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 -Mia? Kyle?
 Estávamos ainda deitados quando oiço a Kate à nossa procura.
 -Estamos aqui! - grito.
 Kate entra no meu quarto e fica a olhar para nós e diz.
 -Eu deixáva vos ficar aí a fazer o quer que vocês estavam a fazer, mas temos de salvar o mundo.
 Rimos os três e Kate vai andando para a sala. Começo a levantar me para ir também mas o Kyle puxa me e caio em cima dele de costas. Ele envolve me com os seus braços fortes e encosta a sua boca ao meu ouvido. Fecho os olhos.
 -Vamos ficar aqui. - sussurra.
 -Não podemos. Salvar o mundo, não ouviste? - digo a rir.
 Ele ri e acabamos por nos levantar, andando os dois até à sala de mão dada.

 Depois de algumas horas a refletir sobre o que fazer, decidimos ir até à casa de Chris.
 -Ele já não deve estar lá, tu já sabes o caminho por isso deve ter saído de lá. - diz Kyle.
 -Eu queria dizer a casa dele mas tipo mesmo a casa dele.
 Os dois olham para mim confusos então eu exclareço.
 -Eu estive naquela casa no meio da floresta. Não tem fotografias, nem roupa, nada que indique que ele viva ali. Aquela não é a casa dele, é mais um esconderijo.
 -E como é que pensas descobrir onde ele vive? - pergunta Kyle.
 -Há de haver alguma pista no seu esconderijo. - respondo.
 Eles assentem e vamos para lá.

 -Estamos há horas à procura de pistas, Mia, e nada! - resmunga a Kate pela centésima vez.
 É verdade o que ela diz mas eu sinto que há aqui qualquer coisa. Reparo numa gaveta escondida por um pano que tem um cadeado.
 -Kyle! Kate! Vejam isto!
 Eles aproximam se.
 -Prontos?
 Usámos os três a força vampírica e conseguimos partir o cadeado.
 Conseguimos abrir a gaveta mais rápido do que eu pensava. E admito, eu não estava nada à espera do que lá estava dentro.
 Fotografias. Fotografias minhas. No supermercado, na varanda, com a Kate, no prado...
 -Ele já andava a planear isto há muito tempo. Não foi ao acaso, ele escolheu te. – disse o Kyle.
 Isto tornou se mais assustador do que já estava. Porquê eu? Pelas fotos já me persegue há mais de cinco meses.
 No fundo havia outra foto, desta vez dele perto de uma mansão. A fotografia era bastante antiga.
 -Eu sei onde fica essa casa! – exclama o Kyle.
 Olho para ele como quem pergunta "Como?".
 -Não fica muito longe...da minha casa.
 Nunca fui a sua casa. Nem sei onde fica. Ele nunca me disse. Nunca me convidou. Mas agora também não é altura para discutir estas coisas.
 -Leva nos até lá, então. – digo.
 Ele olha para mim mas eu desvio o olhar.
 -Mia...
 -Simplesmente, leva nos lá.
 Ele assente e tenta agarrar me na mão mas eu retiro a. Antes de sairmos volto à gaveta e retiro todas as fotos e guardo as. Encontro também um colar que me pertence e que eu julgava ter perdido.
 Andámos durante uns quinze minutos sempre em silêncio. Ás vezes sentia o olhar de Kyle em mim mas ignorava o.
 Kate deu me a mão e apertou a levemente. Por entre as árvores avistei um telhado com telhas negras. É a mansão.
 Cuidadosamente, aproximámo nos. A casa é enorme. Uma mansão antiquada mas com classe. A varanda principal tem um corrimão de pedra trabalhado ao pormenor. O jardim arranjado com uma fonte no centro. À volta dessa fonte rosas brancas, as minhas favoritas. A porta da entrada tinha um rosto com a boca a segurar uma argola. A sua boca tinha os caninos afiados.
 -Vou entrar! – digo eu.
 -Tu ficas aqui, Mia! – diz Kyle.
 -Ele vai estar à minha espera...
 Ele interrompe me.
 -Eu não estou a pedir! Tu não vais entrar ali!
 -Eu vou. Quer tu queiras, quer não. – respondo calmamente.
 Começo a aproximar me da porta e antes de bater, esta abre se.
 -Eu sabia que virias, Mia. - começa Chris quando me vê.
 -Preciso de respostas.
 -E eu terei todo o gosto em dar tas. – diz sorrindo – Entra.
 Entro mas antes olho para trás. Nem Kyle nem Kate estão visíveis mas eu sei que ainda lá estão.
 O hall de entrada é maior que a minha casa toda. Uma grande escadaria e portas por todo o lado. É uma casa absurdamente grande para uma só pessoa.
 -É uma casa de família. Foi me deixada pelo meu bisavô que já morreu há mais de um milénio. Ele nunca soube o que eu era, porque se soubesse nunca me teria deixado a sua herança.
 À medida que andamos eu observo as paredes. Retratos pintados à mão ao longo das paredes.
 -É a minha família.
 Pergunto me se ele será o único sobrevivente da sua família. O único vampiro.
 Há um dos quadros que me chama a atenção. Uma mulher de cabelos negros e olhos azuis. É tão parecida comigo. Veste um volumoso vestido verde com um corpete branco. Está sentada numa cadeira e as suas mãos estão delicadamente pousadas no seu colo. Ao seu pescoço está um colar igual ao meu, aquele que o Chris guardou, o que é estranho pois o meu é um colar de família.
 -É a Lady Marianne. Veio de França tal como eu. Viveu nesta casa durante muitos anos, o meu pai acolheu a e acabámos por nos conhecer. Ela adorava o jardim, passava lá horas a tratar das flores. Rosas brancas maioritariamente, são as suas favoritas. Ás vezes passávamos horas a conversar junto da fonte. Apaixonei me por ela ainda antes de ser transformado em vampiro, e o sentimento não desapareceu depois disso. Ela também se apaixonou por mim. Queria a como minha esposa. Mas o que faria eu quando ela morresse e eu continuasse como se tivesse vinte anos? Não iria suportar a dor, por isso mostrei lhe o que era e pedi lhe para se juntar a mim. Eu próprio a transformaria. Ela ficou com medo, chamou me coisas horríveis e fugiu. Voltou para França. Ainda a procurei lá uns anos mais tarde mas descobri que tinha morrido de uma doença que andava a assombrar o país. Também descobri que tinha deixado uma filha e um marido. Mesmo assim nunca a esqueci.
 Enquanto ele contava a história, eu olhava para o retrato dela. As semelhanças são várias. O cabelo, os olhos. Eu também nasci em França e mudei me para o Canadá antes de fazer um ano. As minhas flores favoritas são rosas brancas. Até o nome. Mia vem de Marianne, mas quase ninguém sabe e prefiro assim. Como é que é possível sermos tão parecidas?
 Continuámos a andar até a um salão enorme.
 -Senta te. – convida me.
 Eu sento me num sofá de pele verde escuro e ele senta se num cadeirão ao lado a condizer.
 -Disseste que precisavas de respostas.
 Respiro fundo.
 -Porquê eu? – pergunto atirando as fotografias para cima da mesinha à minha frente.
 Ele faz um sorriso malicioso e levanta se, dirigindo se ao sofá onde eu me encontrava e sentando se ao meu lado. Bem perto de mim. O suficiente para eu sentir o seu calor. O suficiente para ativar a atração.
 Não quero que ele esteja tão perto de mim, sei muito bem como é que o laço de sangue funciona e não tenciono segui lo. Mas também sei que não o posso evitar. Afasto me um pouco mas ele insiste e aproxima se.
 -Não percebeste? – começa – Vais me dizer que não viste as semelhanças? Vocês são família. Ela há de ser a avó da avó da avó da tua avó, não sei. O colar que provavelmente encontraste junto das fotos? Pertence lhe e foi sendo passado de geração em geração, até chegar a ti. Acompanhei a sua família depois de ela morrer durante todos estes anos mas nenhuma das mulheres ao longo das gerações me lembrou dela tanto como tu. Daí ter te escolhido a ti, estamos destinados a ficar juntos.
 -Tu estás louco! Nós não estamos, de maneira nenhuma, destinados a ficar juntos!
 Aproxima se mais e encosta a sua boca ao meu ouvido fazendo me arrepiar.
 -Não sentes a atração? – sussurra me.
 Fecho os olhos. Não é real.
 Recuo mais ficando bem à ponta do sofá.
 -Se me querias a mim, porque é que transformas te também a Kate?
 -Isso foi um acidente. Nunca quis transformá la, naquela festa ela já estava bêbeda eu também e aconteceu. Nada planeado. – ele dizia isto com tanta descontração que parecia que já tinha acontecido outras vezes. E provavelmente já.
 -Tens mais perguntas?
 -Tu não me transformas te só porque tens saudades da Marianne, pois não?
 Ele encosta se às costas do sofá e sorri.
 -És tão esperta como a Marianne. É verdade. Não te transformei só por causa disso. Já deves saber que há uns anos fui condenado por tentar fazer um exército de Iniciados. Bem, eu vou voltar a fazê lo. Transformei te porque preciso de uma companheira para me acompanhar.
 -Eu não sou nem vou ser tua companheira, Chris.
 -Eu não teria tanta certeza disso.
 Levanta se e faz sinal a um homem vestido com um fato preto para se aproximar.
 -Vá preparar um quarto para a menina Mia, por favor.
 -Sim, Senhor.
 Levanto me e grito.
 -Chris, eu não vou ficar aqui!
 Houve se um estrondo vindo do hall de entrada.
 -Larguem me! – oiço. É o Kyle.
 Ele entra no salão rodeado de homens.
 -Kyle...
 -Desculpa, Mia, mas estavas a demorar muito e pensei que te tivesse acontecido alguma coisa.
 -Eu estava agora de saída. – digo e mando um olhar ao Chris para ele entender que eu não vou ficar ali.
 Encaminho me para a saída e Kyle vem comigo. Quando já estou perto da porta, Chris puxa me por um braço e sussurra.
 -Vais ser minha. Quer queiras, quer não.
 Qualquer coisa naquela afirmação me deu a ideia de ameaça. Olho para ele.
 -Se não vieres amanhã, para ficar, posso sempre tratar da tua amiga.
 -Nem penses em tocar na Kate!
 -A escolha é tua, Marianne...

Mordida pelas SombrasWhere stories live. Discover now