Capítulo 16

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Era o dia de folga de Charles. Às pressas, ele saiu da mansão de Emílio rumo a casa onde morava com a família. Estava com muita saudade deles. Afinal, fazia quinze dias que não os via. Deveria folgar um dia na semana, no entanto, isso quase nunca acontecia. Seu patrão frequentemente o impedia disso, alegando precisar de seu auxílio.

Charles e todos os funcionários de Emílio sempre ganhavam salários bem acima da média de sua categoria profissional. Mas isso não queria dizer que o estilista esbanjava generosidade, e sim que ele desejava ter controle sobre eles. O caso mais evidente disso era Charles. Um homem vindo de Sergipe, com uma mulher grávida, em busca de uma oportunidade no Rio de Janeiro, sem ter nem concluído o ensino fundamental, era ideal para os planos de Emílio. Este fez uma transformação em Charles. De um homem rude, sem cultura, sem educação, passou a ser cheio de classe, que sabia se vestir e se comportar nos eventos mais dispendiosos que Emílio frequentava. A função de Charles era muito mais ampla do que a de um mordomo. O próprio estilista o tinha como um assistente pessoal, entretanto, era mais conhecido como mordomo do de Sant.

Embora odiasse trabalhar para Emílio, não poderia reclamar de sua vida financeira. Morava em um bairro nobre do Rio de Janeiro, em Botafogo, numa casa luxuosa. Seu filho, de 8 anos, estudava em um dos melhores e mais caros colégios do estado. Com toda essa opulência, era para Charles ser um homem feliz. Mas não era. Assim que chegou a casa onde morava, Mônica, sua mulher, uma linda morena de 32 anos, abraçou-o com força e o beijou. Ela percebeu que o marido não estava bem, mas, no momento, não quis perguntar. Tiago, seu filho, apareceu em seguida e abraçou o pai.

Enquanto almoçavam, Mônica percebeu que Charles estava distante, com o pensamento longe, com um semblante de quem tinha um problema. Tratou de saber:

— Meu bem, fala o que está acontecendo.

Charles saiu do seu devaneio, olhou para a esposa e respondeu:

— Não é nada.

— Claro que está acontecendo alguma coisa. Por que não quer me falar? Está assim por causa do seu patrão de novo?

— Deixa pra lá, Mônica. Não quero falar dessa pes... — lembrou-se do filho, que estava na mesa, e resolveu mudar o que ia dizer. — Não quero falar dele de novo.

Mônica olhou para o filho e disse:

— Filho, a mamãe e o papai vão conversar lá na sala, tudo bem? É rápido. A gente já volta para terminar o almoço.

— Tudo bem, mamãe.

Assim que se sentaram no sofá da sala, um de frente ao outro, Mônica começou:

— Meu amor, nós já conversamos sobre isso. Se não está mais aguentando trabalhar lá, pede as contas. Você arruma outro emprego.

— Não é assim tão fácil, Mônica. Onde vou ganhar o que eu ganho lá? Como vamos manter essa casa, o carro, o estudo do Tiago?

— Mas, meu bem, isso tudo pode mudar. Claro, hoje nós temos uma vida muito melhor do que a gente tinha lá no Sergipe. Mas isso pode mudar. Podemos, sim, levar uma vida humilde como a gente tinha lá na nossa terra. O que não pode é você ficar assim.

— Eu sei, Mônica. Eu vou aguentar mais um pouco e saio de lá.

Mônica fez que não com a cabeça, não acreditando no que o marido prometera. Por fim, levantou-se irritada e falou:

— Você que sabe, Charles — e voltou para a mesa.

Charles se levantou após isso e foi para o quarto. Trancou a porta e se dirigiu até um pequeno quadro na parede. Retirou-o. No lugar, havia um cofre onde guardava alguns segredos de Emílio. Segredos que poderiam destruir o patrão assim que quisesse.

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