Capítulo III

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   Jungkook olhou para o trêmulo garçom que acabara de declarar algo completamente absurdo: que seria o pai ômega de um filho seu. Seria cômico, se não fosse revoltante.

—Esta é uma declaração absurda e mentirosa! –ele afirmou.— Ainda mais, porque eu nem conheço você.

   Jimin sentiu como se lhe enfiassem uma faca no coração, mas rezou para não demonstrar.

— Então, por que não mandou seus guardas me tirarem daqui?
— Porque fiquei curioso.
— Ou porque, no fundo, você sabe que eu poderia estar dizendo a verdade?
— Não nesse caso.– ele deu um sorriso cruel. — Em geral, não durmo com garçons.

   Aquilo doeu, e muito, mas fora intencional, Jimin engoliu o insulto e tentou não se abater diante do olhar corrosivo de Jungkook.

— Talvez você não se recorde, mas posso lhe garantir que nem sempre foi assim.

   Sua calma segurança, o modo como o ômega o enfrentava, encarando-o a despeito das roupas baratas e da aparente pobreza, fez com que Jungkook reavaliasse aquela estranha possibilidade. Ele poderia estar dizendo a verdade.

   Jungkook olhou dentro dos olhos de Jimin procurando uma pista sobre o que ele pretendia, mas tudo o que viu foi a mágoa profunda nos olhos cinzentos, e, de repente, ele sentiu seu coração se contrair: olhos de nuvens tempestuosas. Nuvens tempestuosas. Um laivo de lembrança se agitou em sua mente.

— Solte seus cabelos. – ele ordenou gentilmente.
— Mas...– o ômega tentou protestar.
— Eu lhe disse para soltar os cabelos.

   Impelido pelo gentil tom de comando e abalado pela ironia em seus olhos, Jimin tirou o velho elástico que segurava seus fios, lembrando de coloca-lo no bolso e fazendo uma nota mental para não esquece-lo ali.  Com dedos trêmulos, tentou pentear os fios para que não parecesse tão piores do que ele imaginava que estavam.

   Percebeu vagamente que Jungkook continha a respiração. Ele observou cada cacho se soltar, numa sedosa cascata dourada em tons de areia e de mel. Cabelos finos, mas fartos, que se espalharam sobre os ombros delicados de Jimin quando ele os sacudiu. O rosto dele ainda estava pálido e seus olhos pareciam enormes.
Nuvens tempestuosas, Jungkook pensou de novo, enquanto suas lembranças se encaixavam, formando lentamente um quadro cada vez mais nítido.

   Uma pequena enseada inglesa. Um verão sem as preocupações do trabalho. A necessidade de se afastar da Coreia na data de aniversário da morte de sua mãe, período em que o pai ficava insuportavelmente sentimental, mesmo depois de tantos anos. O pai prometera lhe dar maior responsabilidade nos estaleiros e, naquele verão, Jungkook concluiu que em breve não poderia mais se dar ao luxo de passar um mês inteiro de férias navegando, como adorava fazer, que aquela seria sua última chance de saborear a liberdade, e ele estava certo. No final do verão, ele voltou para a Coreia e assumiu as finanças da empresa pela primeira vez. Descobriu que a situação estava crítica e que o pai, em seu luto obsessivo pela perda de sua ômega, negligenciou totalmente os negócios da família.

Fora sua última viagem de jovem despreocupado.

   Livre da rotina e vestido num velho jeans, ele navegou através do Mediterrâneo à vontade, sentindo-se relaxado e aproveitando o sol. Não queria nada com ômegas ou qualquer outra classificação, sempre à sua disposição: ele queria paz!

   Leu, dormiu, nadou e pescou. Sua pele já com alguma melanina, ficara mais bronzeada, os cabelos negros cresceram e ele parecia um pirata. Navegou até a Inglaterra para explorar o país, algo que desejava fazer desde que uma professora inglesa leu para ele algumas histórias sobre sua terra. Queria conhecer o mundo admirável dos castelos, dos campos verdejantes.

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