Capítulo 2

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Mais uma segunda-feira chegou e com ela veio à certeza de que eu precisaria sair do meu mundo não tão seguro assim para enfrentar feras piores. Essa realidade me atingiu no momento em que a água gelada tocou minha pele. Sete horas da manhã de um dia que amanheceu chuvoso e a água fria despertando todos os músculos tensos do corpo.

Meu pai não havia voltado pra casa no domingo e agora, antes de sair de casa ele ainda não tinha chego. Por isso não foi preciso preparar nada para ele comer. Às vezes ele faz isso, sai no domingo e vai direto para o serviço e se tivesse comida na mesa ela iria ficar lá o dia inteiro, atraindo formigas, ratos, baratas e toda sorte de insetos e pragas para dentro de casa.

Tranquei a porta e dessa vez não me preocupei em colocar os óculos escuros, já que o roxo havia sumido quase por completo e o pouco de maquiagem que estava em meu rosto foi o necessário para cobrir qualquer vestígio de agressão.

O caminho até a escola foi tranquilo, preferi fazer a pé, e conforme fui chegando mais perto dos portões o fluxo de pessoas foi aumentando. Carros, ônibus, bicicletas e pedestres todos caminhando para o mesmo lugar. Meus fones impediram que eu ouvisse qualquer conversa que acontecia a minha volta e agradeci ao deus dos fones por ter dado essa ideia para os humanos.

Mesmo passando uma semana sem aparecer reconheci melhor o caminho para meu armário caminhei até ele começando a organizar os livros, cadernos e materiais ali dentro. Colei uma cópia da grade de aulas na porta do armário, pelo lado de dentro e me arrependi de não ter faltado hoje de novo. Aula de história.

Pelo menos o calmante que tomei de manhã estava fazendo efeito e eu não estava surtando novamente. De todas as proibições em casa, às únicas que deveriam existir, mas não existem são as que me fariam mal. Como o acesso ao estoque de remédios que papai mantem mesmo que nem ele e nem eu fiquemos doentes das coisas que aqueles remédios curariam. Talvez seja uma mensagem dele, uma das muitas que faço questão de ignorar.

Se me reconheceram ou se riram de mim eu não ouvi e nem vi, pois a cabeça baixa e o volume alto me impediam de socializar e eu preferia assim.

O mapa dos corredores até aquela sala estava impresso em minha mente. Aquela sala pelo menos eu não iria esquecer tão cedo, por isso foi fácil chegar até ela antes do sinal tocar. Escolhi uma mesa onde tinha certeza de que ninguém iria conseguir me constranger de alguma forma e permaneci ali em silêncio.

Quando o sinal tocou, e eu pude ouvir aquela sirene tocando, os alunos começaram a entrar na sala e passavam lentamente até os seus lugares. Reconheci a mesma professora da semana anterior entrou e quando seus olhos percorreram a sala e se depararam em mim ela sorriu dando um leve aceno com a cabeça como se confirmasse alguma coisa. Como se certos rostos tivessem gravados em minha memória.

A aula teve inicio quando todos os alunos estavam sentados, os alunos me olhavam em momentos alternados como se tentando esconder sua curiosidade. Mas eu podia notar eles olhando e por mais que o calmante tenha um bom efeito à ansiedade devido os olhares já estava deixando um mal estar com toda atenção adquirida, foi quando o sinal para troca de aulas chamou a atenção de todos.

Suspirei aliviado quando isso aconteceu e antes de passar pela porta, deixando que todos os outros saíssem primeiro, a professora se aproximou de mim e disse baixinho: - Que bom que você voltou!

Simples assim. Aquela frase vindo de alguém que ainda não conhecia, mas que tinha todos os motivos para me julgar foi capaz de me fazer sorrir verdadeiramente, mesmo que deforma tímida.

Por outro momento me senti perdido, só tinha certeza de onde encontrar o meu armário e essa sala, e agora eu tinha seis minutos para correr para a aula de matemática. Ao menos é o que a cópia da minha grade de horários me diz. Melhor é eu desistir por hoje e voltar para casa. Pensando bem, é isso mesm...

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