Capítulo 4

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— O dia estava quente e sufocante como todos os dias de verão, porém acredito que o fato da minha respiração estar cortada era porque meu pai chorava sem cessar na minha frente, e eu ali, com apenas cinco anos de idade, não conseguia entender o motivo daquele choro. Apenas sentia a falta da minha mãe.

Silencioso dizia, após uma longa espera, não apenas aquela que durou do seu almoço até o momento em que Maria chegara. Essa espera tinha muito mais tempo, de antes do período que passou dentro daqueles muros revestidos de arames cheios de garras. Falar sobre a perda de sua mãe era algo difícil, Caroline foi a única pessoa de seu convívio que sabia. E agora Maria estava compartilhando do mesmo sentimento.

Ethan sempre foi um homem emotivo, de riso e choro fáceis. Seu pai não mudou isso no garoto que ficou aos seus cuidados. De certa forma, era como preservar vivo em sua memória algo da esposa. À medida que o rapazinho ligeiro e curioso ia crescendo, as semelhanças com ela ficavam mais evidentes. E assim foi, apenas os dois sozinhos nesse mundo andarilho. Nunca fincaram raízes. Seu pai tinha que ir aonde o trabalho mandava. Por conta disso, Ethan teve de desenvolver simpatia, característica herdada de seu pai, o grande domador de cavalos Lewis. Maria logo saberia mais sobre ele. E pelo que ouviria de Silencioso, também teria gostado daquele homem.

Assim que deixaram a redação e seguiram rumo às grandes muralhas de concreto que ficavam praticamente no meio do deserto, Diego e Maria fizeram uma pausa nesses restaurantes de beira de estrada. Daqueles bem inóspitos, repletos de personagens saídos de filmes sobre bandidos lado B. Mais pareciam caricaturas do que pessoas propriamente ditas. Maria queria dar o fora dali. Diego precisava comer. O rapaz já estava mais acostumado com essa diversidade. Seu pai tinha uma construtora e, dessa forma, cresceu entre os "peões de obra" que na sua grande maioria são compostos por imigrantes ilegais e suas bagagens de vida nada agradáveis.

— Maria! Você tem que comer alguma coisa — sua voz vinha em um tom que Maria não gostava de ouvir. Foram poucas as vezes que escutou esse timbre um pouco mais elevado e rude sair da boca de Diego. — Seu café da manhã quase não foi mexido, pensa que não vi?

— Estou muito nervosa para sentir fome.

— Se você não comer vai passar mal e, pior, pode desmaiar. Imagina que legal seria se a mocinha desmaiasse na cela sozinha com aquele homem. — Diego arqueava suas sobrancelhas grossas provocando a teimosia de Maria.

— Está bem! Vou comer esse sanduíche sei lá do quê. — Olhou para seu prato e aquele pedaço de pão recheado com carne não lhe era nada animador.

— Na volta te levo em um restaurante decente. Eu prometo e, olha, isso aqui não está tão ruim. — Diego dá uma mordida grande em seu sanduíche, sorrindo.

— Di, você comeria até pedra se te dessem. — Maria lhe mostrou a língua e mordeu aquele troço duvidoso. No final acabou até gostando.

Agora, frente a frente com Silencioso, sentia o gosto daquele pão engordurado subir do seu estômago para o esôfago e alcançar de novo a sua língua. Por que diabos aquele homem mexia tanto com ela? Talvez porque fosse o diabo.

Chegaram até o estacionamento às três horas da tarde em ponto. Diego dessa vez acompanhou a namorada até o hall em que os visitantes esperavam. Vazio. Não era um dia de visitas, a sua era uma das exceções que se aplicam àqueles que estão nos seus últimos dias. O oficial que a recepcionou era o que poderíamos dizer que estava "de mal com a vida". Diego revirou os olhos para Maria e esta lhe devolveu um olhar quase o fulminando. Sorrindo, Diego se acomodou em um dos acentos e ficou atento à transmissão do noticiário que passava na televisão pregada no teto.

Últimos Dias [COMPLETO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora