amor. Caroline foi mandada para longe. Colégio interno. Devia ter sido o fim para nós. Trocávamos cartas. Não nos tocávamos, mas não deixamos de estar juntos por um único dia...

Maria escutava atenta as palavras que jorravam daquele gravador de segunda mão. Voltava em sua mente o rosto daquele homem ao narrar essa parte. A dor era tamanha que jurava poder senti-la. Era inegável, depois dos acontecimentos desses últimos dias, que Maria havia criado empatia por Silencioso. Já não merecia o tal apelido, havia se transformado apenas em Ethan, sem a formalidade do Sr. Lewis e muito menos um mero número.

Desejava chegar logo em casa e poder compartilhar todas as descobertas feitas com Diego. Sua ansiedade era tanta que nem se lembrou de tirar o celular do modo avião. Pisava fundo no acelerador do carro alugado. Estava chegando e o gravador repetia o que ouviu dentro daquela sala intimidadora e impessoal.

— Foquei ainda mais nos meus treinos. Para essa competição tinha meu pai como treinador exclusivo, era só meu e de mais ninguém e cada centavo ganho nós guardávamos. O sonho dele estava cada vez mais próximo, enquanto que parte do meu ia embora. Sabe, Srta. Santiago, pode parecer tolice, mas eu estava apaixonado por aquela garota e sabia que a minha felicidade dependia de estar com ela. Foi o meu melhor desempenho aquele ano. Ganhei patrocínio, fiz comerciais, apareci em programas de televisão, fazia tudo que me desse dinheiro. Muitas vezes fui acusado de ter me vendido pelos outros peões, mas não dava a mínima para isso. Meu objetivo era esse: conseguir dinheiro e comprar uma propriedade para que meu pai não tivesse que trabalhar para mais ninguém.

Só pelo tom de voz usado nesse trecho conseguia sentir a amargura e o ressentimento. Definitivamente a vida daquele homem não foi nada fácil de suportar, e mesmo assim lutava bravamente. Então, onde havia se perdido? O que aconteceu? Estava mesmo acreditando nas histórias que lhe foram contadas de que ele seria incapaz de ter matado aquela moça. Será? A certeza havia sido corrompida. Maria ansiava por verdades e ele parou de falar, e entendia o motivo: o garoto.

— Diego, você precisa escutar isso! — Maria olhou seu reflexo no retrovisor ao dizer aquelas palavras e mais à frente visualizou a placa, indicando que estava muito próxima do seu destino.

O gravador continuava a emitir aquela voz calma, porém embargada de emoção:

— Consegui. Ganhei todas as competições e pelo terceiro ano seguido eu era o campeão internacional de rodeios. Caroline fugiu do colégio e foi me ver. Tivemos nossa comemoração, uma noite que jamais esquecerei. No dia seguinte o pai dela buscou-a. Feriram-me. Fui hospitalizado. Mas ela estava bem e isso me acalmou. Meu pai pediu, aliás, implorou que deixasse a garota. Havia medo naqueles olhos. Nunca vi meu pai ter medo. Enviei uma carta terminando com ela. Nunca mais escrevi nenhuma carta depois daquilo. Então, três meses depois, estávamos eu e meu pai nos acostumando com a ideia de sermos nossos próprios donos. Com o dinheiro, comprei uma fazenda de cavalos. Nenhum animal memorável, mas já era um começo. Arrumamos o casebre de madeira. Eu disfarçava minha tristeza com o trabalho e ele fingia que não via que ela me fazia falta. Então, ele estacionou seu carro chique naquele terreno empoeirado. Ela saiu. De cabeça baixa. Caroline nunca agiu daquela forma. Meu coração apertou. Não conseguia me mexer, coube a meu pai tomar a dianteira. Sr. Anderson dizia algumas palavras, mas eu só prestava atenção em Caroline naquela postura e aquilo me incomodava. Ignorei tudo e a abracei. E então ela me disse nos meus ouvidos que estava grávida.

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