Quando trocamos lições sobre o amor

5.9K 441 109
                                    

Todas as pessoas falam como se fossem especialistas nos assuntos do coração. Talvez porque a maioria delas já remendou um coração partido. Diferentemente, Sayuri não fingia que sabia alguma coisa. Romance a fascinava como qualquer outro enigma da natureza que ela nunca iria compreender.

De algumas coisas ela tinha certeza por pura habilidade de observação. Carla estava certa em romper com Luana, por exemplo. Quem compartilhou com ela a novidade foi Adele, no encontro seguinte das duas. Sayuri adorava a companhia da loira, por isso não tinha pressa em entregá-la para os braços de outra garota, o que seria egoísta se ela não tivesse certeza que Carla e Adele se resolveriam em breve. Quando o dia chegasse, ela vibraria pelas duas, se ainda estivessem em sua vida. Enquanto não chegava, Sayuri aproveitava.

Sayuri não tinha medo de coração partido, porém no seu íntimo havia uma pontada de insegurança. Ela sempre se perguntava se os seus ficantes gostavam dela enquanto pessoa, enquanto amiga. Esperava que sim. Na experiência dela, ou eles ignoravam o acordo e se apaixonavam por ela, ou viam Sayuri como um objeto sexual a ser descartado. Adele era a primeira que parecia estar na mesma página que ela.

Quando não estavam se pegando ou conversando sobre coisas do trabalho, as duas ainda se divertiam. Sayuri ensinou Adele a jogar cartas e Adele a fazia assistir várias séries de comédia (ela pendia para filmes de romance, ironicamente). Adele tinha um ótimo senso de humor e a fazia rir sem intenção com seu jeito quase avoado de ser. Era leve e agradável estar com ela, o que justificava, sabe, estar com ela. Sayuri gostava de coisas descomplicadas.

— Você não vai me forçar a ver Orgulho e Preconceito pela décima vez. — Adele torceu o nariz. — E nem adianta propôr Retrato de uma Jovem em Chamas!

Sayuri gostava de romances históricos, e fez Adele ser parcial aos que continham casais de mulheres, mas ela tinha seus limites.

— Ok, mas chega de The Office, por favor. Vamos fazer outra coisa, então. — Sayuri riu.

A única insegurança de Sayuri em seu relacionamento com Adele era se iriam continuar amigas quando a parte sexual acabasse. Se fosse tão corajosa quanto parece, Sayuri teria perguntado.

— Seu aniversário tá se aproximando, né? Que tal a gente planejar o que fazer? — Ela sugeriu para Adele.

— Eu geralmente só vou ao cinema. — Adele deu de ombros. — Mas comemorar com meus amigos pode ser bom.

Talvez Sayuri estivesse inclusa em "meus amigos" no final das contas, mas ela não queria presumir nada.

Após duas horas trocando ideias, elas chegaram numa lista de possíveis locais e de convidados. Seria uma festa íntima, e Adele só planejou convidar dez pessoas (Sayuri, Julia, André e sua acompanhante, Marina e seu namorado, Carla e três amigos da faculdade).

— Estou honrada de estar na lista. — Sayuri esbarrou seu ombro no de Adele. — Só espero que não seja apenas porque eu te dei a ideia.

— Claro que não! — Adele protestou de imediato. — Você sabe que eu gosto da sua companhia.

Adele franziu a testa de uma maneira tão adorável que Sayuri não resistiu dar um beijinho entre as sobrancelhas dela.

— É esquisito você ser uma das minhas melhores amigas no momento? — Sayuri perguntou e mordeu o lábio ansiosa.

— Eu ficaria ofendida se eu não fosse. — Adele a assegurou com um semi sussurro e um peso foi levantado dos ombros dela.

*

Sayuri adorava seu trabalho, na maior parte do tempo. Às vezes, como qualquer pessoa normal, ela sonhava em ter outras carreiras, é claro. Talvez em um universo alternativo, Sayuri fosse uma diplomata poliglota, ou uma cineasta, talvez até mesmo uma aeromoça. Naquele universo, trabalhar numa agência de publicidade era satisfatório o bastante.

Quando Eu Ainda Amava VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora