Capítulo II - Território delas

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Quarta-feira, às 9 horas da noite, região da República — ou "Cidade Velha", como eu gosto de chamar tal área da capital paulista. Lá estava eu, exausto após um longo dia de trabalho, carregando minha mochila e andando em passos rápidos para fugir da chuva. De vez em quando, sendo o mais discreto possível, tirava o celular do bolso para olhar o Google Maps. Estava indo para a Alameda Barão de Limeira, número 134. O famoso Edifício Itatiaia. Para quem o vê por fora, parece ser um apartamento convencional — por dentro, porém, a história é bem diferente. Trata-se de um dos prostíbulos mais antigos e famosos de São Paulo, no qual dezenas ou centenas de mulheres oferecem seus corpos por preços acessíveis.

Originalmente projetado para fins residenciais, o Edifício Itatiaia é usado como ponto de prostituição há mais de 25 anos. É um dos locais mais famosos nas redondezas para quem quer fazer sexo sem gastar muito. Aliás, toda a região da República é particularmente interessante para quem procura uma foda econômica: a quantidade de pulgueiros por ali é enorme, tal como o número de cinemas que exibem filmes pornográficos.

A dinâmica é simples: geralmente, os "iniciados" entram, sobem pelo elevador até o último andar e vão descendo o complexo pela escada espiral, enquanto são convidados pelas próprias prostitutas a fazer um programa nos quartos minúsculos. Resolvi tomar uma atitude diferente. Após deixar minha mochila com a "recepção" — cobra-se uma taxa de R$ 2 para guardá-la ali —, comecei a subir os andares a pé. Não sei se foi culpa do horário, mas o local estava relativamente vazio. Cada andar suporta dois quartos, e vez ou outra eu cruzava com homens deixando o prédio de cabeça baixa, visivelmente envergonhados. Um deles até me deu um tapinha nas costas ao passar por mim.

O local era bem diferente do que eu imaginei. Um prédio comum — bastante sujo e com instalações precárias, mas nada de muito diferente. Subi até o décimo andar e comecei a retornar após ser barrado por um velho que varria o chão. No quinto piso, uma mulher em seus 40 anos puxou meu braço. Seus cabelos loiros eram levemente cacheados e sua roupa se resumia a um vestido preto curtíssimo, com um decote generoso. Dei um sorriso torto e, por curiosidade, perguntei quanto era. "Fica trinta reais", disse ela. Recusei. "Posso fazer por quinze", insistiu, piscando. Não, obrigado, continuei descendo.

Estava prestes a desistir e voltar outro dia. Porém, ao passar pelo segundo andar, reparei em uma bela jovem encostada na porta de um dos quartos. Pele morena, cabelos longos, olhos bonitos. Estava usando somente um sutiã azul e uma saia branca. Perguntei se ela estava atendendo e ela confirmou que sim, também cobrando trinta reais por um programa de quinze minutos. Perguntei "Bora?", e ela acenou para que eu entrasse.

Foi só então que percebi que, na verdade, os quartos do prostíbulo (ou ao menos aqueles que vi abertos) funcionam como boates em miniatura. São equipados com aparelhos de som, cadeiras, um balcão e muita cerveja. Alguns homens ficam por ali mesmo, bebendo, conversando, ouvindo música e apreciando as moças que desfilam para lá e para cá com trajes minúsculos — às vezes, com os seios à mostra.

No fundo, encontram-se os cubículos nos quais os programas são realizados: quartos improvisados e separados por finas paredes de MDF. Acompanhei a jovem para um desses dormitórios. Eles têm espaço suficiente para abrigar uma cama, uma lata de lixo e um corredor que cabe somente duas pessoas por vez. Nada mais. Me sentei no colchão desconfortável e comecei a tirar os sapatos, enquanto minha escolhida foi buscar mais um rolo de papel higiênico. "Me chamo Ariane", disse ela, quando questionada. Tinha 22 anos, apenas um ano a mais do que eu.

Pegou no meu pau para chupá-lo e comentou sobre o tamanho. "Meu Deus, de onde saiu tudo isso? Não vai judiar de mim não, né? Senão não trabalho amanhã", disse. Dei uma risada e fiquei na dúvida se ela realmente considerou grande ou se era o clássico papo de puta. Fez um boquete bom durante alguns segundos e perguntou que posição eu queria. Resolvi ir por cima. Ariane gemia de forma mecânica, embora uma vez ou outra tenha dado uns gritos bastante convincentes e que talvez tenham sido reais.

A principal dificuldade em se divertir nesse tipo de lugar, para mim, é "finalizar seu trabalho" em tão pouco tempo. Não há espaço para rodeios, preliminares ou algo do tipo: você simplesmente vai lá e faz o que tem que fazer. Também é preciso ignorar a música alta no recinto, os gemidos do cubículo ao lado e a cafetina gritando o nome de sua acompanhante de cinco em cinco minutos. "Já tô indo", respondeu ela, pouco antes de eu atingir o orgasmo.

Mesmo com a pressão de seus chefes, Ariane ainda teve tempo de bater um papo comigo. Perguntou se eu ia para casa, onde eu morava e se era a primeira vez que eu tinha ido ali. Eu tentava responder da melhor forma possível, enquanto tentava me vestir com pressa no minúsculo espaço que eu tinha para me mexer. Também não queria deixar nada para trás – celular, carteira ou meu isqueiro Zippo de estimação.

Ao descobrir que eu estava ali para coletar material jornalístico sobre exploração sexual, a jovem se mostrou bastante interessada. "Então você veio aqui a trabalho", zombou. "Sabe, eu tenho uma coisa para te falar sobre prostituição: a crise anda afetando todo mundo, até a gente! Algumas pessoas pensam que as mulheres daqui não têm perspectiva de vida, e que deve ser horrível trabalhar num lugar desses, mas não é bem assim", comentou. "Já cheguei a fazer programas por cem, duzentos, trezentos e até mil reais por hora, quando eu trabalhava por conta própria e era bem magrinha", revela. "Mas agora é difícil, nenhum homem quer pagar tanto dinheiro por sexo. Então a gente vem para cá, que, de certa forma, é até melhor. Só fazemos oral com camisinha, não precisamos beijar na boca, tem mulher que controla as posições, e de pouco em pouco a gente faz até quinhentos reais por dia".

Após me limpar com o papel higiênico e me vestir da melhor forma possível, tive que me despedir de Ariane, que já estava sendo requisitada por outro cliente. Aqui não há tempo para banho ou coisa do tipo – tudo se resume a se limpar com umas folhinhas de papel. "Quando seu livro for publicado, eu com certeza vou comprar", disse ela. Antes mesmo que eu pudesse sair do andar, pude ver ela entrando no mesmo cubículo com outro cliente. Mais quinze minutos. Quem já assistiu ao clássico Sin City (ou leu as histórias em quadrinhos de Frank Miller) com certeza deve se lembrar de Old Town, uma zona de prostituição onde a lei não alcança e na qual as próprias mulheres governam de sua maneira.

Entrar em um bordel vertical como o Edifício Itatiaia é a experiência mais próxima que você pode ter de perambular por esse bairro fictício. Embora seja um prédio dedicado à putaria, é interessante perceber que há um clima de mínimo respeito mútuo entre as profissionais e os frequentadores do prostíbulo. Aquela é a casa delas, o ponto comercial delas, e elas fazem o que elas querem fazer pelo preço que acham justo. A casa das primas não é a casa da mãe Joana.

No ar, junto com o odor de sêmen e álcool, paira uma sensação de autoridade, e não de desordem ou algazarra. As moças estão ali para trabalhar, e os homens estão ali para se divertir. São pessoas comuns, assalariados, de diversas classes sociais, que praticamente formam um clube secreto que se reúne com um único propósito em mente: ter uma boa companhia durante alguns minutos.

Ficha devolvida, mochila nas costas, passo pelo portão do Itatiaia e já não me sinto tão envergonhado com os olhares que me observam saindo do prostíbulo. Oras, todo mundo faz sexo – alguns pagam, outros não. E, como um velho amigo meu já gostava de dizer, "sexo pago, às vezes, sai mais barato".  


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Ramon de Souza tem 22 anos, já participou de seis antologias literárias, publicou um livro solo ("Rato Urbano", Ed.Multifoco, 2014), publicará mais um em 2016 ("Meus preciosos contos tristes", Ed. Multifoco) e venceu um prêmio de jornalismo latino-americano. 

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