Capítulo 10 - Disposição

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Quando fechei a porta, ouvi minha mãe gritar surpresa atrás de mim, o que confirmou minhas suspeitas de que ela sabia e incentivou a ideia da Mariana. Virei-me para agradecer quando vi que ela segurava uma caixa.

— Mãe? O que é isso?

— Seu presente - respondeu, animada. - Comprei especialmente pra você usar na festa.

Então comecei a ficar apavorada a medida que ela abria a caixa e puxava para fora alguma coisa. Minha mãe nunca entendeu bem meu gosto para roupas. Na verdade, acho que ela nunca entendeu bem meu gosto para nada, nem para homens. Inclusive, ela é mestre em apontar um menino horrível na rua e falar "nossa Kate, não parece o menino inglês que você gosta?". Claro que ela não consegue, mesmo depois de todos esses anos, entender que quem gosta de Alex é MARIANA e não eu. Nem consegue chamar Alex pelo seu nome. Ele é e sempre será o menino inglês que "eu" gosto.

Foi só quando ela terminou de puxar tudo para fora que consegui respirar aliviada. E, mais do que isso, foi quando eu consegui dar um sorriso espontâneo. Pela primeira vez na vida minha mãe tinha comprado uma roupa que, de fato, era de meu agrado. Melhor do que ser do meu agrado, era realmente linda: era um vestido cujo tecido base era a imitação de um jornal e, nas junções dos jornais havia pequenas bandeiras britânicas. Pra complementar, uma fita vermelha na cintura dava um ar retrô muito fofo.

Minha mãe provavelmente percebeu meu ar surpreso ao olhar para o vestido, pois o sacudiu na minha direção, dizendo:

— Comprei porque achei que você ia gostar de ter as bandeiras do país do menino inglês que você gosta! - eu ri, porque não adiantaria mesmo tentar explicar de novo. - Agora vá vestir que eu quero ver!

Parece incrível, mas ficou ainda melhor quando eu vesti. O decote era quadrado, o que expunha um pouco da minha pele, mas não o suficiente para ser vulgar e o vestido abria após a faixa na cintura, tornando meu corpo mais proporcional e cheio de curvas.

— Ficou lindo! - minha mãe disse quando saí do meu quarto, pronta.

Complementei o vestido com uma sapatilha vermelha e uma trança, simplesmente porque fiquei com preguiça de fazer qualquer coisa mais elaborada. Abri um sorriso para agradecer minha mãe quando percebi que ela estava com o celular na mão, apertando a tela repetidamente.

— Mãe? Não acredito que você está tirando fotos! - corri em sua direção, tentando tirar o celular de sua mão.

— Qual é o problema? Vou mandar pro seu pai - ela disse, protegendo o celular. - Como faz mesmo para mandar, hein filha? Já me esqueci.

Suspirei, revirando os olhos. Nós duas nos sentamos no sofá e eu ensinei mais uma vez como anexar as fotos para enviar para meu pai por celular. Juntei toda minha paciência, mas ela merecia: tinha acertado no meu presente. Ela era sempre esquecida e achava que eu não sabia que ela ficava deprimida toda vez que papai tinha que ir embora, mas eu amava aquela mulher mais do que tudo, ainda que nem sempre me sentisse confortável para conversar sobre tudo com ela. Mas tudo bem, né? É meio esquisito conversar sobre certas coisas com sua mãe, especialmente quando elas forçam a barra para saber. Minha mãe sempre respeitou meu espaço e sou muito grata por isso.

— Não volte muito tarde, ok? - ela disse, beijando minha cabeça, antes de eu sair para a festa.

— Mas mãe, a festa é aqui do lado!

— Ah, é! - ela bateu com a mão na testa, em sinal de esquecimento. - É a força do hábito! Enfim, as outras recomendações ainda estão valendo: não aceite bebida de estranhos, não deixe seu copo sozinho e depois beba de novo, não vá para o cantinho com estranhos, não...

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