039

777 101 32
                                    

28 de dezembro de 1986

Sim, o plano de Anne, milagrosamente, deu certo. Eu estava andando pelas ruas com meu vestido roxo longo, coturno e uma luva arrastão junto alguns colares de pedra. Consegui sair de lá e estava indo em direção à aquele baile.

A reação das pessoas em me ver lá, com certeza não seria boa, mas vale a pena. Não contei pra ninguém que eu viria. A única que sabia sobre isso, era Anne. E logo logo, Eddie.

Ao longe, já pude ver algumas fitas de luzes coloridas e balões. Carros chegando e vários adolescentes engravatados. Quando eu cheguei, já estava na metade do baile. Talvez pelo fato de eu ter andado por 5km.

Cheguei perto do retrovisor de um carro qualquer e olhei para meu rosto. Eu estava... Bonita. Um pouco suada, mas bonita.

De repente, a porta do carro na qual eu estava perto, se abriu. Saiu de dentro dele, uma garota de cabelos curtos e ruivos. Eu conhecia ela de algum lugar.

- Ah, me desculpa! Não sabia que tinha gente dentro do carro.

- Tudo bem. Eu sou a Vickie. - Disse estendendo a mão.

- Sou a Alysson, prazer.

- O prazer é meu. Deixa eu te perguntar: Você viu uma garota alta, cabelo curto meio loiro, com sardinhas, provavelmente de terno, olhos azuis...?

- Está procurando a Robin?

- Isso! Robin. Conhece ela?

- Conheço...

- Ah, que bom que eu te encontrei! Era pra a gente se encontrar aqui, mas ela meio que sumiu. Ela disse que um amigo iria dar carona pra ela até aqui porque ela não tem carteira. Será que esse amigo dela é de boa? Ou será que ele sequestrou ela? Ai meu Deus! Eu estou surtando. Eu até insisti em trazer ela, mas ela não quis. Ela é muito teimosa, cara. Enfim! Você a viu por algum lugar?

- Me desculpa, não. Acabei de chegar aqui.

- Tudo bem, obrigada. Eu vou... Continuar esperando.

- Se eu ver ela, falo que você está aqui.

Vickie me deu um sorriso simpático e afirmou com a cabeça.

- Eu te conheço de algum lugar. - Disse confusa.

- Que? Eu? Não. Eu sou... De outra cidade. Vim só pra não deixar... Meu... Primo! Sozinho.

- Ah, claro. Então eu devo estar te confundindo. Me desculpa. Meu cérebro tem a irritante mania de confundir as pessoas. Um dia eu acho que ainda vou me dar mal por causa disso. Acontece, não é? Quer ajuda pra encontrar seu primo?

- Eu acho que ele ainda não chegou, mas obrigada.

Olhei ao redor do estacionamento procurando por uma van. Tenho certeza que seria bem fácil encontra-la, caso estivesse lá.

Vickie falava várias coisas que eu não estava prestando muita atenção. Me virei para trás e vi o carro de Steve chegando. Automaticamente, me virei novamente para ele não ver meu rosto. Ele não podia saber que eu estava ali.

- E daí ela disse que ela gostava de me ouvir falar. Ninguém nunca tinha me dito isso antes. O que você acha que eu sou para ela? Tipo...

- Vickie, eu preciso ir. Boa sorte com a Robin, ok? Ela está bem ali, naquele carro.

Saí correndo dali, sem dar tempo para ela dizer alguma coisa. Só pude ouvir ela gritando um "obrigada" quando eu já estava longe. Se Steve me visse ali, era minha morte.

Entrei na quadra da escola, onde estava tendo o baile. Nas caixas de som, tocava "Beat it". Alguns adolescentes tinham levado bebida alcoólica escondidos e já estavam muito doidos. Alguns deles estavam sentados nas mesas, outros dançando.

Olhei ao redor, à procura de um cabeludo rockeiro. Até que tive uma ideia. Fui até o DJ e pedi para tocar "I speed at night". Tenho certeza que no primeiro toque, Eddie apareceria.

E foi o que aconteceu. Pude ouvir o som de alguém gritando em comemoração quando a música começou a tocar. Eu sou muito inteligente, na moral.

Olhei em direção ao grito e avistei Eddie dançando loucamente. Então, fui até ele, com um sorriso no rosto. Cheguei por trás, tampando seus olhos para ele adivinhar quem era.

- Hum, deixa eu pensar. Henderson?

Continuei em silêncio e sem querer soltei uma pequena risada. No mesmo segundo, ele se virou para mim, assustado.

- Oi, Eddie.

- Aly? Uau. Você está... Você deveria estar aqui? - Perguntou confuso com a situação.

- Não. Mas eu não podia perder essa noite.

- Fugiu daquele lugar?

- Preciso voltar até as 05:00h. Posso confiar em você?

Pude ver os olhos do garoto brilharem. Ele sabia que aquilo era errado, mas eu sei que ele queria passar um tempo comigo, sem ser naquele lugar.

- Se não, o que?

- Além de esquizofrênica, vou ser tratada como fugitiva.

- Então pode contar comigo. - Respondeu me olhando de cima à baixo com um sorriso no rosto. - Você está linda.

- É, eu senti falta de vestir uma roupa que não seja branca. Foi Anne que roubou da sala de teatro.

- Então ela está envolvida na sua fuga?

- Digamos que sim.

O garoto balançou a cabeça em negação e riu, me fazendo rir junto.

- O que você acha da a gente dar o fora daqui?

- E iríamos pra onde?

- Não sei. Andar sem rumo pela cidade, aproveitando suas horas restantes aqui do lado de fora?

Balancei a cabeça várias vezes em afirmação. Ele deu um sorriso de orelha à orelha e pegou em minha mão. Eddie simplesmente saiu correndo, me puxando. Fomos até o lugar que ele me apresentou, onde demos nosso primeiro beijo.

Estávamos sentados no chão, observando a lua. Que estava linda, a propósito.

- Senti falta disso.

- Do o que?

- De fugir de casa contigo durante a noite. De ser adolescente e cometer doideiras sem ser doida.

- Ei, você não é doida.

- Eu acabei de fugir de Pennhurst por um motivo, Munson.

- Eu sei lá. O termo "doida" não me parece apropriado.

- Relaxa, foi uma metáfora. Eu me considero 99% normal.

- Por que não 100%?

- Porque ninguém é completamente normal. E se fosse, eu sinceramente, teria medo dessa pessoa.

Eddie riu com minha fala e, logo depois, aproximou seu rosto, do meu.

- Sabe do que mais eu sinto falta? - Perguntou olhando para meus lábios.

- O que?

- Disso aqui.

O garoto juntou nossos lábios molhados e gelados. Era a primeira vez depois de muito tempo, que nos beijamos pra valer.

Coloquei minhas mãos em seu peito. Ele encaixou as suas em meu rosto, que era até pequeno comparado às suas mãos.

Afastei seus cabelos para trás da orelha, aprofundando o beijo. Nós tentávamos ficar cada vez mais perto, o que era impossível. O único espaço que ainda havia entre nós, eram nossos átomos que não se encostavam.

me and your mamaWhere stories live. Discover now