CAPÍTULO 10

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"Eles dizem que o mundo foi construído para dois
Só vale a pena viver se alguém estiver amando você (...)"

Video Games, Lana Del Rey


Enquanto o sol de segunda-feira brilha no azul imensurável do céu porto-alegrense, eu enfrento uma devastadora e fria tempestade mental.

Sentado debaixo de uma sombra qualquer, de uma árvore qualquer no meio do Parque Farroupilha quase deserto, observo algumas pessoas que passam pelo meu campo de visão, por exemplo, uma mulher loira com fones de ouvido fazendo uma caminhada rápida e silenciosa.

Perguntei-me o que se passa em sua cabeça, de onde veio, qual era sua profissão. A julgar pela aparência, diria que era médica, pois tinha um ar de superioridade no seu caminhar. Ou poderia ser juíza de direito, pelo seu semblante sério. Não dava para definir o que ela era, assim como também não dava para saber o que ela pensava e como era sua personalidade.

Observei-a se afastando cada vez mais até sumir de vista. E era assim que eu agia com minha vida: transformei-a em uma farsa, um teatro, uma encenação. E quando eu via que o perigo estava por vir, fugia, sumia de vista.

Às vezes eu gostaria de ser apenas uma criança novamente, como as que eu estava vendo correr pelo parque com balões de gás hélio, despreocupadas e contentes, iluminadas pelo sol.

Tenho saudade da época em que eu brincava com meus vizinhos na rua. Fazíamos carrinhos de madeira e descíamos ladeira abaixo. Sorri ao lembrar que quase caímos num córrego raso que fazia curva no final da descida, por pouco nosso carro não despenca pelo barranco em direção a água.

Minha infância não foi a melhor infância de todas. Minha mãe era professora do Ensino Fundamental e obviamente, ela e meu pai eram separados e Jorge, seu segundo marido, talvez tenha sido o responsável por eu ser tão mesquinho em relação aos sentimentos dos outros.

"Grande produtor de frutas cítricas e criador de gado leiteiro, Jorge era dono de mais de 20 mil hectares de terras na região de Rio Pardo, interior do Rio Grande do Sul. O fazendeiro casara-se com minha mãe quando eu tinha seis anos de idade, e fomos morar com ele em sua propriedade no interior da cidade mais velha do estado.

No início, tudo era conto de fadas. Minha mãe lecionava pela manhã todos os dias da semana e na segunda e quarta-feira, lecionava também à tarde. Diariamente, ela me levava e trazia da escola, à tarde fazia meus deveres de casa e depois me aventurava com os vizinhos e filhos de empregados de outros fazendeiros da redondeza, pelos campos, riachos e pomares. Jorge administrava muito bem a fazenda, lembro que ele possuía um enorme escritório no sótão, que dava vista para a imensa plantação de laranjas que possuía.

Pelo que eu percebia, Jorge amava muito minha mãe, na verdade os dois se amavam muito porque dava para sentir. E para mim, ele sempre fora um bom padrasto. Me presenteava com brinquedos e me levava para conhecer os vários lugares bonitos que pertenciam as suas terras, me contava inúmeras histórias de quando era criança e adorava me levar para passeios a cavalo. Eu realmente gostava muito de Jorge, ele era muito diferente do meu pai, que vivia em função do trabalho como engenheiro civil.

E de tanto eu gostar dele, em um belo dia de sol eu descobri o quão bonito fisicamente ele era, e isso mexera com meus instintos de menino.

Minha mãe havia preparado sanduíches e uma garrafa grande de suco natural de laranja e, em um feriado qualquer, nós três fomos lanchar sobre as pedras grandiosas que ficavam abaixo de uma enorme cachoeira que ficava dentro das terras de Jorge. Ele, segurando a mão de minha mãe, me colocara em sua garupa e eu tomado por uma alegria infinita, coloquei seu chapéu de fazendeiro na cabeça enquanto caminhávamos pela trilha que levava até a cachoeira, era um costume que eu e ele tínhamos toda vez que ele me pegava no colo para algum passeio.

O Destruidor de Corações (Romance Gay)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora