Tudo é rio - Carla Madeira

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Após a repercussão considerável deste livro, fui atrás muito interessada sobre o que estava por trás de tantos elogios.

Esse drama vai contar a história de Dalva e Venâncio, e também de Lucy. Personagens que ao mesmo tempo que são arrebatadores, são também cruelmente reais.

A narrativa se inicia apresentando Lucy, sendo ela a mais polêmica do livro: uma prostituta irreverente e desaforada (uma sacada inteligente de Carla iniciar com esta personagem por ser ela intrigante ao leitor, tornando impossível de largar o livro nas primeiras páginas.) que não aceita a rejeição de Venâncio, frequentador de seu local de trabalho e irredutível quanto a seu desgosto pela presença de Lucy, causando seu furor, afinal, era ela a mais famosa e desejada prostituta do bordel. Lucy então fica obcecada por aquele homem que não cede a nenhuma de suas tentativas de fazer-lhe admitir sua irresistibilidade.

Depois desse conflito somos apresentados a história desse personagem carrancudo e melancólico: Venâncio carrega uma tragédia em sua história, cometeu um crime imperdoável e precisa viver com as consequências dele.

Somos apresentados a história dele e de sua esposa Dalva, detalhes de como se conheceram e de como eram suas dinâmicas familiares, sendo também uma personagem relevante a mãe de Dalva, a dona Aurora.

O romance de Dalva e Venâncio é contada de maneira muito bonita e poética, onde nos vemos envolvidos nesse amor quase palpável narrado pela autora:

"Mas e o amor? O que é senão um monte de gostar? Gostar de falar, gostar de tocar, gostar de cheirar, gostar de ouvir, gostar de olhar. Gostar de se abandonar no outro. O amor não passa de um gostar de muitos verbos ao mesmo tempo. No caso de Venâncio e Dalva, o gosto de cada sentido grudava os dois para mais de muitas vidas, pareciam eternos de tão juntos."

Tal crime cometido por Venâncio feriu esse amor de maneira aparentemente irreversível, o que o tornou um homem desconsolado e carregado de mágoas.

Paralelamente também conhecemos a história de Lucy, desde sua infância até a idade adulta, uma história também recheada de percas e traumas, juntamente com os traços peculiares da personalidade desta personagem que são expostos em situações acontecidas desde sua infância, que fazem o leitor entender a trajetória e as experiências que a levaram a ser quem é, mais tarde.

A Carla usa analogias para ilustrar experiências humanas de uma maneira muito bela, vemos as histórias dos personagens relacionando-se umas com as outras de uma maneira envolvente, enquanto somos tomados de uma compreensão e identificação com a humanidade destes personagens que nos faz suspirar ante ao misto de sentimentos e pensamentos.

A história possui momentos eletrizantes e reviravoltas surpreendentes, mas acima de tudo, o que me fascinou nesse livro foi o talento da autora de construir personagens com histórias tão reais e tangíveis, mas ainda assim sem fugir da magia literária, que é expressa na sua forma poética de escrever.

É possível perdoar o imperdoável? Superar o insuperável? São questões centrais da narrativa.

O livro me sensibilizou e me marcou. A violência, a crueldade e a obscenidade presentes nesse livro são para nos fazer esquecer que estamos lendo uma história fictícia, nos pondo diante de uma narrativa que mais parece um caso completamente real e observável no dia a dia, em diversas histórias de sujeitos diferentes.

Foi devidamente favoritado e eu gostei do fim, que foi amplamente discutido e questionado por vários leitores. Acredito que Carla foi nada mais do que real, verdadeira e sensível ao decidir por esta conclusão, que pode sim ser questionada e discutida, mas ao meu ver, não deveria ser a obra considerada problemática por conta do desfecho, que nada mais é do que orgânico/natural se considerada a cosmovisão dos personagens.

Observações:

- Literalmente todos os personagens presentes nessa história são interessantes, de primários a secundários. Amei conhecer a família de Dalva e a dona Aurora, mulher de cárater singular.

- Este livro é insuperável, mesmo com o tempo ele permanece vívido e cativante.

Nota ⭐⭐⭐⭐⭐ (5 estrelas)
Músicas que me fazem lembrar desse livro:
Conversa de botas batidas (versão do Cícero)
Explodir - Rubel

Minhas Leituras (Resenhas)Where stories live. Discover now