𝐏𝐨𝐫𝐭𝐠𝐚𝐬 𝐃. 𝐀𝐜𝐞

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- Ele não é meu pai. - Foi apenas isso que eu consegui ouvir da criança que berrava no meio do gramado do navio pirata Thousand Sunny, barco que pertence ao meu irmão caçula.

- Ele é seu pai, você sabe disso. Eu nunca escondi isso. - Disse Gol D. S/N, a mulher que chamo de esposa, que entreguei meu coração, mãe de meu filho, maior pirata procurada do Bando do Chapéu de Palha e antiga integrante do Barba Branca.

- Mas eu me recuso a chama-lo de pai! É verdade, você sempre me contou sobre "o grande Ace, Punhos de Fogo" e como ele era um homem maravilhoso, mas eu diria que Roronoa Zoro foi mais pai que ele, então como você quer que eu pare de chama-lo de "pai" e dar esse titulo à um homem que nem conheço? Que nunca me procurou?

Senti meu peito apertar. Me questiono se era isso que Gold Roger sentiria se eu gritasse para ele que meu pai é Barba Branca. Ouvi S/N respirar fundo, como se tentasse controlar a própria raiva contida.

- Vai começar a conhece-lo hoje, Aodh. Nós vamos fazer uma viajem em família, se preferir chamar assim. - Disse a mulher. - Arrume suas malas.

Virou-se e entrou para os dormitórios do navio. O garoto com cabelos cores de fogo me olhou desgostoso, com uma raiva incendiando nos olhos negros, usando o poder de seu fruto ele se dissipou como névoa, mas dava para ouvir seus passos na madeira e ver sua silhueta na rede que levava ao quarto do vigia, Zoro foi atrás prevendo o pior considerando os pesos guardados naquela sala. 

Um clima tenso ficou entre os membros do Chapéu de Palha que, aos poucos, foram se dispersando para seus afazeres diários até restar apenas Luffy e eu.

- Vocês realmente se parecem. - Ouvi ele dizer em meio a um sorriso. - Nenhum aceita o pai que tem.

Sorri com a piada. 

Ele não estava errado. Eu não via Gold Roger como meu pai, mas sim o homem que me criou; isso não era diferente para Aodh, ele via Luffy como pai, sendo que foi o tio que o criou por dez anos, foi meu irmão caçula que ajudou minha esposa a cuidar do meu filho que eu nunca segurei no colo.

Soltei um suspiro. S/N estava certa quando me mandou a carta dizendo que já estava na hora de eu aparecer, que ele deveria saber quem é o pai, que eu deveria começar a agir como pai presente.

Ao anoitecer, S/N me entregou as malas de ambos. Entregou para Luffy a carta que dizia onde estaria quando suas "férias" terminassem. Subiu pelo mastro principal e trouxe o filho que dormia no colo, suado e mal cheiroso. Zoro veio atrás com uma espada de duas lâminas, ambas protegidas pela bainha.

Despedindo-se dos companheiros, S/N subiu na minha pequena caravela, deitou o garoto na cama da cabine e me ajudou com a velejar até a pequena réplica do South Blue. Conseguimos chegar antes do nascer do sol e nos aconchegarmos em uma das cabanas.

S/N parecia feliz em me ver carregando Aodh que ainda dormia. Ele não era tão leve quanto imaginei, ele não era mais o bebê da foto no meu chapéu. Ele já tem dez anos e eu não estou em nenhuma de suas memórias mais antigas que fossem.

Quando deitei o garoto na cama, ele se aconchegou no colchão e pareceu procurar algo no meio da cama. S/N colocou um travesseiro e ele abraçou como se fosse a coisa mais preciosa que tivesse.

- S/N. - Chamei enquanto a via arrumar as coisas na cozinha. Eu estava sentado na cadeira da mesa, comecei a encarar o chão quando o medo começou a se aflorar em minha pele. - Você acha que... ele pode me considerar seu pai? Digo, nós nunca conversamos e o que ele sabe sobre mim é apenas o que você contou.

Senti suas mãos frias em meu rosto me fazendo olha-la, um carinho gentil que me fez aconchegar na palma das mãos calejadas das lutas. Um abraço terno e um beijo calmo. Palavras sussurradas me encorajando a não desistir em me aproximar dele, que eu deveria conversar com ele e ser paciente.

Deitei minha cabeça no peito da mulher, ouvia seu coração bater em um ritmo delicado debaixo da armadura carnuda. Abracei seu corpo magro por conta da fruta que comeu anos atrás.

Passamos a olhar para a escada que levava ao segundo andar quando sons de batidas contra a madeira e passos desesperados vinham do andar de cima, até que o ruivo caiu das escadas até nós.

S/N riu quando eu me levantei para ajuda-lo, dizendo que eu não precisava e que ele estava bem. De fato estava até onde eu pude ver antes que ele batesse em minhas mãos e se afastasse. Se levantou e se aproximou da mãe, abraçou a mulher que deixou um beijo em meio aos cabelos ruivos como os dela.

O menino sorriu desejando um bom dia para ela, beijou o rosto da mãe e foi até a geladeira.

- Você está sendo mau educado. - Alertou ela.

Com uma garrafa de água nas mãos, ele me olhou, ficou um tempo me encarando por um tempo, até levar os olhos à mãe.

- Bom dia, Ace. - Disse a contragosto.

- Por que vocês dois não vão até a feira comprar algumas coisas para que eu prepare um café da manhã descente? Não temos mais o Sanji para fazer comida. - Disse a ruiva tentando achar um tempo para nós dois.

- Devia ter pedido para que ele fizesse uma marmita para a gente. Duvido que ele fosse recusar. - Brincou o mais novo em meio a goles de água.

- Devíamos ter trazido ele junto. - Disse com a boca salivando ao me lembrar da janta do dia anterior.

- Chega de lamentações, preciso que comprem isso aqui. - Disse me entregando um bilhete cheio de rabiscos ordenados e um saquinho com moedas.

Nos expulsando de casa, eu e Aodh andamos até o mercado à algumas ruas.

O garoto estava quieto e ia na frente como se soubesse o caminho, tive que alerta-lo algumas vezes que era outra rua, que devíamos seguir outra esquina. Ele tinha o sentido de direção de um membro da família Roronoa. 

Ele não falou nada durante todo o percurso. Não quis levar nada além do necessário no mercado e não se justificou porquê. Ele ficou surpreso por um momento quando paguei com moedas de uma bolsinha diferente que a mãe dele tinha dado.

Ele não se atraiu por nada no mercado e na feira. Mas parou de andar quando viu uma espada de duas lâminas, bem feita, com uma delas sendo retrátil, uma bainha estilosa e a lâmina feita com a pedra d'água. Ele recusou quando eu perguntei se queria e voltou a andar.

- Então você gosta de espadas. - Disse tentando puxar assunto. - Elas são legais. Aprendeu a usar com seu tio, o Zoro?

Ele não respondeu.

- Sabia que ele teve "aulas" com o corsário Mihawk?

Silêncio.

- A sua mãe também sabe usar espadas.

Ele parou de andar. Ele era um menino grande, crescido. Tinha olhos que não demonstravam o mínimo de interesse no que eu dizia.

- Eu sei que você não gosta de mim, Aodh. Você tem motivos para isso. - Disse em um suspiro. - Mas eu gosto de você. Você é meu filho.

Não me respondeu e voltou a andar. Aquele silêncio continuou até chegarmos em casa, quando ele sorriu para a mãe e a abraçou.

Meu peito voltou a doer.

Disse que não estava com fome e voltei para a cidade. Pensei que ele fosse gostar de presentes, então comprei a espada, doces e tudo o que uma criança da idade dele poderia gostar. Voltei para casa e entrei pela janela do quarto dele, deixei os presentes na cama com um bilhete dizendo "por todos os aniversários que eu não estive".

Talvez ele realmente não quisesse um pai como eu. Talvez eu não fosse ser nunca um bom pai para ele. Talvez ele nunca me olharia com os mesmos olhos que olha para a mãe.

Mas eu não sou um homem de desistir.

Imagine AnimesWhere stories live. Discover now