Capítulo 9

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Papai não me bateu pela comida, papai não me bateu pelo dinheiro, papai não me bateu pela casa, papai não me bateu por ser gay, papai não me bateu por que mamãe o deixou para ficar comigo quando ele não aceitou minha sexualidade. Papai não me bateu por amar mamãe e não me perdoar.

Papai me bateu porque ficou bêbado.

Quando ele chegou sábado ele estava bem e estranho. Estranho por ter perguntado como eu estava, estranho por não ter se importado com a dispensa, estranho por ter me dito para ficar com o dinheiro.

"É seu!". Ele me disse. "Gaste como quiser.".

Eu mantive o dinheiro no mesmo lugar que ele estava e assim passamos o sábado. Fiz tudo como de costume, só com a diferença de que papai me chamou à mesa para compartilhar da refeição com ele e não depois dele.

Foi uma surpresa, uma surpresa bem vinda, mas cheia de desconfiança. Despois de tanto apanhar eu não iria simplesmente confiar em papai. Lavei a louça suja e fui dormir enquanto papai ficou acordado na sala assistindo um jogo, ele não estava bebendo quando deitei, mas quando eu acordei foi com o cheiro de álcool em meu quarto e com uma tapa no rosto.

Fui puxado da minha cama e arrastado escadas a baixo até a sala enquanto papai gritava sobre a bagunça de garrafas de cerveja e cigarros fumados até o filtro. Ele queria saber o que era aquela bagunça e porque eu não tinha limpado tudo aquilo. Depois ele me levou até a cozinha e aquilo estava completamente diferente de como eu havia deixado na noite anterior. Comidas e potes de conserva estavam espalhados e quebrados no chão com a água das conservas se misturando com tudo. Na pia havia pratos que eu tinha lavado e guardado, mas dessa vez estavam sujos com algo que não consegui identificar.

Papai só gritava enquanto me arrastava pelo pescoço de um canto para o outro. Até que ele me levou até o fogão e me mandou ficar ali esperando por ele. Ele foi até a garagem e voltou de lá com uma ferramenta que ele levou até onde eu estava e mandou que eu esquentasse no fogo.

Eu não questionei e nem respondi em momento nenhum, sabia que isso só iria gerar mais revolta em papai. Fiquei parado diante do fogo e segurei aquela ferramenta. Se eu tivesse me inscrito nas aulas de marcenaria talvez eu tivesse identificado que peça era aquela. Mas não iria me servir para nada saber a função para a qual ela foi criada.

Antes que eu chamasse por papai ele surgiu ao meu lado e tomou a ferramenta da minha mão enquanto em sua boca ele tragava um cigarro e em sua outra mão estava uma garrafa de cerveja pela metade.

Nesse momento eu tentei ir limpar aquela bagunça e fui impedido. Fiquei parado no mesmo lugar e quando papai achou que a ferramenta estava quente o suficiente ele me deu outro tapa no rosto, mais forte do que o tapa que me acordou. Tentei levar a mão até o local que ardia e minha mão foi impedida de tocar meu rosto, a garrafa de cerveja estava no chão, ela não quebrou quando caiu e o liquido restante começou a escorrer no piso. A mão de papai que agora estava livre segurou meu pulso e virou meu braço deixando-o exposto. O ferro quente encostou em meu braço e um grito, o primeiro, escapou da minha garganta.

-Não grita. - Papai sibilou e eu tentei contei o grito. Foi impossível. - Vamos tentar de novo. Quero ver você não gritar. - E assim ele esquentou novamente a ferramenta no fogo enquanto segurava meu braço. O cigarro já havia acabado e ele não foi buscar outro, ficou ali comigo, com o fogo e o ferro. - Você não vai gritar dessa vez entendeu? - Confirme e não aguentei. Um novo grito escapou quando o cheiro de carne sendo queimada subiu ao meu nariz e eu vomitei de lado. - Vamos tentar uma terceira vez. Nada de gritos. - Talvez meu corpo tenha se acostumado com a dor já que na terceira vez o grito veio e não saiu, quase desmaiei com a dor e por não poder extravasar ela, consegui manter a boca fechada antes de algum som escapar. - Bom garoto. Agora limpe toda essa bagunça que eu vou tomar um banho.

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