Boneca Luna

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Estou com muito medo. Acho que posso ter cometido um erro terrível e irreparável. Espero estar enganada, mas meu coração diz o contrário. E se o que desconfio for verdade não sei se poderei suportar a culpa e o terror.

Eu tenho uma irmã dois anos mais nova do que eu chamada Helena. Sempre fomos muito parecidas, as pessoas até perguntavam se éramos gêmeas quando crianças.
Mesmo quando crescemos, as semelhanças continuaram. Casamos no mesmo ano e na mesma igreja. E fizemos questão de comprar casas no mesmo condomínio.

Nós duas também compartilhavamos o sonho de formar uma família. Na infância brincávamos de boneca fingindo que eram nossas filhas e o plano sempre foi engravidarmos em datas próximas para que as crianças crescessem juntas.

Mas é claro que nem sempre a vida real segue nossos planos. Ou os meus, no caso.
Em menos de um ano de casamento, minha irmã descobriu que estava grávida. Posso jurar que fiquei feliz por ela, não sou tão mesquinha assim. Ajudei a organizar o chá de bebê, comprei roupas, fraldas e mamadeiras e comemorei com minha irmã cada estágio da gestação.

Ao mesmo tempo eu continuava tentando engravidar. Nisso se passaram meses sem que eu obtivesse sucesso. Foi quando procurei um médico para entender o que estava acontecendo, e após alguns exames, descobri que era estéril. Isso foi um grande golpe pra mim, tive a sensação de ver meu sonho ser pisoteado. Eu não ia poder ser mãe.

Quando a criança da minha irmã nasceu, Luna, uma linda menina de cabelos e olhos castanhos, comecei a passar muito tempo em sua casa ajudando a cuidar do bebê. Isso diminuía a dor de não conseguir dar a luz.
E, apesar dos meus problemas, eu realmente amava minha sobrinha. Eu cantava para Luna, contava histórias antes de dormir e até lhe dei seu primeiro brinquedo, uma boneca que encomendei para se parecer com ela. E acredito que Luna também me amava. Com apenas três anos, já escapava de sua mãe para ir até a minha casa que ficava em frente a dela.
Com cinco, já passava mais tempo comigo do que com sua mãe.

Eu sabia que Helena tinha ciúmes. Ela não dizia abertamente, mas sempre inventava desculpas para afastar Luna de mim. "Ela está fazendo o dever de casa", "Ela está de castigo", "Ela está com conjuntivite ".

Luna costumava desmentir sua mãe quando fugia para me ver. Em uma dessas situações, quando Helena foi até a minha casa buscar Luna, ela começou a brigar com a menina na minha frente.
Não consegui me conter e parti em defesa de minha sobrinha, mas acho que essa foi a gota d'água para ela. Minha irmã me lançou um olhar cortante.
— Não se meta em como eu crio a minha filha, você não é mãe dela.

Quando Helena foi embora, comecei a chorar. Não por ela ter dito isso, sei que foi algo impensado por estar irritada.
E só me entristeceu por ser verdade, eu estava projetando minha vontade de ser mãe em Luna.

No dia seguinte, minha irmã me pediu desculpas e eu a perdoei, mas eu tinha a sensação de que precisava de uma mudança. Comecei a pesquisar sobre adoção e outras formas de ter um filho sem precisar gestar.
Procurei quem pudesse me informar sobre o processo e comecei minha busca nos orfanatos da região.

Como podia ser uma longa espera, escolhi manter em segredo de todos, com excessão de meu marido.
O que é claro, significa que não contei a minha irmã. Continuei agindo normalmente e até tentei respeitar os limites que ela impunha no meu relacionamento com Luna.

Demorou meses, mas a espera finalmente chegou ao fim. O orfanato me cedeu a guarda de uma garotinha de 4 anos.
Eu só informei minha família um dia antes de buscá-la, mas todos ficaram muito animados com a notícia. Bem, com excessão de Luna que pareceu um pouco enciumada, mas conclui que isso logo passaria quando conhecesse sua nova prima.

Busquei minha filha no orfanato, e a levei ao cartório para mudar seu nome. Além de acrescentar meu sobrenome, escolhi batiza-la de Sol em uma certa homenagem a minha sobrinha e ao meu sonho de infância.
Ela era perfeita, com cabelos pretos e cacheados e grandes olhos esverdeados. Eu já tinha feito várias visitas a ela no orfanato e me apaixonei por seu jeitinho meigo e tímido.
Eu chorei muito nessa dia, vendo Sol encantada com sua nova casa, seu quarto e seus brinquedos. Foi facilmente o momento mais feliz da minha vida. Ela se adaptou tão bem a nossa família, que nem precisei pedir que me chamasse de mãe.

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⏰ Last updated: Apr 29 ⏰

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