- Sim, estou. O que quer? São seis horas da manhã, Michael! – Levei os dedos, novamente, para os meus fios negros, empurrando-os para trás, enquanto meu olhar percorria a organização impecável de meu quarto.

A cama, por mais que tivesse recentemente acordado, encontrava-se pouco revirada, assim como os objetos em meu criado-mudo. As canetas, o meu inseparável bloco de anotação, meu maço de cigarros e o isqueiro alinhados quase que em uma suprema perfeição, do meu lado da cama. O móvel ocupava boa parte do quarto e, admito, foi um das minhas maiores inúteis aquisições.

Era exageradamente grande, recoberta por lençóis escuros de seda e um edredom, como sempre, de cor semelhante. A cabeceira era de madeira bem polida, tabaco, assim como os pequenos móveis ao lado da cama e o rack, onde se encontrava a enorme TV de LCD, meus aparelhos eletrônicos e minha coleção de filmes e séries, sempre dispostas de forma organizada (Os DVDs em ordem alfabética e os demais itens alinhados perfeitamente, como sempre).

Como Michael diria, meu quarto era sagrado. Pouco se podia ver da minha vida profissional conturbada e de minha mente confusa, sempre em constante indagação. Por muitas vezes, eu arrumei cada canto daquela casa pessoalmente, não por falta do que fazer, mas sim por um reles capricho e pela mania absurda de organização que eu possuía.

Desde pequenos éramos assim: Gerard, o organizado, mesmo que inquieto e inconstante. Michael, o desastrado, tão desorganizado quanto nossa própria mãe. Eu tinha saudades daquele tempo, de quando eu e Michael éramos jovens e possuíamos poucas preocupações. Quando passávamos nossas tardes assistindo a filmes trashes e conversávamos sobre as anormalidades mais peculiares. Em tardes como aquelas, não pensávamos no futuro, no que iríamos nos tornar. E, se eu soubesse que me tornaria quem eu era... Sinceramente, eu teria feito tudo diferente.

A começar por aquele casamento.

- Gerard, você está aéreo pra caralho! – Michael exclamou, tossindo logo após, enquanto resmungava algo para alguém possivelmente ao seu lado. Não reconheci a voz masculina que tanto perturbava meu irmão, mas não me atentei muito a isso. Voltei-me em direção ao corredor, rumo à cozinha, ao que meu irmão prosseguia a falar. – Preciso de um enorme favor seu.

Suspirei, liberando minha respiração de forma audível, propositalmente. Michael riu, como sempre, provavelmente já imaginando o quão irritado eu me tornaria em breve. Quando meu irmão vinha com a famosa frase "Preciso de um enorme favor seu", eu simplesmente poderia contar com alguma extravagância que ninguém mais havia topado em fazer. E sempre sobrava para mim.

- Fale, Mikey. – O chamei pelo apelido, tentando amenizar a situação e tranquilizar a mim mesmo. Eram tantos problemas, tantas irritações, que eu me perguntava, constantemente, se Michael se esquecia de que eu estava sempre extremamente ocupado, sem nem ao menos ter tempo para mim mesmo, para ajudá-lo com suas esquisitices.

- Como hoje é o seu maravilhoso dia... – A ironia de Michael ás vezes me arrancava gargalhadas, mas não naquele instante. – E sei que provavelmente, depois de toda a cerimônia, você vai se mandar para Londres com a Srta. Estorvo... – "Não chame Evellyn de estorvo", corrigi, como sempre, já imaginando Michael revirar os olhos, ao que pigarreou e prosseguiu. – E provavelmente só voltará daqui há duas semanas, preciso saber se pode emprestar o apartamento para um amigo meu. – E ele disse a última frase tão rapidamente e alto, que tive que me apoiar na bancada da cozinha para não tropeçar em um dos bancos, tentando digerir toda a informação.

- Um amigo seu? – Perguntei, adentrando de vez a cozinha igualmente mobiliada em móveis tabacos e ladrilhos de tons escuros, assim como os eletrodomésticos, notando que alguns pontos da mesma deveriam ser arrumados urgentemente. – Por que, Mikey? Não tem lugar no seu apartamento não?

Burn Bright || Frerard versionOnde as histórias ganham vida. Descobre agora