[10] Gato e cachorro.

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-- Eu só estou dizendo que se você usa óculos, o mínimo que se espera é que enxergue. -- A voz irritante de Sana ecoa em meio às prateleiras. Elas estão agarradas ao mesmo livro, cada um puxando-o para mais perto de si.

Momo quer ler "O que é a vida?", de Erwin Schrödinger, para a sua pesquisa sobre a filosofia da biologia, muito mais importante do que o motivo de Sana: completar a sua lista de leitura inútil dos físicos mais influentes do século XX.

-- Que original, me zoar por causa dos meus óculos. -- Ela fala, dando um sorriso afetado. -- Me avise quando for fazer o show de stand up, não quero que meus pais tenham que passar por esse trauma sozinhos.

-- Rá! Eu não vejo meus pais há dois meses, você vai ter que passar por esse trauma sozinha. -- Momo junta as sobrancelhas, intrigada com o tom vitorioso de Sana. Isso é meio triste. — Е eu não estou te zoando por causa dos óculos, mas por ainda ser cega usando eles.

-- Ah, agora você está zoando cegos? Sinceramente, Sana. -- Sana balbucia e pisca repetidamente. O cabelo loiro despenteado, o blazer desleixado e o relógio mais caro que ela já viu na vida estão acompanhados de olhos arregalados e bochechas coradas. Momo quer rir, adora quando consegue fazer a garota perder as palavras.

-- Você sabe que não foi isso que eu quis dizer. -- Uma veia da mão dela salta quando puxa o livro com mais força.

-- Não sei, não.

-- Só solta isso logo. -- As palavras saem altas entre sopros de ar.

-- Fala baixo, você vai fazer a gente ser expulsa da biblioteca...-- Momo sussurra agressivamente. -- De novo!

-- Foi você que derrubou tudo aquele dia. -- Sana também sussurra, mas com tanta raiva que as palavras saem praticamente em um som normal.

-- Porque você me empurrou.

-- Eu já disse que foi sem querer!

-- Muito conveniente para você.

Sana vira a cabeça para o lado, inconformada, e revira os olhos como se não soubesse exatamente do que Momo está falando. Ela puxa com mais força e o livro escapa da mão de Momo.

Sana volta o rosto para ela e sorri, se afastando.

-- Ei! -- Momo parte para cima.

Sana a segura com um braço e mantém o livro o mais alto possível com a outra. Momo faz investidas, mas aparentemente Sana é mais forte. Elas ficam indo para frente e para trás conforme disputam o objeto.

-- Quem vê de fora pode achar que é uma dança muito esquisita, ou se já as conhece, só mais um dia normal. Para fora. -- O bibliotecário está de braços cruzados na ponta do corredor. Tem o cenho franzido e encara elas com cansaço. É uma cena peculiar. Momo com uma mão afastando o rosto de Sana e a outra esticada. Sana segurando o tronco de Momo e o livro na outra extremidade.

Ao notarem a presença do homem, elas naturalmente se afastam, como quando crianças são pegas fazendo algo errado e fingem que nada aconteceu. Momo limpa as roupas com batidinhas e diz:

-- De novo. -- Nenhuma delas tenta argumentar.

Sana deixa o livro no lugar e, trocando olhares recriminatórios, elas seguem o bibliotecário até a saída.

-- Vocês tardam, mas não falham. -- Hwasa diz quando está levando as duas para a coordenação. Ela tem o cabelo ondulado caindo pelos ombros e parece nova demais para trabalhar ali. Momo não entende exatamente qual o cargo dela no colégio. Sabe que ela faz um pouco de tudo e sempre está de mau humor. Além de sempre estar presente quando elas se metem em enrascadas, é óbvio. -- Eu sei que é pedir muito, mas se na próxima vez vocês puderem brigar de manhã, eu ficaria muito grata. Nesse horário eu tomo café com o porteiro. Ele se sente meio sozinho.

Angel fallen by love • DahmoWhere stories live. Discover now