Capítulo 2 - A porta do desconhecido

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Não aguento mais correr. Pensei. Estava ofegante e sentia o acelerar do meu ritmo cardíaco. O suor banhava as minhas costas. Escorei-me num tronco de uma grande árvore que estava coberto de lodo, tentei encher meus pulmões de ar para controlar minha respiração. Concentração Marcos, concentração! Dizia a mim mesmo por meio do pensamento, pois ainda me esforçava para produzir algum som, uma leve vibração das cordas vocais já era um progresso. Está tão frio aqui. Estava quase anoitecendo e podia ver, mesmo que com a visão embasada, um leve lampejo de luz no final do caminho que estava a minha frente, mas o calor e a luminosidade do crepúsculo não seriam o suficiente para me aquecer ou para me guiar na escuridão que logo chegaria. Por um instante não sabia onde estava muito menos o que fazia naquele lugar. Olho a minha volta, franzo a testa tentando lembrar e logo me recordo, eu conheço este lugar é a floresta estadual de Stokes. Eu estava correndo atrás de uma mulher... não, era de uma garota! É isso! Eu a perdi de vista. Tenho que encontrá-la!

Então, devagar eu aprumei o corpo e senti um fisgar na coxa direita. Droga! Acho que tive alguma luxação! Mas não posso parar, não agora! Ela precisa dizer, eu preciso saber. Puxei o ar mais uma vez, agora com mais força até sentir que meus pulmões estavam completamente cheios. Reunindo as forças que me restavam e tentando ignorar a fadiga muscular, segui a trilha até avistar uma casa que parecia abandonada. Essa casa me era familiar.

Ao olhar para a parte superior do imóvel eu a vi na janela. Ela se assustou e sumiu. Fui em direção a casa e entrei. Era bem grande por dentro e sua mobília era bem antiga, algo dos anos 20. Havia um piano na sala onde se encontrava uma grande escada que dava para o andar de cima. Este piano, eu conheço este piano. Porém, não poderia me distrair. A garota! Tenho que falar com a garota! Comecei a subir a escada e minha perna repuxa, queria gritar de dor, mas o processo de fala ainda estava em desenvolvimento. Deve ser por causa do frio. Subi a escada de joelhos. Ouvi passos. Uma porta bateu, parece que é no fim do corredor. Quando finalmente cheguei e escorando na parede a minha frente eu vi. Eu vi. Não queria ver, não estava esperando aquilo. Fique paralisado. Novamente ela me assombrava, a porta vermelha.

No final do grande corredor que estava quase sem iluminação lá estava ela, à porta. O barulho vinha de lá. A garota devia estar lá. O medo e o pânico não vão me impedir de ter as respostas. Caminhei em direção à porta em passos vagarosos até que quase chegando perto, pisei em algo gelatinoso e ao olhar vi que era um líquido. Sangue. Muito, mais muito sangue mesmo, saindo por debaixo da porta. Olhei para as paredes e o teto que de repente começaram a escorrer o líquido avermelhado. O sangue quente escorria por meu corpo e me deixei levar pelo pânico. Cheguei a tocar na maçaneta, mas de súbito acordei.

Estava tão ofegante quanto no sonho e digo que suado da mesma maneira. Fiquei meio tonto. Pisque algumas vezes para despertar. Por um instante não sabia onde estava até olhar para o lado e ver Frence dormindo profundamente. Inspirei e expirei algumas vezes tentando me acalmar. Sentei-me na cama e me apoiei na cabeceira, olhava para o chão tentando colocar meus pensamentos em ordem. O sonho me pareceu tão real, sentia até o fisgar na coxa direita, a fadiga dos músculos. Tentei lembrar de quando comecei a correr, do rosto feminino que agora me perturba. Mas nada me vem há mente. Sinto sede e vou até a cozinha pegar água, durante o trajeto tento forçar a minha mente a me dar informações mais claras, fracassei.

Ao chegar à cozinha e abrir a geladeira em vez de tomar água, bebi um copo de vinho tinto. Encostei-me no armário que abrigava as porcelanas e ao acabar de beber, coloquei o copo em cima da mesa sobre um papel e logo vi que o tinha  manchado, pois o copo estava úmido. Rapidamente tirei o copo de cima do papel e torcendo para não ser nenhuma das listas de tarefas de Frence, olhei o seu conteúdo. Era o convite.

Haviam se passado uma semana desde que recebi o convite para trabalhar no hospital psiquiátrico. A ideia me pareceu tentadora. Tentei abordar o assunto com Frence, ela disse que depois conversaríamos a respeito, pois estava muito atarefada. As crianças voltariam a estudar daqui a duas semanas, mas Frence era muito ansiosa. Dizia que deveria arrumar tudo com antecedência. Ela ficava tão concentrada que nada no qual eu fala-se que não se envolve a palavra escola ela ouvia.

_ Tudo bem amor, depois conversamos. Ela dizia

Em meio à correria e a falta de atenção de Frence, acabei não me importando tanto mais com o tal convite. Porém, agora me perturbo ao vê-lo, o vermelho do envelope ao seu lado lembrou-me o sangue que vi no sonho.

Esse sonho, na verdade, esse pesadelo me fez retomar a ideia, a sensação de que algo estava errado, como se a felicidade não fosse mais possível. Olhei pela janela e observei em meio ao breu da madrugada o jardim, logo mais a frente, depois do cercado, foi onde vi a mulher ou pensei ter visto. Por dentro achei por um instante que o pesadelo tinha haver com aquela mulher que vi na mata, que não sei se era uma garota ou já uma mulher feita. Mas será a mesma mulher do meu sonho? Por que sonharia com alguém que apenas tive a impressão de ter visto? Certeza havia uma explicação racional para isso. Porém, não queria pensar naquele momento então retornei ao meu quarto e tentei dormi novamente. Porém, a imagem da porta me impedia de dormi.


O MISTÉRIO DE HELENA - (EM HIATO)Where stories live. Discover now