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Alysson Harrington on

29 de dezembro de 1986

- Amiga, você está péssima. Como você conseguiu tantas olheiras em só uma noite? - Perguntou Anne.

- E a culpa foi sua. Você que inventou de eu fazer aquilo.

- E você concordou. Não vou assumir isso sozinha. Sei também que você ficou toda feliz com isso. Conta mais. Como foi?

- Perfeito. A gente nem ficou no baile, na verdade.

- Não acredito! Onde foi? Usaram camisinha, não é?

- O que? Não!

- Não usaram camisinha? - Perguntou indignada.

- Não! Não é isso que você está pensando. Tá maluca?

- Nós estamos em Pennhurst, amiga.

- Agora eu entendo porque você está aqui. A gente não fez nada. Foram só beijos na luz da lua.

- Fofos.

Não pude conter um pequeno sorriso ao lembrar de nossa madrugada. Concordo com Anne, foi fofo. E de acordo com ele, o garoto viria hoje de novo. Mal podia esperar para ve-lo novamente.

- Senhorita Harrington?

Olhei para a porta de meu quarto e vi uma das enfermeiras entrando cuidadosamente.

- Sim?

- Precisamos conversar.

- Claro.

Olhei para Anne que entendeu o recado e saiu do quarto.

- Você vai me contar mais depois, ouviu?

Assenti com a cabeça, rindo. Ela saiu do quarto, fechando a porta e a enfermeira sentou-se na minha frente.

- Você vai poder ir pra casa. - Falou direta.

- O que? Quando?

- Quando quiser. Seu tratamento foi um sucesso, Aly.

- Mas eu ainda não tive minhas lembranças completas.

- Desde que você continue tomando seus remédios, suas lembranças vão voltar com o tempo e elas não vão te prejudicar. Mas eu indico que você continue frequentando um psicólogo. Já conversamos com seu irmão e está tudo acertado. Só precisamos saber se você se sente preparada para sair daqui. Se sim, assine esse documento aqui, por favor.

Olhei para o papel que ela me entregou e parecia com um certificado. Por que eu iria querer um certificado de que eu passei em um manicômio?

- Eu não sei se eu me sinto... Preparada.

Eu sei, é bobagem. Eu passei os últimos mêses torcendo pra esse pesadelo acabar e eu ir pra casa logo, mas como seria minha vida do lado de fora? Como eu iria lidar com a vida livre daqui? Eu não tinha pra onde correr.

Meus anos escolares já tinham acabado e eu não tinha nem tentado passar em alguma faculdade. Eu já era maior de idade e não tinha nem um emprego.

- O protocolo diz que você pode ficar aqui até se sentir preparada para ir.

- Eu posso pensar um pouco?

- Claro. Espero que você tome a decisão certa.

Balancei a cabeça em afirmação e olhei para o chão. A enfermeira saiu do quarto e eu refleti sobre isso.

Eu não tinha parado pra pensar no que seria minha vida depois que eu saísse daqui. Na real, nem tinha me imaginado saindo daqui. Era o que eu mais queria, mas acho que o que eu queria alcançar eram pessoas, não um lugar.

E agora, também tem pessoas que eu quero alcançar aqui dentro. Anne foi a amiga mais sincera que eu já tinha feito, além de Steve e Eddie.

Depois de um tempo pensando, uma enfermeira disse que tinha visita para mim. Ansiosa, fui até o salão principal onde avistei os dois garotos que eu queria alcançar fora daqui.

- Maninha! Você está bem?

- Oi. Estou sim, valeu. E você? - Perguntei o abraçando.

- Mais do que bem!

- Ué, o que aconteceu?

- Ele conheceu uma garota. - Respondeu Eddie. - Tudo bem, princesa?

- Tudo. Você? - Perguntei com um sorriso longo.

- Bem, tirando o fato de não aguentar mais seu irmão falar nessa tal de... Como é que é o nome dela mesmo?

- Gab. Se você não decorou o nome dela, é porque eu não falei o suficiente. Ela é tão perfeita, maninha.

- Você fala isso sobre todas.

- Ela é diferente. Eu sinto que ela realmente gosta de mim. E eu também gosto dela. A gente se beijou ontem à noite.

- Não vai me dizer que você foi no baile e que ela é estudante.

- Ela se formou esse ano e eu não fui no baile. Só levei a Robin até lá e acabei encontrando ela por pura coincidência.

- Conheceu ela ontem, não foi?

- Foi.

- Uau. Tão inesperado, vindo de você. - Respondi com ironia.

Steve revirou os olhos e eu e Eddie caímos na gargalhada. Steve se apaixonava muito rápido por qualquer pessoa.

Ficamos conversando até acabar o horário de visita, como o de costume. O estranho foi só que nenhum dos dois tocaram no assunto de eu sair daqui. Provavelmente, não queriam me constranger. Eles sabiam que eu estava com medo de voltar para a realidade.

Me despedi e fui até meu quarto, pulando na cama e enfiando a cabeça no travesseiro. Logo, pude ouvir a voz de Anne invadir o quarto.

- Eu sei que agora você pode sair daqui quando quiser, Aly.

- Como descobriu?

- As fofocas correm rápidas. Olha só, quero que saiba que não quero que você fique aqui por minha causa. Você não vai ficar, nem ferrando. Só por cima do meu sovaco fedorento.

- Está me expulsando?

- Estou. Você não vai ficar aqui. Qual é? Você tá sonhando com isso desde o dia que eu te conheci. E agora que você conseguiu, não vai sair por minha culpa? Não, não. Arruma suas coisas agora. Você vai pra casa amanhã.

- Não é só por sua causa, Anne. Eu tenho medo de voltar a encarar o mundo lá fora.

- Você é forte, Alysson. Tenho certeza que isso seria fichinha pra você. Eu vou estar sempre te dando forças.

- Acha mesmo que eu consigo?

- Eu tenho certeza absoluta. Você... Vem me visitar depois, não é?

- Claro que sim. Eu te amo, gata.

- Ai que fofa. Também te amo um pouquinho. Não casa com aquele bonitão antes de eu sair daqui, ouviu? Quero ser a madrinha de vocês. Fui eu que juntei esse casal.

- Tecnicamente, não.

- Tecnicamente, sim.

Gargalhei junto a ela. Impressionante como Anne conseguiu tirar aquela ideia da minha cabeça só com algumas palavras. É, aparentemente, amanhã eu vou sair daqui.

me and your mamaWhere stories live. Discover now