— O desgraçado levou um pé na bunda e agora queria me usar de "estepe"...que raiva! Estou lisa por causa dele…

— Isso não é verdade! Você está lisa por sua própria causa! Ele é um tremendo canalha,  mas não te obrigou a pagar bebidas caras. — falo o óbvio,  mesmo ela fazendo bico e cara de brava pra mim.

— Você é uma amiga horrível…

— Aham…tão horrível que já estava com o pé dentro de casa e voltei pra te buscar! — Rio de como ela fica engraçada com essa cara birrenta — Vai dormir lá em casa?!

— Não vou incomodar?! — ela me olha atravessado e meio zarolha por conta do álcool nos couros.

— Que gracinha! Até parece que isso te impediu alguma vez! — engato a quinta marcha e tomo a autoestrada. — Mas que merda! — resmungo ao ver um policial logo adiante apontando um desvio. Pelas luzes, aposto que aconteceu um acidente.

Agora terei que tomar uma rota mais desértica.  Carol parece não se incomodar com minha irritação,  porque continua tentando sintonizar a rádio.

— Tem um acervo musical no pen-drive.  — aviso pro caso dela não ter visto.

— A rádio é mais nostálgica! — Defende seu ponto.

Não reclamo. Também gosto de ouvir a rádio enquanto dirijo. Nessa rota, há poucos carros trafegando e apenas as estrelas por companhia.  A estrada está um verdadeiro breu. A música ao fundo é Carry On My Wayward Son.

— Supernatural? Sério? — Dou uma risada sem muito humor. — Muda isso,  amiga da onça! — Sim, sou medrosa.

Uma coisa é assistir Supernatural dentro de casa, debaixo dos lençóis, mas ouvir isso numa noite escura, na estrada, não está sendo animador. Estou até com medo de olhar pelo retrovisor.

— Você é muito medrosa! — a descarada rir da minha cara.

— E você não, né?! Olha lá…— aponto aleatoriamente e ela quase pula pro meu colo. Gargalho alto.

— Não teve graça! — reclama de olhos esbugalhados.

— Eu achei super engraçado… — de repente,  uma luz forte me faz piscar várias vezes. Malditos motoristas que não respeitam o coleguinha de trânsito e teimam em deixar a luz alta. Sentar o dedo na buzina foi um desaforo necessário.

— Mas que merda! — minha amiga briga com o rádio,  que agora está chiando. — Saiu do ar… — Pra variar, algo pra dar mais clima de terror.

— Que luz é aquela?

— Esquece! Não vou cair nessa de novo! — ela cruza os braços e faz uma careta pra mim.

A questão é que dessa vez não estou brincando.  Há uma luz esquisita se destacando no céu escuro. À princípio,  pensei ser um drone ou a luz de um helicóptero, mas a coisa se aproximou rápido demais para ser algo tão simples.

— Que porra é aquela? — Carol começa a surtar — Pé na tábua,  minha filha! Não quero nem saber o que diabos é aquilo! — aponta a luz incandescente, num tom branco, e que aparentemente está nos seguindo.

O asfalto, antes um breu, está tão iluminado como se fosse dia. Em dado momento,  o carro começa a "engasgar" e vou para o acostamento,  antes de ter parada total.  A rádio oscila a frequência correta com a chiadeira e então para de vez. Tudo para. Tento dar a partida várias vezes,  mas sem sucesso.

— Acabou a gasolina? — Carolina está quase aos prantos de medo.  Sou "cagada", mas ela é bem mais.

— Como, se abasteci ontem?! — bato as mãos no volante e então resolvo sair para, quem sabe, pedir ajuda, já que os piscas alerta não estão funcionando.

— Larga de ser doida! Fica no carro! Você não já assistiu filmes suficientes para saber que nunca, em hipótese alguma,  se deve sair do carro numa circunstância dessas?! — a medrosa ao meu lado puxa meu braço tentando me dissuadir da ideia estapafúrdia que está na minha mente.

— Pois saia no meu lugar! — falo tranquilamente tentando não revirar os olhos. É claro que ela se recusa.

Na realidade,  tenho que ver as coisas pelo lado da razão.  O maior perigo aqui é sermos assaltadas, senão pior. Não é que OVNIs não seja uma hipótese tentadora de se pensar, mas qual é?! Acreditar em Ets é um pouquinho demais, não?! Tenho mais medo de fantasmas, que por sinal, nunca vi, do que pensar na possibilidade de visitantes do espaço.

Então,  desço do carro e é bem como imaginei; está tudo deserto.  Nessas horas não aparece uma alma viva para dar suporte. Estranhamente,  até os animais noturnos estão silenciosos.  Como sei disso? Bom, já trafeguei por essa rota à noite e,  no mínimo, visualizar uma coruja era certeza.

— Volta pro carro! — Carol aparece do outro lado, mas sem se afastar da porta aberta.

— Já estou indo! Deixa só pôr a sinalização! — Aviso abrindo o porta-malas.

Ouço apenas o barulho da porta batendo e então uma luz vem sobre mim. Há uma sensação,  ao mesmo tempo, quente e de formigamento sobre meu corpo ou como se estivesse mergulhando em águas profundas.  É confuso e inexplicável, porém me sinto calma.  De repente, não há mais o chão sob meus pés e por fim, o sono, de uma semana de farra, recai sobre mim, enquanto luto para me manter acordada…não consegui…

A VERDADE ESTÁ LÁ FORA Where stories live. Discover now